(Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 21 de abril de 2021 às 15h43.
Última atualização em 22 de abril de 2021 às 16h48.
É inegável que o contribuinte brasileiro, pessoa jurídica ou física, enfrenta um verdadeiro emaranhado de leis, decretos, atos e regulamentos normativos relacionados aos tributos, o que dificulta a compreensão do intricado processo tributário, gerando crescente insatisfação para os contribuintes que desejam cumprir suas obrigações, aumentando a insegurança jurídica que prejudica especialmente o ambiente de negócios e a atração de investimentos.
Estudo patrocinado pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), realizado pela consultoria internacional EY, demonstra que temos em discussão nas instâncias administrativas e judiciais, só em débitos federais, 3,4 trilhões de reais. Ao se somar débitos nas esferas estaduais e municipais, as estimativas apontam para mais de 5 trilhões de reais!
A esse quadro insólito, que prejudica os bons contribuintes e também o erário, temos ainda uma carga tributária das mais elevadas em comparação com países do mesmo nível de desenvolvimento, onerando empresas e toda a sociedade. Pagamos muito e temos um baixo retorno em serviços. Uma situação anacrônica.
Essa realidade aumenta a inadimplência e, diante da permanente necessidade do Fisco conseguir aumentar a arrecadação, estimula a instituição de Programas de Parcelamentos de Débitos Tributários Federais, popularmente conhecidos como Refis. Não é sem razão que desde o ano 2000 tivemos pelo menos cinco dessas iniciativas em âmbito geral. Em média, a cada três anos temos um programa com esse perfil.
A sucessão de parcelamentos tem sido criticada por especialistas da área tributária. Entre outros argumentos, podem-se destacar: redução da arrecadação, com aumento do passivo tributário; ineficiência; desestruturação do sistema, estimulando a inadimplência na expectativa da aprovação de um novo parcelamento; desestímulo ao contribuinte que cumpre com suas obrigações; aproveitamento ilegítimo pelos que utilizam do não pagamento de tributos como modelo de negócios.
Sem aprofundar as críticas, o momento que vivemos, com a pandemia drenando recursos públicos, das empresas e pessoas, está em jogo a sobrevivência de toda a economia. Frente à tragédia que entra no segundo ano, a iniciativa do presidente do Senado Federal, de termos um novo programa de regularização tributária encontra terreno fértil, de fácil justificativa.
Um instrumento que pode servir aos dois lados da relação tributária — agilizar o pagamento de tributos, extremamente necessário para um alívio ao tesouro e melhorar a situação de contribuintes duramente impactados pelo abalo causado pela tragédia da covid-19.
Porém, como já aconteceu em outros Refis, é necessário não esquecer quem sempre está à espreita para se aproveitar de meritórios propósitos, de apoio ao contribuinte em dificuldades, para obter vantagens a fim de continuar a lesar o fisco e a concorrência leal. Trata-se dos chamados devedores contumazes, “espertos” que montam seu negócio estruturando-o para, dolosamente, nunca pagar impostos. Não é um contribuinte eventualmente em dificuldades ou que, enfrentando situação econômica mais grave, reiteradamente deixa de cumprir com suas obrigações. É contumaz, seu lucro altíssimo é resultado da evasão fiscal recorrente, corroendo a competitividade e a ética concorrencial, causando perdas bilionárias ao fisco e portanto, à sociedade. Essa estruturada inadimplência, só nos setores de combustíveis e de tabaco, acumula dívidas ativas de 100 bilhões de reais.
É crucial combater essa prática predatória. Com esse objetivo há o projeto de lei no Senado Federal (PLS nº 284/2017), pronto para ser votado, que define quem deve ser considerado devedor contumaz. Essa lei irá conferir maior segurança jurídica nas relações tributárias, diminuindo o espaço da atuação de ações organizadas de evasão fiscal continuada.
Assim, nesse momento dramático, a proposta de uma reestruturação de dívidas tributárias não pode ser um estímulo para o comportamento espúrio por parte de quem se aproveita de legitimas medidas para mais uma vez se locupletar.
O legislativo brasileiro deve atentar para essa realidade e não permitir que uma legítima iniciativa seja desvirtuada.
Por essa razão, a reabertura de mais um Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) não deve incluir devedores que tenham sido excluídos de dois ou mais programas de parcelamento de dívidas tributárias.
*Edson Luiz Vismona é advogado, presidente do Instituto ETCO e do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP). Foi secretário da Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo
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