Privacidade não pode ser uma bandeira apenas do marketing e de TI (Oscar Wong/Getty Images)
Bússola
Publicado em 20 de setembro de 2022 às 12h10.
Última atualização em 20 de setembro de 2022 às 12h33.
Por Débora Longhi Sabidussi*
Algumas conversas difíceis não podem esperar, e uma das mais urgentes é a questão da privacidade em ambientes digitais. O tema sempre foi fundamental, mas só veio a ganhar os devidos holofotes mais recentemente, com uma sucessão de vazamentos de dados e outros deslizes dos mais variados, seguido de uma crescente pressão regulatória (LGPD, início da atuação da autoridade de dados, etc.) e mudanças tecnológicas importantes, como o fim dos cookies de terceiros.
Temos de considerar também outro fator vital: a forte pressão dos consumidores e da sociedade de forma geral por um maior respeito e cuidado com seus dados. É quase uma separação do “joio do trigo”, com as marcas que gerenciam bem esta questão, gerando relacionamentos relevantes e duradouros (portanto, vendas) e aquelas inconvenientes, invasivas com o uso dos dados de seus clientes.
Logo, a eficácia nesta área não se trata mais apenas de um compliance com as normas vigentes e práticas de mercado, mas sim a base, a estrutura sobre a qual desenvolvemos estratégias de marketing e comunicação com resultados.
A coleta ampla de dados no digital foi uma prática estabelecida desde seu nascimento — sendo um de seus principais diferenciais —, mas, neste novo cenário, precisamos revisitar alguns pontos. Primeiro, os dados precisam ser coletados por algum motivo, com a definição prévia de seu uso e, além disso, o usuário precisa saber que as marcas estão coletando seus dados, quais dados, e aprovar esse processo. E, para estimular o usuário a compartilhar seus dados, a relação precisa ser de "ganha-ganha". As marcas precisam estimular essa interação, seja com uma promoção, desconto, frete grátis, degustação ou clube de vantagens... E, claro, para isso funcionar, o que está sendo oferecido deve ser adequado e relevante para o consumidor.
Segundo, até pouco tempo atrás, a coleta de dados era quase indiscriminada, se buscava mesmo colher o máximo de dados possível, mesmo que eles não fossem essenciais para aquele contexto de mercado. Alguns exemplos. Se sou um serviço digital ou infoproduto, preciso mesmo do endereço completo? Em tempos de análise comportamental e de jornada e sou uma empresa de alimentação ou bens de consumo, preciso mesmo da informação do sexo e orientação sexual? E no caso de uma loja de roupas e calçados unissex? Fica aqui a provocação.
Outro ponto importante, o terceiro. Os dados colhidos são mutáveis, não podem ficar “escritos em pedra”. A cada dois ou três anos eles devem ser novamente conferidos para não perderem eficácia e não gerem ruídos com o consumidor. Além disso, os dados antigos devem ser descartados.
Chegamos assim à estruturação dos bancos de dados, que inclui a anonimização dos dados pessoais (sendo aqueles dados relativos a uma pessoa, por exemplo, o CPF, nome, etc.) e o estabelecimento de políticas de segmentação e clusterização. Por fim, como prevê a LGPD, deve-se criar uma porta de saída efetiva e rápida da base para o consumidor, caso assim ele deseje, isto é, se o consumidor não quiser mais ser impactado por uma certa marca, deve ser fácil para ele sair do banco de dados.
Para que tudo isso chegue a cabo, no entanto, o tema da privacidade não pode ser uma bandeira apenas do marketing e de TI. Deve ser da empresa toda, principalmente das lideranças. Pois uma política de privacidade eficiente depende de investimentos, sistemas, equipe e a adesão de várias áreas e estratégias da organização. Uma boa prática é a adoção da figura do evangelizador em privacidade que deverá sensibilizar os diversos pontos da empresa envolvidos, coordenando os esforços.
Desta forma, sairão na frente as empresas que já estiverem com foco em privacidade hoje. Já sentimos um “cheiro” do que vem pela frente quando os cookies de terceiros do Safari pararam de ser compartilhados pela Apple. As empresas precisam se antecipar e se preparar desde já. Para as empresas que usam o Google Analytics (GA), a migração para o GA4 é um começo, que vem com foco grande na privacidade dos usuários.
Como vimos, são mudanças complexas e profundas que constituem uma verdadeira cultura de privacidade nas empresas. E será essa cultura que pavimentará nossa jornada com o consumidor para um ambiente digital de relações sólidas, duradouras e que, acima de tudo, gerem confiança e lealdade, talvez os principais ativos intangíveis das marcas no século 21.
* Débora Longhi Sabidussi é sócia e vice-presidente de Performance e Data da Cadastra
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