Bússola

Um conteúdo Bússola

Posto, logo existo. Ou como a foto da vacina se tornou seu capital social

Postar sua foto nas redes seria um ato egoísta ou um estímulo para que outras pessoas se vacinem?

Grace Peterson, de 14 anos, vacinado na Geórgia. (Chris Aluka Berry/Reuters)

Grace Peterson, de 14 anos, vacinado na Geórgia. (Chris Aluka Berry/Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 16 de junho de 2021 às 18h52.

Última atualização em 18 de junho de 2021 às 13h58.

Por Rodrigo Pinotti*

O post que mais faz sucesso nas redes sociais neste 2021 é o de vacinação. Com o avanço dos imunizantes, mais e mais pessoas têm mostrado o braço desnudo (ou até mesmo outras partes, como fez o presidente do Banco Central), agulha fumegante, um misto de felicidade, alívio e orgulho. Mas... precisa? O que nos impele a postar nas redes sociais? Por que você posta uma foto no Instagram, ou compartilha algum conteúdo no Twitter, no Facebook ou no Whatsapp?

Mostrar ou não ao mundo que você está vacinado não vai deixar você mais imunizado. A questão é que quando um estudante de Harvard um tanto alcoolizado resolveu montar um algoritmo para comparar e avaliar fotos de estudantes ele não fazia ideia de que estava começando todo um império baseado em uma característica inerente ao ser humano: mostrar que temos algo, ou que sabemos de algo, ou que podemos fazer algo que ninguém mais (ou quase ninguém) tem, sabe ou pode.

Você sabe que é verdade: o primeiro impulso que temos quando ouvimos um segredo é contá-lo a outra pessoa. Quando sabemos de algo que ninguém mais sabe, uma sensação de poder nos acomete, como se de alguma forma fôssemos especiais por conta daquilo. Porém, o sentimento perde a razão se não há reconhecimento, e isso só pode vir do outro. O boca-a-boca, um instrumento de venda poderosíssimo desde sempre (e mais ainda na era digital, com as recomendações de compra nos marketplaces), se assenta sobre isso.

Jonah Berger, professor de marketing na Wharton School, da Universidade da Pennsylvania, deu talvez a designação definitiva para isso: moeda social (social currency, no original – em uma tradução mais livre, podemos chamar também de capital social, em um conceito ligeiramente diferente daquele criado por Pierre Bourdieu). Não apenas as relações econômicas são mediadas por moedas, mas também as relações sociais, afinal. Quanto maior o seu capital social em relação a um determinado grupo, maior a sua influência sobre aquele grupo, assim como o seu status. Isso contribui para a nossa realização pessoal. Na Hierarquia das Necessidades de Maslow, a realização pessoal vem no topo.

Uma postagem com muitos likes e comentários significa, portanto, que sua quantidade de moeda social aumentou. Eu mesmo tenho postado estes artigos no LinkedIn e acompanhado o desempenho de cada um na plataforma (curtam e comentem lá, aliás, por favor).

Postar uma foto pós-vacina quando menos de um quarto da população brasileira já recebeu ao menos uma dose é, pode ser descrito, por um lado, como uma ação egoísta. Por outro, pode-se dizer que é uma maneira de incentivar mais pessoas a se vacinarem também – embora fotos de vacina contra a gripe não sejam tão comuns assim, por exemplo. Mais do que qualquer outra coisa, este é um sinal do quão humano somos, e como as tecnologias apenas amplificam aspectos de nossa natureza que já estão presentes desde que o primeiro australopithecus rabiscou alguns traços na parede de uma caverna esquecida pelo tempo.

*Rodrigo Pinotti é sócio-diretor da FSB Comunicação

Siga a Bússola nas redes: Instagram | LinkedinTwitter | Facebook | Youtube

Acompanhe tudo sobre:ComportamentoPandemiaRedes sociaisRoberto Campos Netovacina contra coronavírus

Mais de Bússola

7 em cada 10 brasileiros apostam na produção de biocombustível como motor de crescimento econômico

97% das empresas com receita de US$ 1 bi já sofreram violação por IA generativa, aponta instituto

Luiz Garcia: como a construção civil pode superar os desafios provocados pelo aumento do INCC

Bússola Cultural: moda periférica com Karol Conká e Tasha&Tracie