A saúde corporativa não é mais um custo a ser gerenciado: é um ativo a ser cultivado (Halfpoint Images/Getty Images)
Plataforma de conteúdo
Publicado em 31 de julho de 2025 às 15h00.
Por Murilo Wadt*
A posição de CEO exige decisões constantes sobre onde investir tempo e atenção, buscando os melhores resultados financeiros e garantindo a inovação e a perenidade dos negócios. Nesse cenário, a saúde corporativa passou a ocupar um novo espaço: o centro da estratégia empresarial. O que antes era apenas uma atribuição do RH ou da área de benefícios, agora ganha prioridade no C-level.
Até poucos anos, a saúde era tratada como obrigação legal ou diferencial de atração de talentos, sem protagonismo nas agendas mais altas. No entanto, mudanças recentes – como o crescimento descontrolado dos custos e os impactos da pandemia – transformaram esse cenário. Em vez de ser uma preocupação reativa, a saúde passou a ser um pilar estratégico.
Hoje, consultores em saúde corporativa participam de reuniões com CEOs e conselhos de administração. Empresas líderes de mercado estão redesenhando sua relação com a saúde dos colaboradores, não mais como um gasto necessário, mas como um investimento com retorno direto na produtividade, imagem e sustentabilidade.
O custo da saúde corporativa é uma preocupação global. No setor automotivo americano, a General Motors quase quebrou nos anos 2000 por causa dos altos gastos com planos de saúde de seus funcionários – que superavam os custos de produção de um carro. Essa realidade extrema exemplifica a insustentabilidade do modelo atual.
No Brasil, a saúde sempre teve forte ligação com o ambiente corporativo. Desde a greve geral de 1917, esse tema é parte das exigências trabalhistas, culminando na criação do SUS e, posteriormente, da saúde suplementar. Atualmente, 72% das pessoas que possuem plano de saúde no país estão cobertas por apólices empresariais coletivas (ANS, 2025).
Esse dado revela uma verdade incômoda: as empresas são as principais financiadoras do sistema de saúde suplementar. Ao mesmo tempo, enfrentam um VCMH (Variação de Custos Médicos-Hospitalares) superior à inflação há anos. Após a pandemia, as operadoras de planos de saúde voltaram a lucrar, mas esse resultado veio do repasse dos custos aos clientes, não da redução de despesas.
Soluções como planos customizados, novas formas de pagamento e reorganização dos serviços estão exigindo engajamento além do RH. O tema subiu para o topo da hierarquia empresarial, pois exige uma visão estratégica integrada.
A pandemia mudou profundamente a relação da sociedade com a saúde corporativa. O medo, o isolamento e a crise nos sistemas de saúde despertaram um senso coletivo de urgência em relação ao cuidado com o bem-estar físico e mental. A saúde deixou de ser um recurso de emergência e passou a ser sinônimo de prevenção, segurança e estabilidade.
Esse novo olhar impactou diretamente o mundo do trabalho. O plano de saúde se consolidou como o benefício mais valorizado pelos profissionais brasileiros, superando bônus financeiros ou auxílios de alimentação. Hoje, ele é critério decisivo para atrair e reter talentos, especialmente em um cenário de incertezas constantes.
Além do valor funcional, ter acesso rápido a exames, especialistas e tratamentos virou símbolo de cuidado com o colaborador. Essa percepção reforça o papel da saúde como diferencial competitivo, fortalecendo employer branding, produtividade e engajamento.
Para as empresas, o desafio é transformar essa valorização em ações concretas. A saúde precisa sair da retórica e ganhar estrutura, investimento e foco estratégico, porque está diretamente ligada à reputação da marca e à longevidade do negócio.
A saúde corporativa sempre esteve presente, mas agora ela se tornou inadiável. Diante de custos crescentes, expectativas sociais elevadas e pressões por ambientes mais humanos, não há espaço para omissão. O CEO precisa assumir um papel ativo, liderando a transformação de uma lógica reativa para uma gestão estratégica da saúde.
Esse movimento cria um ciclo virtuoso: com foco coletivo, é possível desenhar soluções sustentáveis, integrar equipes multidisciplinares e envolver até mesmo o setor público em ações de impacto ampliado. A empresa que investir hoje, colherá produtividade, retenção e reputação no futuro.
O momento é de construção. Se houver cooperação entre empresas, operadoras, governo e profissionais de saúde, poderemos inaugurar uma nova fase – mais humana, mais eficiente, mais resiliente.
A saúde corporativa não é mais um custo a ser gerenciado: é um ativo a ser cultivado. E está nas mãos do C-level transformar esse novo protagonismo em legado.
*Murilo Wadt é cofundador e diretor geral da HealthBit, healthtech que integra as soluções B2B da RD Saúde.
Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube