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Por que a proibição dos cigarros eletrônicos no Brasil não é eficaz?

Cerca de 80 países já regulamentaram o uso de vaporizadores, com base em estudos que comprovaram o potencial risco reduzido à saúde

Mesmo com a proibição, o consumo aumenta a cada mês (Nick Ansell/Getty Images)

Mesmo com a proibição, o consumo aumenta a cada mês (Nick Ansell/Getty Images)

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Publicado em 9 de agosto de 2022 às 11h00.

Por Iuri Esteves*

O debate sobre o uso de vaporizadores e produtos de tabaco aquecido, conhecidos popularmente como cigarros eletrônicos, tem ganhado destaque na mídia. O que causa estranheza, no entanto, é o pouco espaço dado para um elemento crucial nessa discussão: o conceito da redução de danos para adultos fumantes.

Quando os cigarros eletrônicos foram proibidos no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em 2009, havia poucas evidências técnicas e científicas sobre os “Dispositivos Eletrônicos para Fumar” (DEFs), como são denominados pela agência. Hoje, mais de dez anos depois, dezenas de estudos realizados ao redor do mundo mostram que esses produtos têm o potencial de reduzir os conhecidos riscos do cigarro convencional à saúde, quando há substituição completa por vaporizadores ou produtos de tabaco aquecido. Mas isso só é possível se esses dispositivos estiverem sob controle sanitário, o que se obtém a partir de uma regulamentação adequada.

Entre as principais evidências está a comprovação de que a ausência de combustão do tabaco nos cigarros eletrônicos permite uma redução da exposição a substâncias tóxicas ou potencialmente tóxicas que, no caso dos vaporizadores, pode chegar a 99%, de acordo com o Public Health England (PHE). Adicionalmente, autoridades de saúde pública de renome, como o Health Canada, o Royal College of Physicians do Reino Unido, a subsidiária da Organização Mundial da Saúde na Europa e a americana Food and Drug Administration (FDA), homóloga da Anvisa, também já reconheceram o papel de potencial menor risco desses produtos em relação aos cigarros convencionais e estabeleceram regulamentações que atendem às suas realidades.

Embora esses exemplos globais ainda não estejam amplamente difundidos por aqui, felizmente o tema ganha corpo em alguns fóruns. Um deles foi o 22º Congresso Brasileiro de Toxicologia (CBTox), realizado no final de maio pela Sociedade Brasileira de Toxicologia, do qual a BAT Brasil participou, ao lado de alguns dos principais estudiosos em redução de danos, em uma mesa dedicada especialmente aos “estudos toxicológicos com dispositivos eletrônicos para fumar”.

Foi apresentado um estudo recente realizado no Reino Unido, publicado em 2021, com pouco mais de 500 participantes, em que foram avaliadas as alterações de dois tipos de biomarcadores - de exposição e de potencial dano - em adultos fumantes que passaram a consumir exclusivamente produto de tabaco aquecido ao longo de 6 meses. Esses mesmos biomarcadores foram medidos em adultos que optaram por continuar o consumo de cigarro convencional e também naqueles que cessaram o consumo de cigarros convencionais por completo.

Entre os que passaram a consumir exclusivamente o produto de tabaco aquecido, foi observada uma diminuição significativa na exposição a compostos tóxicos e potencialmente tóxicos e, consequentemente, alterações favoráveis nos biomarcadores de potencial dano. Segundo os dados, o efeito foi semelhante ao observado no grupo que optou por deixar de fumar. A conclusão é que os impactos negativos do ato de fumar podem ser reduzidos em fumantes que mudam completamente para o produto de tabaco aquecido.

Ampliação do debate

O espaço para que informações como essas possam ser compartilhadas na esfera pública, entretanto, precisa ser ampliado e não pode ficar restrito a fóruns técnicos. Reconhecer que os vaporizadores e produtos de tabaco aquecido são de fato alternativas de potencial menor risco à saúde para adultos fumantes contribuiria para uma regulamentação adequada, com regras claras, garantindo o controle sobre a composição dos produtos, a qualidade, a procedência e, principalmente, possibilitando estabelecer mecanismos para coibir o acesso de menores de idade a esses dispositivos que, é importante destacar, não são livres de risco.

A atual proibição já se mostrou ineficaz. O comércio, a importação e a propaganda de cigarros eletrônicos são 100% ilegais no Brasil, mas o consumo cresce a cada ano. Hoje, mais de 2 milhões de pessoas utilizam esses dispositivos no país, segundo levantamento do Ipec, sem regras, parâmetros ou informação. Não há nenhum controle da composição, procedência e segurança dos dispositivos.

É fundamental que o debate social, tanto na Anvisa quanto na comunidade científica, continue avançando no País para que seja estabelecida uma regulamentação equilibrada, que esteja atenta aos objetivos de saúde pública, ao grande mercado ilegal nacional e às evidências científicas que apontam que os vaporizadores e os produtos de tabaco aquecido têm o potencial de desempenhar um papel fundamental nas políticas de controle do tabaco. A própria Convenção-Quadro da OMS para o Controle do Tabaco contempla a redução de danos como uma forma de controle do tabagismo.

*Iuri Esteves é Gerente de Assuntos Científicos e Regulatórios da BAT Brasil

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