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PLAY: é do Brasil? Séries nacionais são, oficialmente, estrangeiras

Nova entidade cutuca as plataformas de streaming, querendo que registrem e paguem taxa para fomento à indústria

Sintonia, série brasileira da Netflix (Netflix/Divulgação)

Sintonia, série brasileira da Netflix (Netflix/Divulgação)

Danilo Vicente
Danilo Vicente

Sócio e diretor-geral da Loures Consultoria - Colunista Bússola

Publicado em 4 de novembro de 2023 às 08h00.

Tem pipocado na imprensa um debate interessante sobre propriedade patrimonial no streaming de vídeos. As séries brasileiras são, oficialmente, estrangeiras. 

O assunto veio à tona com Cangaço Novo, na lista das mais assistidas da Amazon Prime no Brasil e em países da África e do Oriente Médio. A produção aborda um fenômeno exclusivamente brasileiro (o cangaço da primeira metade do século XX e sua manifestação contemporânea), tem atores, diretores e roteiristas brasileiros e foi realizada por uma produtora brasileira. Porém, os oito episódios filmados na cidade de Cabaceiras, na Paraíba, não têm Certificado de Produto Brasileiro (CPB).

O problema com Cangaço Novo é rotineiro. Nenhuma série brasileira produzida diretamente para as plataformas de video on demand (VoD) tem o certificado. Sintonia e 3%, sucessos na Netflix, são exemplos.

A propriedade patrimonial desses produtos audiovisuais pertence às empresas estrangeiras de streaming, e não ao Brasil. Para que uma produção seja considerada brasileira, o CPB precisa ser requerido junto à Agência Nacional de Cinema (Ancine). 

Em setembro, doze associações e sindicatos criaram a Frente da Indústria Brasileira do Audiovisual Independente (FIBRAv) para tentar sensibilizar o Governo Federal, o Congresso Nacional e a sociedade a respeito dessa e de outras questões ligadas à regulação do VoD no Brasil. Há dois projetos de lei em tramitação em Brasília, um na Câmara e outro no Senado, que tratam do assunto. 

No fim das contas, a FIBRAv deseja que as produtoras brasileiras sejam as detentoras dos filmes e séries aqui filmados, até mesmo em parceria com as plataformas de streaming, e não mais em uma relação de contratada e contratante.

Condecine

A FIBRAv também resolveu cutucar as plataformas com outro ponto: quer que paguem a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).

Hoje, essa contribuição incide sobre a exploração de produtos audiovisuais em salas de cinema, TVs abertas, TVs fechadas e telefones móveis. Nada de streaming, um caso em que a legislação não acompanhou o avanço tecnológico.

A FIBRAv defende que passe a existir a Condecine VoD, com alíquota de 14% sobre a receita bruta anual das plataformas, com até 70% desse valor podendo ser abatido para aquisição, por prazo determinado, de direitos de exibição de obras audiovisuais brasileiras independentes, majoritariamente inéditas (realizadas por produtoras independentes que não sejam controladoras, controladas ou coligadas a grandes players).  Esse licenciamento pode acontecer tanto para aquisição de obras já existentes quanto para novos filmes, séries e outros formatos de interesse dos serviços de streaming.

É claro que o percentual de 14% assusta. E o consumidor não pode ser prejudicado, pagando o ajuste, nem as produções devem deixar de acontecer no Brasil. Mas é importante atentar para a proposta de abatimento que se segue à alíquota. São 70% de abatimento. Isso significa que as plataformas podem usar este “desconto” em produções brasileiras, da forma que acharem melhor, o que elas já fazem hoje – com a diferença de que, neste caso, a propriedade patrimonial ficaria com a produtora brasileira independente, e não com a plataforma. Restariam 4% para pagar à Condecine VoD.

Se hoje há pagamento de contribuição para obras voltadas a TV, cinema e até operadoras de telefonia, nada mais correto que a legislação seja atualizada para streaming.

O mesmo vale para o Certificado de Produto Brasileiro. Se o produto é genuinamente brasileiro, precisa ser registrado como tal.

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