Com a consolidação desse novo modelo, o país dá um passo significativo rumo a um ecossistema mais justo (Getty Images/Getty Images)
Plataforma de conteúdo
Publicado em 11 de novembro de 2025 às 09h30.
Última atualização em 11 de novembro de 2025 às 12h03.
Por Leonor Cordovil*
O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinará o decreto que regulamenta as novas regras do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT).
Entre as principais medidas, destaca-se a redução da taxa cobrada pelas operadoras de vale-refeição e vale-alimentação — o chamado Merchant Discount Rate (MDR). Contudo, o ponto mais relevante é a transformação dos arranjos fechados em arranjos abertos, abrindo caminho para a tão aguardada interoperabilidade no setor.
No modelo anterior, os cartões eram restritos a redes credenciadas e aceitos apenas em estabelecimentos previamente cadastrados.
Com o novo decreto, eles passam a ser aceitos em qualquer estabelecimento, independentemente da bandeira, e os arranjos deverão interoperar de forma semelhante ao sistema de cartões de débito e crédito.
O Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou recentemente que a mudança “vai favorecer o pequeno comércio, o pequeno restaurante. Zero impacto para o trabalhador”.
Entretanto, é possível afirmar que o trabalhador — portador do cartão — será o principal beneficiário, uma vez que o decreto consolida um ambiente de maior concorrência e liberdade de escolha.
O setor de benefícios movimenta aproximadamente R$ 150 bilhões por ano. Estudos de consultorias indicam que o mercado global deve crescer de US$ 245 bilhões para US$ 407 bilhões até 2032.
Caso o Brasil acompanhe essa tendência, haverá um aumento no número de trabalhadores beneficiados e, com uma regulamentação adequada, ampliam-se as oportunidades para novos prestadores de serviço e empresas atuantes no segmento.
Desde a promulgação da Lei nº 14.442, de 2022, o setor vem se adaptando à nova realidade.
Empresas que dominaram o mercado por décadas, sob um ambiente de concorrência limitada, agora enfrentam a entrada de novos agentes com potencial para desafiar sua hegemonia.
Espera-se que as líderes do setor se integrem plenamente ao novo modelo de arranjos abertos, com interoperabilidade e, futuramente, portabilidade.
No contexto dos pagamentos eletrônicos, a interoperabilidade representa a capacidade de interação operacional entre diferentes redes e sistemas de pagamento.
Do ponto de vista regulatório, ela estimula a colaboração entre agentes econômicos e garante que o usuário de um sistema possa usufruir de serviços oferecidos por outro, de forma integrada e eficiente.
No setor de cartões, a interoperabilidade foi decisiva para o avanço observado na última década.
Desde a promulgação da Lei nº 12.865/2013, que estabeleceu o marco regulatório do setor, observou-se um aumento expressivo na concorrência: se em 2009 existiam apenas duas credenciadoras, em 2025 já são mais de trinta, respondendo por cerca de 30% do mercado.
Tal abertura resultou em maior competitividade, inovação e redução de custos.
Por outro lado, o antigo sistema de arranjos fechados, típico dos vouchers, restringia a competição.
Nele, as “bandeiras” acumulavam funções de instituidora, emissora e credenciadora, concentrando poder e impedindo a interoperabilidade.
Essa estrutura consolidou um oligopólio de quatro grandes empresas, com forte presença nacional e reduzido incentivo à inovação.
Em um ambiente de regras claras, padrões comuns e práticas não discriminatórias, surgem incentivos reais para a entrada de novos participantes.
O acesso a dados de transações e de estabelecimentos reduz barreiras de entrada e fomenta a inovação.
Durante a audiência pública que discutiu as mudanças no PAT, em 2022, o Ministério do Trabalho reconheceu o potencial do mercado para o desenvolvimento de novas tecnologias e inovações normativas, com vistas à ampliação da competitividade e da eficiência.
Assim, a regulamentação deve ser guiada por princípios que promovam a concorrência e incentivem a abertura de arranjos de pagamento com participação relevante no mercado de vouchers.
A regulamentação do PAT representa um marco de modernização e abertura no sistema de benefícios alimentares no Brasil.
A adoção de arranjos abertos e interoperáveis favorece a competição, estimula a inovação tecnológica e, sobretudo, amplia as opções para o trabalhador.
Com a consolidação desse novo modelo, o país dá um passo significativo rumo a um ecossistema mais justo, eficiente e alinhado às melhores práticas internacionais de pagamentos eletrônicos.
*Leonor Cordovil é professora da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Sócia do escritório Grinberg Cordovil.