Jovem quer saber quais as possibilidades que terá para o seu desenvolvimento profissional. (We Are/Getty Images)
Bússola
Publicado em 20 de abril de 2022 às 20h27.
Por Edson Vismona*
Vivemos neste século profundas modificações no mercado de trabalho, desde a dominância do uso de ferramentas digitais até o crescimento, com a pandemia, do chamado teletrabalho. O impacto na vida de todos foi amplo.
A adaptação às mudanças tem sido mais difícil para as chamadas gerações analógicas, que precisam lidar com paradigmas que não tiveram na sua formação, mas também os mais jovens enfrentam novos desafios, especialmente relacionados com a inserção no mercado de trabalho.
No final do mês de março o Instituto Coca-Cola, o ETCO e a Cufa – Central Única das Favelas realizaram uma Live tratando desse tema: Ética, Juventude e o Mundo do Trabalho com a participação de jovens que têm procurado ingressar no seu primeiro emprego. Ficou claro que a formação profissional, a incorporação da tecnologia, a compreensão de como funciona a estrutura organizacional das empresas, o sentido de responsabilidade e inovação são fatores importantes, mas o comportamento, as regras de convivência passam a ser cobrados nos dois sentidos: do mercado junto aos jovens e destes perante as empresas. Os questionamentos demonstram que atitudes, antes não tão consideradas, passaram a ser determinantes.
O jovem quer saber quais as possibilidades que terá para o seu desenvolvimento profissional; se a empresa estimula a participação, dando liberdade para manifestar sua opinião; se o horário é flexível, enfim, por meio de maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, são apresentados aspectos relacionados à felicidade. Interessante notar que em pesquisa realizada pelo Linkedin as respostas relacionadas ao dinheiro (aumento salarial, ganhar mais que seus amigos) ficaram em um patamar mais baixo.
Esse é o retrato do posicionamento do jovem, já pelas empresas, há também a preocupação com relação à postura do jovem em relação a valores e princípios, as práticas relacionadas ao exercício profissional poderão ensinadas, mas a compreensão do que é certo, honestidade, caráter, respeito devem ser encarados como uma postura que antecede às competências para o trabalho.
Aliás, essa compreensão sobre valores éticos ficou demonstrada na pesquisa nacional realizada pelo ETCO/Datafolha sobre a percepção da ética pelos jovens, onde esses quesitos foram apontados quando pensam no que significa ser ético.
Essa visão sobre ética no mercado de trabalho foi igualmente atestada em outra pesquisa realizada pela consultoria Eureca, indicando que os jovens consideram que as métricas ESG devem ser respeitadas pelas empresas, assim, posturas de defesa do meio ambiente, de temas atinentes à inclusão, diversidade, governança, combate à corrupção são cobrados.
Nesse aspecto existe clara convergência, jovens e empresas cada vez mais se direcionam para novas posturas e propósitos, buscando um ambiente de trabalho mais saudável, ético e de acolhimento, no fortalecimento da identidade e da satisfação de pertencer à organização.
Os dados apresentados nessas pesquisas são indicativos interessantes do momento que vivemos, da necessidade de encararmos novas posturas, em claro sentido de evolução de comportamentos e de exigências.
A constante adaptação é necessária, a postura dogmática ficou ultrapassada, o exercício de valores passou a ser regra.
Essa realidade se, de um lado, demonstra um sentido de progresso nas expectativas, de outro, me desperta preocupação, pois percebemos, não só no Brasil, mas em todo o mundo, que as lideranças, especialmente na esfera política, não demonstram estar alinhadas com esse momento que se apresenta como disruptivo, o velho ficou para trás, mas o novo ainda não se consolidou, o discurso precisa ser colocado em prática.
Não é sem razão o afastamento que o jovem tem demonstrado com relação à política. Ele não percebe nas nossas instituições compromisso com os padrões que defendem, que não compartilham com a sua visão de mundo. Isso não é novidade, a juventude sempre questionou o status quo, porém, identificava no exercício da política uma ação que poderia viabilizar mudanças, daí o movimento estudantil. Hoje, contudo, constato uma desilusão, um desalento com o exercício da política como um efetivo pacto com o interesse público.
A nossa obrigação, como organizações sociais e empresariais, está clara, temos, que defender uma clara atitude de defesa e prática de valores que fortaleçam nosso propósito e envolvam os mais jovens. Eles apontam o que desejam, precisamos pavimentar o caminho, para auxiliar no alcance do destino comum.
*Edson Luiz Vismona é advogado, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial — ETCO e do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade — FNCP. Foi secretário da justiça e defesa da cidadania do Estado de São Paulo (2000/2002)
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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