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Nossa Justiça está preparada para o metaverso?

Diante deste novo universo existe uma lacuna de regulamentação e legislação específica que trate das relações jurídicas presentes no metaverso

Existirá cada vez mais multidisciplinaridade de conceitos em um universo permeado por diversos tipos de relação jurídica (Thinkhubstudio/Getty Images)

Existirá cada vez mais multidisciplinaridade de conceitos em um universo permeado por diversos tipos de relação jurídica (Thinkhubstudio/Getty Images)

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Publicado em 4 de fevereiro de 2022 às 16h30.

Última atualização em 4 de fevereiro de 2022 às 16h39.

Por André Thomas Fehér Junior*

Metaverso, NFT’s, tokens, criptomoedas, blockchain, Web3, DAOS… certamente o conjunto de palavras do momento. Especificamente sobre o metaverso, Mark Zuckerberg — sócio e fundador da Facebook Inc. — anunciou a alteração do nome de sua principal mídia social para “Meta”, levando a crer que estamos falando de algo completamente novo.

Mas, na verdade, o conceito de metaverso já ocupa o nosso imaginário há algum tempo. Como uma maneira de antever o que ocorreria de forma mais latente no mundo atual, o termo “metaverso” foi expresso pela primeira vez em 1992, no romance sci-fi, Snow Crash, de Neal Stephenson — onde humanos e seus avatares interagem entre si em um espaço virtual que usa a metáfora do mundo real. Também, mais conhecida e revivida atualmente no seu quarto filme, o lançamento do filme Matrix em 1999 revelou a experiência do ser humano confinado em uma realidade virtual mediante simulação.

Analisando essa experiência dentro dos mercados do entretenimento e eSports, o metaverso traz em seu universo definições subjetivas variadas, com a presença das mais diversas ações de personagens e avatares, por meio da prática dos jogos eletrônicos, de postagens, lives de cantores e DJs, animações, streaming, dancinhas de TikTok, entre outros.

Adicionalmente, pode-se notar que a maioria dos conteúdos inseridos nesse universo é identificada na forma de ativos digitais, integrados em diversas mídias sociais, jogos eletrônicos, redes sociais, plataformas de produtos e serviços, expostos como obra de arte, imagens e/ou vídeos, arquivos, cartões comerciais e/ou imagens semelhantes, em qualquer outro tipo de meio ou suporte digital.

Portanto, o mundo metaverso é um universo digital com a presença de distintas dimensões, com interação muito clara entre o mundo real e o mundo virtual, levando-nos, inclusive, a uma sensação de pertencimento.

Por outro lado, podemos identificar diante desse novo universo que, além de não haver uma definição consolidada, existe, consequentemente, uma lacuna de regulamentação e legislação específica que trate das relações jurídicas presentes no metaverso.

Similarmente, há aproximadamente cinco anos, o mercado de eSports se popularizou como um mercado com a presença de valores vultosos, inovador e com um potencial enorme de crescimento. Sem uma definição clara e ausência de legislação específica, foi possível identificar que os esportes eletrônicos poderiam ser enquadrados como modalidade esportiva, e por conseguinte, aplicar as legislações desportiva — Lei nº 9.615/98 e trabalhista, principalmente, nas relações entre clubes e atletas, como abordado em outro artigo na época para a ESPN.

Inclusive, os próprios Tribunais de Justiça do Trabalho passaram a ter esse entendimento, reconhecendo em suas decisões a existência de vínculo empregatício na maioria das relações entre clubes de eSports e atletas, como no caso do atleta Carlos “Nappon” Rucker.

No mesmo sentido, podemos dizer que os ativos e as particularidades do metaverso atravessam um limbo jurídico, porém, sendo possível identificar a aplicação da regulamentação trazida em legislações atuais, tais como a Lei de Propriedade Intelectual — ao tratarmos de direitos autorais decorrentes das obras inseridas dentro deste contexto — podendo ou não serem modificados, distribuídos, vendidos, ou de qualquer outra forma, preservados em formato digital. É o que se pode verificar nos ativos mais conhecidos como tokens não fungíveis (NFTs), emitidos e integrados à tecnologia blockchain ou semelhante.

Se analisarmos ainda os “jogos NFT’s”, que têm sido cada vez mais populares aos consumidores dos jogos eletrônicos em geral, podemos verificar que, além das preocupações envolvendo a propriedade intelectual — i.e. o reconhecimento de autoria de obra de produção intelectual tais como invenções, patentes, marcas, desenhos industriais — há direitos combinados, tais como os direitos de imagem, direitos de obra, dados de usuários das plataformas, ativos criptográficos, entre outros, que necessitam de previsão nas relações jurídicas existentes, sem prejuízo da incidência da legislação desportiva, pautados pelo ecossistema competitivo.

Também em caráter ilustrativo, vale mencionar o investidor de criptomoedas, conhecido no mercado como “P-Ape”, que pagou cerca de R$ 2,5 milhões pelo terreno “Wave 1 – 3 × 3 Estate S [12, -75]”, localizado ao lado do terreno de Snoop Dogg na plataforma de blockchain denominada por “The sandboX”. Certamente, tais fatos geraram relevantes preocupações jurídicas financeiras presentes no direito bancário e regulatório, além de todas as demais preocupações anteriormente mencionadas.

Dessa forma, é possível identificar cada vez mais a possibilidade de termos uma multidisciplinaridade de conceitos e matérias em um universo permeado por diversos tipos de relação jurídica, sem prejuízo da aplicação de legislações até então conhecidas.

Ainda que se possa fazer uma reflexão sobre a responsabilidade da nossa sociedade em relação a como iremos enfrentar e lidar com essa nova realidade, a combinação de conceitos, definições jurídicas e até mesmo exploração da tecnologia nesse universo demandará inovações na aplicação do direito, já que estamos cada vez mais imersos nas atividades virtuais.

*André Thomas Fehér Junior é advogado e associado da área de esporte, entretenimento e eSports do CSMV Advogados

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