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No domínio das incertezas: agravamento da pandemia e sinais dúbios na política pressionam economia

Próxima reunião do Copom será primeiro teste para autonomia do Banco Central e põe em xeque credibilidade do comitê

Banco Central (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Banco Central (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Mariana Martucci

Mariana Martucci

Publicado em 2 de março de 2021 às 15h23.

O agravamento da pandemia no início de 2021, o aumento do número de casos e de mortes, a ameaça de colapso do sistema de saúde em várias regiões, com a consequente volta das medidas de restrição à mobilidade urbana e o fechamento de atividades não essenciais, como comércio, bares e restaurantes, e a falta de vacinas, já começam a ter efeitos negativos sobre o nível de atividade, que mostra sinais de desaquecimento neste início de ano.

Por outro lado, a eleição dos novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado destravou a pauta do Congresso, com a aprovação da autonomia do Banco Central, de um novo marco regulatório do mercado de câmbio e com o início da tramitação da PEC da Reforma Administrativa, enviada para análise na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e a instalação da Comissão Mista do Orçamento (CMO) no Senado.

A promessa de aprovação do Orçamento de 2021 até o final de março, o envio ao plenário do relatório da PEC Emergencial, com expectativa de discussão e votação amanhã, 3 de março, também são fatores positivos que podem afetar o comportamento da economia no futuro.

Ao mesmo tempo, os sinais dúbios do governo quanto à manutenção de uma estratégia de redução da participação do Estado na economia – de um lado, a intervenção atabalhoada do Presidente da República na Petrobras e, de outro, o envio à Câmara do Deputados de Medida Provisória para viabilizar a privatização da Eletrobras e um Projeto de Lei que permite aos Correios fazer parcerias e concessões para a oferta de serviços em conjunto com o setor privado, um passo importante em direção à privatização da empresa – geraram grande incerteza quanto ao futuro da política econômica do governo, colocando em dúvida até mesmo a permanência do ministro da Economia no cargo.

A este cenário interno de grandes incertezas, soma-se que o novo governo dos Estados Unidos enviou ao congresso um projeto de incentivo fiscal de US$ 1,9 trilhões, aproximadamente 10% do PIB do país, o que, combinado à rapidez do processo de vacinação que deverá gerar forte reativação da economia, começa a preocupar analistas e investidores quanto a uma possível pressão inflacionária na maior economia do mundo.

Como consequência, muitos investidores já começaram a precificar o aumento da probabilidade de que o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, será forçado a iniciar um processo de redução dos estímulos monetários antes do esperado, com aumento da taxa de juros e redução da liquidez. As taxas de juros dos títulos mais longos, assim como a inclinação da curva de juros, aumentaram significativamente, gerando uma fuga de recursos dos países emergentes, com valorização do dólar em relação às moedas desses países.

Este conjunto de incertezas gerou forte pressão sobre o prêmio de risco e sobre a taxa de câmbio do Brasil, aumentou as expectativas para a inflação em 2021 e 2022 e, com isso, a probabilidade de que a normalização da política monetária no país, com elevação da taxa básica de juros (Selic), também seja antecipada já para a próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), em março, com aumento de 0,5 ponto percentual.

Este será o primeiro teste da recém-aprovada autonomia do Banco Central.

Para muitos analistas, diante do atual cenário de incertezas, somente ingerências políticas justificariam o Banco Central não iniciar a normalização da política monetária em março. Por outro lado, como não existe unanimidade de que essa é a estratégia de política monetária adequada, uma parte dos investidores avalia que, caso o Banco Central efetivamente aumente a taxa de juros, terá se “rendido” à pressão dos investidores mais conservadores. Em ambos os casos, a credibilidade da autoridade monetária estaria em jogo. Nesse contexto, qualquer que seja a decisão do Comitê, o comunicado e a ata a serem divulgadas após a reunião serão fundamentais para evitar a perda de credibilidade.

*José Márcio Camargo é professor do Departamento de Economia da PUc do Rio de Janeiro e Economista Chefe da Genial Investimentos

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