De dúvida em dúvida, as incertezas criam mais questionamentos e interrogações antes da definição do voto (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Bússola
Publicado em 4 de fevereiro de 2022 às 15h08.
Última atualização em 4 de fevereiro de 2022 às 15h23.
O Congresso Nacional inovou e abriu a possibilidade de partidos políticos formarem federações partidárias para a disputa das eleições de 2022. O projeto sancionado é singelo. Vago mesmo. Tão superficial que flutua como nuvem sobre a Justiça Eleitoral exigindo esclarecimentos.
Diante do quadro precário montado pelos políticos que aprovaram a medida, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi instado a esclarecer as partes obscuras que saíram das mãos de deputados e senadores que disputarão a eleição deste ano.
A federação, segundo a lei, deve unir os partidos sob um só estatuto e funcionamento legislativo uniforme por quatro anos — uma só liderança no legislativo, por exemplo. Ele nacionaliza as legendas e pretende reduzir o número estratosférico de siglas do país. É uma verticalização com outra grife.
De boas intenções o escaninho do Judiciário está lotado. Essa é mais uma intenção que obrigará o ativismo judiciário a entrar em cena, mesmo que de forma passiva. Exemplo mais gritante na nova lei é o fato de se exigir a formalização da federação em março, quando os partidos definem candidaturas e alianças em convenções oficiais somente no período de 20 de julho a 5 de agosto. Num país em que os políticos trocam mais de convicções do que de terno, é difícil garantir que o combinado hoje será o mesmo dentro de quatro meses.
E se o partido não aprovar, em convenção, a federação protocolada na Justiça Eleitoral? Ficará sem fundo partidário por quatro anos? Não poderá participar de outra federação nas duas eleições nacionais subsequentes como prevê a lei? Vale uma instância partidária reduzida ou vale a reunião mais ampla? O PT pediu prorrogação do prazo… corretamente.
A federação cria um partido de caráter único nacional. Obriga a repetir nos estados e municípios o mesmo quadro. É benéfico diante da fragmentação de mais de 20 legendas no Congresso. Mas vamos lembrar que a verticalização determinada pelo Supremo Tribunal Federal foi derrubada por emenda constitucional no passado. Por isso, o PTB bateu às portas do Supremo, alegando que o projeto fere a autonomia partidária e o federalismo.
E os imbróglios se expandem no tempo para as federações. Como dura quatro anos, valerá para as próximas eleições municipais. Valerá mesmo? Já há parlamentares querendo mudar isso na próxima legislatura, em 2023. A regra do jogo incomodou porque há peculiaridades locais que não se suportam, mesmo que no plano nacional se tolerem. Bom lembrar do americano Tip O’Neill: toda política é local. E a confusão se espraia no geral.
É insegurança jurídica mesmo, das boas. O funcionamento das tais federações seguirá a legislação eleitoral uma vez formada a federação. Num determinado estado, esses partidos unidos terão o mesmo candidato a governador e a senador. Como nem mesmo dentro das mesmas siglas a fidelidade partidária vale muito, com várias letrinhas associadas, será um festival de traições federalizadas. Nas conversas para a formação dessas alianças já se nota a vertente da sarna que se procura estabelecer para o eleitor se coçar.
A legislação eleitoral também terá outros questionamentos a serem interpretados de forma mais abrangente, ou restritiva. Um dos pontos é a interpretação sempre em desfavor de minorias que buscam se afirmar: foi instituída a obrigatoriedade de repasse de recurso às candidatas mulheres na mesma proporção do número obrigatório de percentual de candidatas, 30%.
Mas se o partido tiver uma candidata mulher ao Executivo, por exemplo, esse gasto a mais com ela poderia ser computado dentro do percentual de candidatas ao Legislativo? No caso de homens, isso não está posto. E a candidatura proporcional não se mistura com a majoritária. Mas já há dirigentes partidários loucos para fazerem a manobra. Vai que cola….
De dúvida em dúvida, as incertezas criam mais questionamentos e interrogações antes da definição do voto. Só nos resta chamar o TSE.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.
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