Centrão está mais poderoso do que nunca (Marcello Casal Jr./Agência Brasil)
Bússola
Publicado em 2 de dezembro de 2022 às 14h00.
O chamado Centrão é uma máquina política parlamentar que se une por interesses diretos e peculiares, em geral para criar mecanismos de pressão sobre o presidente da República. As correias desse aparelho tensionam o ocupante do Palácio do Planalto, com redução até de seu espaço de manobra e sobrevivência (o impeachment é item da caixa de ferramentas mais letal). De forma mais corriqueira, usam drenos para liberação de emendas ao Orçamento diretamente às suas bases eleitorais e criam acesso preferencial à coluna social mais badalada de Brasília, as páginas de nomeações do Diário Oficial da União.
O Centrão é hoje mais poderoso do que nunca antes na história desse país. Chegou ao núcleo central de poder. E perdeu a eleição ao apostar na continuidade de Jair Bolsonaro. Nem por isso será varrido às margens do processo decisório. Pelo contrário, tomou posse da vassoura e parece conduzir o que será deixado dentro e o que ficará fora das negociações da Proposta de Emenda à Constituição da Transição, que libera recursos para continuar a pagar R$ 600 no próximo ano para a população vulnerável, o Bolsa Família.
O presidente eleito Lula ficou fora uma semana e, no retorno, mandou a turma tocar a vida apresentando a PEC como estava, com aumento de despesa de R$ 198 bilhões, indefinidamente. Deve levar, no máximo, R$ 135 bilhões por dois anos. E as negociações continuam, com ameaças do Centrão vassourar mais alguns bilhões e diminuir a margem orçamentária para o próximo ano. O futuro governo já percebeu que deve ficar esperto, pois a conversa com o Centrão é sempre uma eterna negociação, afinal, eles são helênicos clássicos e apreciam o Mito de Sísifo, dentre outras coisas mais. Não costumam digerir bem a ironia…
Outra característica marcante do Centrão atual, que o difere do surgido nos anos de 1980 quando os constituintes negociavam com o ex-presidente José Sarney, é sua pluralidade partidária. Naqueles tempos, o PFL era central na organização, com coronelismo patrimonialista defendendo interesses muito específicos para evitar o avanço de grupos de esquerda, ou arrancar algumas concessões de rádio e TV na negociação para permitir a Sarney ficar cinco anos palaciando no Planalto.
Nos tempo atuais, o Centrão é uma Sociedade Anônima. Embalada pelo orçamento secreto e pelos acordos da calada da noite, cresceu muito além do fisiologismo puro e simples. Por vezes, verbas e cargos são embalados num pacote que esconde o verdadeiro autor da arte. Mesmo que seja um sucesso, ninguém pode pedir a presença do autor no final do espetáculo. Nem a Polícia Federal… Tem muita gente de centro nesta história, mas tem gente de direita e, também, da esquerda que entrou em crise de abstinência depois de ficar alguns anos no poder de 2003 a 2016….
A força do atual Centrão que embala a reeleição de Arthur Lira (Progressistas-AL) vai além de uma simples união de alguns partidos para comandar a Câmara dos Deputados. Virou um modus operandi, uma práxis parlamentar que atrai cada vez mais deputados e senadores, principalmente porque oferece ferramentas eleitorais mais seguras e permanentes do que a relação tênue com a ideologia do governo eleito para comandar o país.
Lula até ameaçou não apoiar Lira e abrir o orçamento secreto durante a campanha, mas foi pragmaticamente olhando o tamanho da briga e evita agora entrar em desvantagem na arena política, que pode ser mais sangrenta que o Coliseo de Roma nos tempos de seu auge. Faz bem em evitar essa briga. Até porque, como é uma Sociedade Anônima, a associação com o Centrão é melhor do que com os derrotados famosos que ficaram pelo caminho sem terminar o mandato presidencial…
*Márcio de Freitas é Analista Político da FSB Comunicação
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