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Márcio de Freitas: A impotência é decisória

O teto está sendo implodido porque o governo decidiu não escolher as prioridades e enfrentar o debate com os políticos e o Congresso

Cenário é o mesmo; e algum governo vai pagar no futuro... (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Cenário é o mesmo; e algum governo vai pagar no futuro... (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

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Publicado em 21 de outubro de 2021 às 20h27.

Última atualização em 22 de outubro de 2021 às 16h40.

Por Márcio de Freitas*

O governo fraquejou em decidir sobre o caminho mais transparente para criar um substituto ao auxílio emergencial e elevar a outro patamar o novo bolsa família, o auxílio brasil. Deixou a responsabilidade fiscal na mão. E isso gerou estresse na nuvem chamada mercado, que hora está de um jeito nos céus, hora cai como chuva ao chão com enxurrada de perdas nos monitores interligados ao mundo bloombergiano. Os indicadores caíram dois dias seguidos, numa brochada geral das expectativas futuras.

Não há caminho do meio nesta tentativa rústica de dar com uma mão a ajuda social que será retirada pela mão grande da inflação em ato contínuo, usando justamente a mudança de período da inflação medida pelo IPCA para abrir um puxadinho de mais R$ 80 bilhões além-teto. Fórmulas criativas fracassaram repetidas vezes no país. Foram até aposentadas, mas há autoridades poderosas insistindo em ressuscitá-las. É o autoengano de solucionar um problema complexo com uma gambiarra simples, e equivocada. O valor do dólar frente ao real deixou isso patente.

Não é o mercado que limita as alternativas e procura garantir seus ganhos alucinados nas rodas da fortuna das bolsas de valores. O desequilíbrio fiscal gera perda generalizada para a população, principalmente os mais pobres. É indefectível burrice imaginar a elite gananciosa perdendo dinheiro ao praticar o harakiri de jogar as cotações ao chão por faniquito. Ricos e elite conseguiram sempre se proteger de governos ruins. Sem esforço. Ao invés de produzir e gerar riqueza pondo dinheiro para circular, fazem nada com aplicações rentabilizadas em títulos caros que o Tesouro Nacional tem que emitir para rolar suas contas. Atrelam seus rendimentos à inflação, criam uma estratégia indexada e seguem para alguma ilha paradisíaca com parte de seu patrimônio.

É o cidadão que come arroz com feijão (quando tem) quem paga (quando consegue) a conta mais alta da emissão de moeda ou desses títulos inflacionados pela falta de credibilidade do governo. Ele paga com falta de emprego, porque o empresário não cria nada com seu dinheiro porque é mais fácil ganhar sem fazer esforço.

A coisa é muito pior, na verdade. O teto está sendo implodido porque o governo decidiu não escolher as prioridades e enfrentar o debate com os políticos e o Congresso, mas se juntou a eles pela única prioridade, a reeleição. Hoje, há emendas de relator da ordem de R$ 30 bilhões no Orçamento de 2022. É um escândalo. Será maior ainda quando apurado o que o ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, revelou na Câmara: há uma indústria de comercialização dessas emendas…

Ninguém em Brasília topou chamar os relatores do Orçamento para essa festa pobre e discutir como pagar um benefício melhor para o pessoal sem comida. Se fossem, alguém poderia pedir uma esmola… como destinar o valor dessas emendas para o auxílio brasil, por exemplo. Mas aderiu-se à impotência decisória.

O Congresso discute a PEC dos Precatórios como forma de dar um calote parcial nos credores. E tentar aproveitar o momento para abrir o baile da ilha da irresponsabilidade fiscal. O DJ é do Centrão. Na trilha sonora, o ritmo é de como incluir outras despesas fora do teto. Ou seja, demoliram o teto, e a credibilidade fiscal, com o argumento que precisam garantir compra de vacinas, emendas parlamentares, programa social, despesas com combustível de caminhoneiro, aumento para os servidores públicos…. Navegador de sete mares sempre quer mais.

Aumento para servidores? Isso mesmo. Eles que não perderam os empregos, cuja reforma administrativa (parada na Câmara) só terá os primeiros efeitos em 20/30 anos terão direito a aumentos salariais em ano eleitoral. On time. Essa briga para adiar novamente esse bônus para a casta privilegiada não foi também enfrentada. Baila um pouco mais a ala dos napoleões famintos.

As construções de Brasília têm rara beleza, mas são inóspitas para boas ideias responsáveis e compromissos fiscais em períodos anteriores às eleições. Pensa-se que certas armas garantem a vitória. Na verdade, há o risco da ascensão do baixo clero da política, que passou a mandar no país depois da implosão dos tradicionais atores dos últimos 25 anos, ponha em risco pilares básicos, como o Real e a estabilidade da moeda. Quem viveu os períodos anteriores, sabe o preço reajustado diariamente que isso custará.

Não há pão para o povo? Comprem brioches. Não há dinheiro? Comprem e prometam juros. Algum governo pagará no futuro…

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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