Estratégia poderá consolidar a força política para estabilizar sua terceira gestão (Cláudio Kbene/PR/Flickr)
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Publicado em 27 de julho de 2023 às 20h00.
Última atualização em 27 de julho de 2023 às 20h07.
Por Márcio de Freitas*
Com uma alavanca e um ponto de apoio, o grego Arquimedes prometia mover o mundo. É mais ou menos o que o presidente Lula pretende fazer ao trazer o Centrão para dentro do governo, de fato e direito. É um ponto de apoio que poderá consolidar a força política fundamental para estabilizar sua terceira gestão e alcançar condições de governabilidade sem sustos ou surpresas no Congresso Nacional.
A alavanca é o Centrão, cujos votos o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), manipulou publicamente em votações recentes como a aprovação da reforma tributária. Não é um patrimônio do governo... ainda não é. Juntos, ponto de apoio e alavanca podem mover pautas importantes para o governo que joga pôquer na formação de uma base parlamentar com os partidos que frequentam a feira do Congresso.
Lula III ainda não tem uma base sólida para chamar de sua nem pode se arriscar a usar ferramentas do passado. Isso ficou claro desde a eleição, com o parlamento emergindo das urnas mais conservador e liberal do que o governo de tendência esquerdista. Essa equação obriga o Palácio do Planalto a fazer concessões de espaço político para formar sua coalizão.
Lula arrumou as suas cartas primeiro, vendo o que tinha em mãos. Descartou uma aqui, sinalizou que pode abrir mão de outra, e pede mais cartas aos crupiê para avaliar melhor o jogo. Faz isso desde antes do recesso parlamentar. Observa as cartas do adversário que pode virar aliado: Arthur Lira. Que também mexe os dedos, olha o que tem nas mãos e faz cara de obstinado liberal para as câmeras de TV.
Lira mostrou que tinha bons trunfos na votação da reforma tributária. O Ás estava entre de maior importância naquele momento da votação, mas poderia perder valor na mesa quando o Senado entrasse na rodada. Lira escondeu cartas assim que recebeu de volta o novo arcabouço fiscal para permanecer em outra rodada de votação na Câmara, e espera agora a vez de Lula abrir o jogo com as negociações e as figuras carimbadas dos deputados ministeriais. Assim, ficou com outra cartada na mão... como pode acontecer em outras matérias pelos próximos 18 meses. Tem muito tempo para jogar em mesa estratégica.
Se Lula joga com cálculo, Lira também conta as cartas na mesa. Cada um mostra seus trunfos, mas há outras na manga que aparecem repentinamente na política. E assim eles estão estabelecendo as regras de um jogo muito próprio. A presidência hoje é menor politicamente do que foi quando Lula I e Lula II comandaram o país. O Congresso tem mais autonomia e mais poder, conferido pelas emendas RP9 e seus meandros misteriosos que fogem da transparência e da discricionariedade do governo federal. Essa independência diminuiu a força de Lula III.
Mas o governo ainda tem mecanismos de outro naipe para agilizar ou retardar esse processo de liberação, o que o faz crescer no jogo. E tem o bônus do straight flush ministerial, os cargos de primeiro, segundo e terceiro escalão que significam a sequência de cartas mais poderosa da política brasileira. Essa conjugação é a força que move a alavanca, usa o ponto de apoio e garante o sucesso de qualquer articulação política.
Nem precisa gritar “eureca!”, como fez Arquimedes ao sair nu do banho após descobrir a solução de problema matemático. É só usar com habilidade o mecanismo da alavanca que o governo terá muitas vitórias no parlamento pelos próximos meses. Há muito político nu, pronto a vestir o terno de posse e fazer o L em Brasília nestes dias de otimismo com a economia e o governo.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
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