Pessoas com deficiência não são anormais, assim como qualquer outro grupo minorizado. (Ale Cabral/CPB./Agência Brasil)
Bússola
Publicado em 25 de agosto de 2021 às 19h44.
Última atualização em 25 de agosto de 2021 às 20h21.
Por Beta Boechat*
Os Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020 chegaram. Se você já ficou animado com a performance do Brasil nos Jogos Olímpicos, vai se surpreender com o nível da competição e das vitórias paralímpicas. A título de comparação, enquanto a equipe de atletas brasileiros terminou os Jogos do Rio 2016 com 19 medalhas, em 13º lugar no ranking geral, a equipe paralímpica levou nada mais nada menos que 72 pódios, alcançando o oitavo lugar entre os melhores do mundo.
Enquanto a expectativa para os Jogos de 2020 está lá no alto, a forma como ainda vemos esses Jogos não é a das melhores. Isso acontece porque nossa visão para pessoas com deficiência ainda é muito marcada pelo discurso da pena, da superação e do assistencialismo. Explico o porquê.
Ao mesmo tempo que vemos atletas brasileiros como vitoriosos, que treinam duro para chegar ao nível de excelência olímpico, tratamos a Paralimpíada como uma competição quase escolar, jogos festivos e um pouco “café com leite”. Deixamos de perceber que nossos atletas também são profissionais com altíssimo nível de exigência, treino duro e obstinação pela vitória. Você já viu o quão emocionante é uma partida de vôlei sentado? E a natação? O futebol de 5? Cada um destes profissionais que representam o Brasil tem uma história que vai muito além de sua realidade física.
Recentemente, ouvi em uma conversa sobre o assunto, o termo “diversidade física” para se referir também a PCDs. Essa expressão, que parece muito com a “diversidade corporal” que usamos para falar dos diferentes tipos de corpo que existem, se aplica ao universo PCD pela mesma lógica.
Ao mesmo tempo que pensamos um corpo que não é magro e atlético como um corpo indesejável, pensamos o corpo com deficiência como um corpo incompleto. Isso porque passamos grande parte da nossa vida aprendendo que corpos têm um jeito certo de ser — aquele dos livros de biologia, mesmo quando a grande maioria, nem de perto, se pareça com aquilo. Sim, estamos falando de uma generalização, de uma referência, mas os símbolos que usamos para definir o que é geral, acabam por gerar o que é normal (e o que não é).
Pessoas com deficiência não são pessoas anormais. Assim como qualquer outro grupo minorizado, seja de pessoas negras, gordas, trans, nossos corpos múltiplos também são existências válidas e reais, e por isso, também deveriam estar abarcadas no nosso conceito de normal.
Por isso, é importante não tornar exótica a paralimpíada. É importante perceber que discursos como “nossa, mas como que tal pessoa consegue fazer isso, mesmo sem enxergar” ou “que linda essa história de superação” são falas que minorizam, diminuem e jogam no lixo o trabalho profissional desses atletas. Eles não são “histórias de superação” para você se inspirar, no melhor estilo “se ele consegue, porque eu, que não tenho nenhuma deficiência, não consigo?”. Eles são atletas, como quaisquer outros, em busca do lugar mais alto do pódio.
*Beta Boechat é publicitária da @FALA.agency e criadora de conteúdo no @betafala. Trans não binária, é consultora das áreas de diversidade, gênero, LGBTQIA+ e body positivity.
**Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.
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