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Inteligência Artificial: qual é a posição do Brasil sobre regulamentação?

Ainda que a IA esteja sendo aplicada cada vez mais, há uma ausência de regulação jurídica no país, e PL se mostra pouco eficaz

PL não contou com a participação dos principais especialistas da área (Andriy Onufriyenko/Getty Images)

PL não contou com a participação dos principais especialistas da área (Andriy Onufriyenko/Getty Images)

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Publicado em 16 de setembro de 2021 às 10h56.

Por Julia Klarmann e Marcela Joelsons*

A tarefa de conceituar o que é inteligência artificial (IA) não é simples, mas é possível pontuar algumas características que giram em torno desses novos sistemas: a capacidade de raciocínio por meio da aplicação de regras lógicas a um conjunto de dados disponíveis, o reconhecimento de padrões visuais ou comportamentais e o aprendizado por meio de erros e acertos, que potencializa a eficácia de suas ações.

Esses agentes inteligentes podem existir apenas digitalmente, como no caso dos algoritmos, ou também no mundo físico, como é o caso dos veículos autônomos.

De fato, a IA possui as mais variadas aplicações, já estando presente em áreas como o direito (admissibilidade de recursos pelos tribunais), saúde (em consultas, diagnósticos, cirurgias), segurança (reconhecimento facial, identificação de ataques cibernéticos), ensino e pesquisa (professores e pesquisadores virtuais), gestão empresarial (controle de qualidade, eficiência de desempenho), criação de modelos preditivos (comportamento humano, previsão do tempo), assistência pessoal (aplicativos de auxílio ativados por comando de voz ), uso doméstico (robôs aspiradores), entre tantas outras.

As diferenças entre a materialidade, o comportamento emergente e o valor social presentes nos sistemas de IA representam possibilidades e experiências distintas e, assim — no que diz respeito a questões jurídicas —, podem levar à incidência de diferentes regimes de responsabilização diante de eventuais resultados danosos aos consumidores. Além disso, essa nova realidade suscita diversas dúvidas e preocupações acerca dos limites éticos e morais na aplicação da IA.

Fato é que, apesar da cada vez maior existência de aplicações de IA nas mais variadas áreas, hoje convivemos com a ausência de regulação jurídica sobre o assunto no Brasil, havendo discussões sobre a necessidade de regular agora, ou esperar para ver os efeitos da IA, para então promover uma avaliação e resposta jurídica e legislativa, em momento posterior.

Todavia, este cenário pode mudar em breve, tendo em vista a tramitação, em regime de urgência, do Projeto de Lei (PL) n. 21/2020, oriundo da Câmara dos Deputados, de autoria do deputado federal Eduardo Bismarck (PDT-CE). O PL, que estabelece princípios, direitos e deveres para o uso de Inteligência Artificial no Brasil, já foi analisado pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática durante cinco sessões, e agora tramita no plenário virtual da Câmara, podendo ser votado a qualquer momento.

Referida proposta legislativa estabelece que o uso de IA deve ter como fundamentos o desenvolvimento tecnológico e inovação, a livre iniciativa e livre concorrência, o respeito aos direitos humanos e aos valores democráticos, a igualdade, a não discriminação, a pluralidade e o respeito aos direitos trabalhistas, e a privacidade e a proteção de dados. Além disso, o PL propõe que, entre os objetivos do uso de determinada aplicação, deve existir a “promoção da pesquisa e do desenvolvimento da inteligência artificial ética e livre de preconceitos”.

Contudo, diferentemente de outras leis que versam sobre avanços tecnológicos — como a Lei Geral de Proteção de Dados e o Marco Civil da Internet — este projeto não contou, em sua etapa de elaboração, com a participação dos principais especialistas da área no país em seus debates, e tampouco teve diálogo com a comunidade.

Críticos apontam que o PL seria pouco consistente, e que alguns artigos poderiam dar origem a obstáculos ao desenvolvimento tecnológico. Outros elogiam a abordagem de princípios gerais, que depois poderão ser complementados por leis específicas, diminuindo os riscos de desatualização diante da rapidez do desenvolvimento tecnológico na área e diminuindo a obsolescência do tratamento jurídico dado à matéria no Brasil.

Em que pese toda a discussão, é possível afirmar que, enquanto não houver uma regulação para a inteligência artificial, os limites do que é ético, adequado, seguro e confiável seguirão obscuros, trazendo incertezas tanto para as corporações, como para os cidadãos. Ademais, a busca por uma solução assertiva, que possa proteger o homem e possibilitar o desenvolvimento dos sistemas de IA, não deve ser uma tarefa apenas de profissionais do Direito, mas também dos programadores e profissionais com conhecimento técnico, para que sejam criadas ferramentas aptas a reduzir os danos e assegurar o amparo dos direitos fundamentais no uso e desenvolvimento a IA.

*Julia Klarmann e Marcela Joelsons são sócias da área de Consumidor e Product Liability do Souto Correa Advogados

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