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Inteligência artificial e segurança cibernética na nova fase das relações EUA-China e Brasil 

Rivalidade EUA-China molda o uso de inteligência artificial e cria novas possibilidades para o Brasil em tecnologia e inovação.

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Publicado em 25 de novembro de 2024 às 07h00.

Por Fabricio Bertini Pasquot Polido 

Para além do tarifaço anunciado como lema de campanha eleitoral, a reeleição de Donald Trump para o mandato presidencial de 2025 a 2029 promete agitar as dinâmicas internacionais no campo das tecnologias emergentes, especialmente diante do embate já existente entre Estados Unidos e China em torno da Inteligência Artificial (IA).

A rivalidade sino-americana mais acirrada afeta não apenas o comércio global e as bases da segurança nacional, mas também o desenvolvimento tecnológico e as economias domésticas, especialmente se observado o preço elevado de produtos de alto valor agregado vs. pressões inflacionárias, após medidas comerciais unilaterais a serem adotadas pelos EUA em novo termo presidencial sob Trump.

O Brasil, por sua vez, poderá encontrar oportunidades significativas, desde que saiba equilibrar suas relações diplomáticas, manter diálogos multiportas e investir em estratégias mais assertivas nas áreas de inovação, buscando mitigar sua dependência em exportações de bens agrícolas e outras commodities do passado. Não existe para o Brasil, portanto, qualquer solução que possa se sustentar a partir de propostas ideologizantes e simplistas vindas do submundo de redes sociais e profissionais, ou mesmo de alas mais reativas à irreversível bipolarização Estados Unidos-China.

Se as últimas semanas testemunharam reações estarrecidas ou surpresas a respeito da nova Era Trump e o que virá para o mundo, o presente e passado já davam sinais de aprofundamento das complexas relações no eixo Américas-Ásia, as guerras em curso e a dificuldade de as economias e sociedades se recuperarem dos choques pós-pandêmicos e do mal-estar civilizacional da desinformação, do cinismo e do negacionismo.

A inteligência artificial como prioridade estratégica nos EUA

Desde sua primeira presidência, Trump posicionou a IA como elemento central para a segurança nacional, a superioridade militar e a competitividade industrial dos EUA. A Ordem Executiva de 2019 e o Projeto de Lei sobre Iniciativa em IA de 2020 propuseram algumas bases, em termos de política de Estado, para a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias baseadas em IA, com ênfase em sua aplicação comercial e estratégica.

No segundo mandato, espera-se que essa abordagem seja intensificada, acompanhada de medidas para consolidar os EUA como líderes globais em IA, enquanto enfrentam as investidas da China.

Não é novidade que os Estados Unidos considerem a IA uma ferramenta econômica e estratégica, mas também uma arma poderosa na disputa geopolítica e de influência sobre países periféricos em relações tecnológicas, como boa parte da América Latina, África e Ásia e outras regiões que já há tempos se distanciam da corrida EUA-China.

Perspectivas do novo governo americano para um futuro de IA e poder ultra tecnológico já detido e concentrado pela China moldarão os padrões regulatórios, práticas de mercado e esforços de autorregulação por parte das grandes empresas de tecnologia, influenciando diretamente os mercados em escala global.

Cibersegurança e o impacto na geopolítica global

Outra área de destaque continuará sendo a cibersegurança, tratada como prioridade de defesa nacional tanto para China como Estados Unidos. Em seu primeiro mandato, o governo Trump investiu em programas para capacitação profissional e expansão das potencialidades do Comando Cibernético dos EUA, além de pedir cooperação às empresas de tecnologia para monitoramento de dados, o que também levantou inúmeras suspeitas pela falta de transparência e potenciais riscos para violação de direitos fundamentais de cidadãos nos EUA e ao redor do globo.

Simultaneamente, Trump manteve uma postura ambígua em relação às gigantes da tecnologia, oscilando entre críticas públicas e a dependência para avanços estratégicos.

Finanças digitais e o papel das criptomoedas

No campo monetário internacional, o apoio às criptomoedas reflete uma visão de autonomia digital e liberdade econômica. No entanto, questões regulatórias, como a segurança e o combate a crimes transnacionais, desafiam essa abordagem.

A pressão para equilibrar inovação e estabilidade monetária será uma constante no segundo mandato, particularmente porque os Estados Unidos têm se mostrado reticente em negociar temas relacionados à economia digital nos grandes foros internacionais, a propósito das iniciativas em torno de pagamentos instantâneos, digitalização de operações de câmbio e as moedas digitais dos bancos centrais (CBDCs).

Não é de hoje que os EUA hesitam em admitir fortalecimento e disponibilidade de uso de moedas estrangeiras em detrimento do dólar, ainda que ele mesmo não seja mais oficialmente padrão para trocas internacionais. A China, por sua vez, admite uma posição mais equilibrada, entre modernização das estruturas monetárias, pagamentos digitais, internacionalização do Yuan, de um lado, e controle governamental, de outro, que permanece como racionalidade herdada do sistema de Bretton Woods, de suas instituições do Pós-Guerra, a saber, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional.

Oportunidades para o Brasil no cenário tecnológico

Em todas essas áreas reunidas – IA, segurança cibernética, finanças e moedas digitais – dentro do contexto de rivalidade EUA-China, o Brasil possui algum potencial de benefícios.

Entre os pontos, destaco:

  • O posicionamento do país enquanto um hub sustentável de processamento de dados na América Latina, ao atrair investimentos para a instalação de data centers e promover sua infraestrutura energética limpa e renovável;
  • A incontestável posição de liderança global em matéria bancária digital e de inovação em finanças digitais, a propósito das soluções já aplicadas pelo Banco Central, como o PIX, e futuras, como Drex – moeda digital brasileira;
  • A atração de incentivos a startups e empresas locais, que podem fomentar a criação de tecnologias específicas para o mercado brasileiro em torno de soluções de IA e segurança cibernética, fortalecendo o ecossistema de IA e promovendo competitividade global;
  • O estabelecimento de parcerias entre governos, universidades e empresas para ampliar o potencial do país em tecnologias emergentes;
  • A prudência esperada de manter relações equilibradas com EUA e China, de maneira estratégica, em caráter de diplomacia científica e tecnológica, ao mesmo tempo, em que o Brasil possa se destacar com a liderança em fóruns globais, como o G20, Brics, Nações Unidas e mesmo na tão atacada Organização Mundial do Comércio.

Por Fabricio Bertini Pasquot Polido - Sócio de Inovação e Tecnologia e Solução de Disputas de L.O. Baptista e professor associado de Direito Internacional, Direito Comparado e Novas Tecnologias da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.

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