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Governança no agro para unir excelência à tradição

Governança já faz parte do dia a dia de diversas empresas agrícolas e propriedades rurais

O agronegócio a cada dia se mostra menos resistente a profissionalizar gestão (Divulgação/Divulgação)

O agronegócio a cada dia se mostra menos resistente a profissionalizar gestão (Divulgação/Divulgação)

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Publicado em 11 de maio de 2023 às 16h54.

Última atualização em 11 de maio de 2023 às 17h50.

Por Pedro Batistoti Boller*

Termo relativamente novo no vocabulário corporativo brasileiro, a governança empresarial tem estado, gradativamente, mais presente na rotina de executivos, gestores e acionistas de grandes e pequenos grupos. Mesmo as startups, voltadas para a inovação e adoção de processos mais flexíveis, têm utilizado as ferramentas de governança corporativa a fim de definir processos, estabelecendo mecanismos que garantam a segurança do negócio.

No agronegócio, apesar de ainda estar dando os primeiros passos, a governança já se faz presente no dia a dia de muitas empresas agrícolas e propriedades rurais, sobretudo em razão de exigências externas para a captação de crédito, comercialização, e atendimento de exigências e imposições legais e regulatórias.

Neste cenário, é importante ater-se para algumas peculiaridades deste setor, uma vez que a tradição tem papel muito importante na agricultura e pecuária brasileiras, sobretudo em razão de muitas propriedades ainda serem geridas pela própria família o que dificulta a profissionalização do negócio.

Todavia, em que pese a estrutura ainda grandemente familiar na administração das empresas e fazendas, o agronegócio a cada dia se mostra menos resistente a profissionalizar sua gestão, e o faz especialmente com foco em manter a alta produtividades e competitividade do setor perante o mercado externo.

À primeira vista pode soar estranho enxergar uma fazenda como uma empresa, sobretudo quando se está acostumado a vê-la passando pelo mesmo processo de gestão trazido pelas gerações pioneiras, mas para aqueles que desejam tornar o negócio viável no longo prazo, sobrevivendo inclusive ao processo sucessório, é inequívoco que se deve passar por um processo de estruturação e de governança.

Neste sentido, deve-se esclarecer que o vocábulo governança refere-se ao ofício de governar, através da aplicação de técnicas, observância de práticas e adoção de procedimentos estruturados que estabeleçam diretrizes para a relação entre sócios, conselho de administração, acionistas, órgãos de fiscalização, fornecedores, entre outros, revestindo a empresa de um atributo de confiabilidade que permite ao mercado e àqueles com quem esta venha a fazer negócio precificar o risco de seu investimento.

Assim, quando se fala do agro, é essencial ter em mente que a governança tem um papel ainda mais importante do que aquele visto no mundo corporativo em geral, pois, em sua grande maioria, o consultor responsável pela estruturação das práticas e procedimentos terá de construir e solidificar um processo a partir de uma empresa familiar, muitas vezes conjugando interesses diversos combinados com disputas emocionais dentro de um contexto com pouco ou nenhum processo estabelecido de gestão.

Para clarificar estas questões, mensurando desafios e resultados já obtidos por empresas do agronegócio que aplicaram governança a suas empresas e propriedades, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e a KPMG realizaram a "Pesquisa Governança no Agro"[1].

O estudo foi realizado com 367 respondentes de todas as regiões brasileiras e traça um perfil do agronegócio nacional, revelando importantes particularidades quanto ao tamanho das propriedades, escolaridade dos administradores e questões referentes à governança, compliance e sucessão da sociedade empresária, entre outras necessidades do setor.

Alguns dados relevantes mostrados pela pesquisa evidenciam a falta de informação sobre o tema direcionados especialmente para o agronegócio, apesar de ampla parcela amostral dos produtores conhecerem e reconhecerem a importância da governança aplicada ao agronegócio, sobretudo para as grandes empresas do setor.

Ao se analisar números, verifica-se que a maior parte dos entrevistados trata-se de proprietários rurais (49%), os quais possuem alta escolaridade, 65% com pós graduação e 29% com graduação, e destes os que mais possuem familiaridade com o tema da Governança Corporativa são aqueles que exercem cargos de assessoramento ou conselheiro administrativo (100%), com destaque para as altíssimas taxas de conhecimento sobre o tema em todas as faixas de faturamento das propriedades rurais, sendo diretamente proporcional o faturamento ao crescimento das taxas de conhecimento sobre governança.

Quanto à opinião sobre os principais aspectos do negócio, o plano de sucessão e a garantia de sobrevivência da empresa foram apontados como a principal necessidade para existência da governança corporativa no agronegócio, para 54% dos entrevistados, enquanto 50% acreditam que a formalização de papéis dentro da empresa seja o mais importante. Como exemplo de uma problemática dentro deste contexto, pode-se citar o caso em que uma empresa disponibilize a seus sócios e gestores, todos integrantes do mesmo núcleo familiar, o uso de um avião de propriedade da pessoa jurídica. Como pode-se assegurar que o veículo será usado de forma responsável e equânime pelos interessados?

Por esta razão, a fixação de normas, procedimentos e parâmetros, dentro de um processo de governança corporativa, garante que os bens e ativos da empresa sejam usados de forma racional pelos seus interessados. Remove-se o componente emocional, substituindo-o pelo racional, com regras claras quanto à realização de despesas, divisão de lucros e responsabilidades de todos os envolvidos.

Este processo de estruturação corporativa se mostra ainda mais necessário quando, de acordo com os números obtidos na amostragem pesquisada, verifica-se que quase metade dos estabelecimentos agrários é gerida por pessoas jurídicas, os quais somados aos empreendimentos geridos de forma compartilhada (entre pessoa física e jurídica) este percentual atinge quase ¾ de todos os estabelecimentos do país, uma parcela relevante de um setor extremamente competitivo e responsável por substancial parcela do produto interno bruto do país, que não pode e não deve ser negligenciado.

Portanto, aliar tradição à excelência na gestão do agro empreendimento é um grande desafio, à altura da importância do papel desempenhado pelo setor na economia do país, exigindo, para tanto, conjunção de esforços de profissionais para estruturação de processos de governança agrocorporativa, bem como a difusão de valores referentes aos processos de gestão e governança já aplicados em diversos setores e empresas de todo o mundo, com especial atenção ao desenvolvimento de soluções e técnicas aplicáveis à realidade da empresa rural.

*Pedro Batistoti Boller é advogado do escritório Ernesto Borges Advogados e especialista em direito do agronegócio pela PUC-MG 

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