A lição do ozônio deve reforçar a confiança de que é possível agir de forma conjunta e efetiva (ESA/Reprodução)
Diretor-geral da Beon - Colunista Bússola
Publicado em 19 de setembro de 2025 às 10h00.
Para quem viveu os anos 1980 e 1990, a expressão “buraco na camada de ozônio” remete a uma grande preocupação que para o olhar desatento parece ter ficado no passado. Atualmente falamos muito menos sobre o tema, mas ele originou um dos raros capítulos de boas notícias na trajetória ambiental recente da humanidade.
Segundo o boletim divulgado pela Organização Meteorológica Mundial (WMO), a ação coordenada que resultou no banimento global dos clorofluorcarbonetos (CFCs) e de outras substâncias destrutivas para o ozônio atmosférico já mostra efeitos concretos: a camada está em processo de recuperação, com expectativa de retornar aos níveis anteriores a 1980 em poucas décadas. Trata-se de um exemplo emblemático de como a ciência, quando ouvida, pode orientar políticas públicas efetivas e gerar resultados palpáveis para a preservação da vida.
O Protocolo de Montreal, firmado em 1987, foi talvez o maior exercício de cooperação ambiental internacional até então. Os países conseguiram superar divergências econômicas e políticas para enfrentar um problema que ameaçava a saúde humana e os ecossistemas. A redução expressiva das emissões de CFCs e outros compostos halogenados demonstra que é possível mobilizar recursos, alinhar interesses e adotar medidas concretas quando existe clareza sobre os riscos e comprometimento com o futuro coletivo. A ciência ofereceu o diagnóstico e a orientação; a política traduziu esse conhecimento em acordos; e a sociedade civil pressionou pela ação — uma combinação que fez a diferença.
A comparação com o desafio da emergência climática é inevitável. Se a destruição da camada de ozônio se mostrou um problema grave, a crise climática é ainda mais complexa. Aqui não se trata apenas de um único grupo de substâncias químicas, mas de uma teia de fatores interconectados: emissões de gases de efeito estufa de diferentes setores, mudanças no uso da terra, desmatamento, padrões de consumo, desigualdades sociais e dependência de combustíveis fósseis. Além disso, os impactos se manifestam de maneira múltipla e assimétrica: ondas de calor, enchentes, secas, migrações forçadas e perda de biodiversidade.
Pelo contrário: a lição do ozônio deve reforçar a confiança de que é possível agir de forma conjunta e efetiva. O caminho passa pelo engajamento social, que pressiona governos e empresas; pela coordenação global, que estabelece metas comuns e mecanismos de cooperação; e pela ação diligente, capaz de transformar compromissos em realidade concreta. Se o Protocolo de Montreal foi capaz de reverter uma ameaça existencial, também é possível estruturar um movimento semelhante para enfrentar a crise climática — ainda que em escala mais ampla e com desafios mais intrincados.
O exemplo da camada de ozônio nos lembra de que a humanidade, apesar de suas tensões e desigualdades, é capaz de se unir em torno da preservação da vida. A emergência climática exige um esforço ainda maior, mas a esperança que vem da experiência passada pode e deve ser combustível para a ação no presente. Afinal, o que está em jogo não é menos do que a viabilidade de nosso futuro comum.