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EUA x Brasil: o que muda com o governo Biden?

Economista José Márcio Camargo analisa o impacto das eleições americanas nas relações entre os dois países

Joe Biden (Twitter/Reprodução)

Joe Biden (Twitter/Reprodução)

Mariana Martucci

Mariana Martucci

Publicado em 2 de dezembro de 2020 às 18h29.

Última atualização em 23 de janeiro de 2021 às 21h15.

Após um longo período de contestações quanto aos resultados, as eleições americanas parecem estar chegando ao fim. Como em 2016, os resultados foram bastante diferentes do que as pesquisas de opinião previam. O ex-vice-presidente Joe Biden foi eleito com uma diferença de votos menor do que a esperada e a expectativa de que ocorreria uma onda azul, com vitória arrasadora do Partido Democrata, não se concretizou.

Até o momento, o Partido Republicano elegeu 50 senadores, faltando duas cadeiras a ser decididas em segundo turno, sendo que em pelo menos uma delas o candidato republicano é franco favorito, o que manteria o Senado sob controle dos republicanos. A maioria do Partido Democrata na Câmara dos Deputados foi reduzida e o Partido Republicano conseguiu vitórias inesperadas em eleições regionais.

Ao contrário das expectativas, o resultado mostrou um país dividido ao meio, o que vai forçar o Partido Democrata a fazer acordos com os republicanos para aprovar uma parte importante de seu programa de governo. Temas como a universalização da assistência à saúde pública e aumento de impostos sobre corporações, por exemplo, dificilmente serão aprovados, caso o Senado permaneça com maioria republicana.

Do ponto de vista do Brasil, este resultado tem dois efeitos importantes. De um lado, como serão nossas relações com o novo governo americano? De outro, como irão evoluir as relações entre os Estados Unidos e a China, nossos dois mais importantes parceiros comerciais, e como o Brasil deverá se posicionar nesta disputa?

No que se refere ao primeiro ponto, é pouco provável que ocorra uma grande mudança. Brasil e Estados Unidos têm relações diplomáticas sólidas, construídas por décadas. Estão calcadas não em idiossincrasias pessoais de seus presidentes, mas em um conjunto de relações e acordos entre os governos. A questão ambiental ganhará protagonismo neste processo, mas parece pouco provável que isto gere uma situação de impasse entre os dois países.

Por outro lado, o Brasil é um país muito importante na política externa americana e, como disse certa vez o presidente Nixon, “para onde for o Brasil irá a América Latina”. Da mesma forma que as relações pessoais mais próximas entre os presidentes Trump e Bolsonaro pouco afetaram positivamente a relação entre os países, as possíveis divergências pessoais entre Binden e Bolsonaro serão suplantadas pelos interesses nacionais.

A questão das relações com a China é mais complicada. Após um longo período de aproximação que começou no governo Nixon e se intensificou com a entrada da China na OMC, a partir de 2018 os dois países entraram em uma disputa que promete se estender pelos próximos anos. O ponto é que não é uma disputa puramente comercial, como parecia ser no início do processo, mas sim uma disputa pela hegemonia econômica, social e política no mundo. E, historicamente, disputas por hegemonia são longas e, na maior parte das vezes, dificilmente são resolvidas pacificamente.

A questão da escolha para a implantação da tecnologia 5G no Brasil está no cerne deste processo. Diante da forte pressão dos Estados Unidos, vários países, entre os quais Reino Unido, França, Austrália, Japão e Alemanha, introduziram sérios obstáculos para a utilização de equipamentos chineses desta tecnologia em seus respectivos países.

É muito importante para a China que sua tecnologia possa ser utilizada no Brasil. Vários fatores estão em jogo. Questões relacionadas à segurança nacional, custo da tecnologia e acesso a tecnologias alternativas, além da própria relação comercial entre Brasil e China, precisarão ser consideradas. O Brasil tem algumas “cartas na manga” que deverão ser utilizadas ao longo do processo. Afinal, é o maior fornecedor de alimentos para a China e nosso principal competidor neste mercado é, exatamente, os Estados Unidos. É neste contexto que a posição do novo governo americano será fundamental.

*José Márcio Camargo é professor do departamento de economia da PUC/Rio e economista-chefe da Genial Investimentos. Ph.D. em economia pelo MIT, é autor de vários livros e artigos acadêmicos. Foi consultor da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial (Bird).

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