A indústria da construção é responsável por 36% do consumo global de energia (Eduardo Frazão/Exame)
Head da Beon - Colunista Bússola
Publicado em 30 de maio de 2023 às 18h28.
Última atualização em 13 de outubro de 2023 às 20h41.
A revista Nature veiculou ontem, eu seu jornal voltado para urbanismo, o npj Urban Sustainability, um artigo da pesquisadora Jacqueline Crame, da Universidade de Utrecht na Holanda, sobre estratégias para redução dos impactos ambientais no setor de construção, um dos mais pressionados pela agenda de sustentabilidade dado o tamanho de sua pegada ambiental.
Destaco a seguir alguns pontos que podem servir de aprendizado e inspiração para empresas do setor refletirem sobre estratégias de sustentabilidade e sua implementação. Antes, vale destacar a relevância de se tratar o tema: atualmente, a indústria da construção é responsável por 36% do consumo global de energia, produz 40% dos resíduos e responde por aproximadamente 40% das emissões de dióxido de carbono em todo o mundo. Os dados são da Aliança Global para Edifícios e Construção, órgão sediado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
Em seu artigo, a professora Crame argumenta que o setor da construção civil pode enfrentar problemas ambientais urgentes ao alavancar duas grandes tendências: economia circular e tecnologias digitais. Juntas, as práticas podem reduzir o uso de material virgem e a pegada ambiental das edificações com tecnologias que permitem visualização do impacto ambiental ao longo de toda a cadeia de valor, facilitando o design, a produção e o uso inteligentes para aumentar a eficiência ecológica e de materiais.
Para fazer isso acontecer na prática, não basta apenas investir em tecnologia. Como em outros casos de mudanças culturais e de modelos de gestão, é preciso estabelecer mudanças institucionais, comportamentais e do sistema socioeconômico, essenciais para efetuar uma transição para uma economia circular e digital.
Nas palavras da autora, “para facilitar essa transição, é necessária uma nova forma de governança, na qual a governança em rede complementa a governança pública convencional. A governança da rede promove a formação de coalizões de parceiros dispostos que se esforçam em conjunto para o objetivo da mudança do sistema, criando um terreno fértil para um novo paradigma econômico, mudança comportamental, regulamentação governamental e inovação”. Como repetimos neste espaço, é impossível ser sustentável sozinho.
O artigo apresenta alguns exemplos de como os benefícios podem ser verificados na prática, reunindo redução do impacto ambiental com economia de recursos financeiros. Começando pela digitalização, o setor começou recentemente a adotar tecnologias emergentes como inteligência artificial, big data, computação em nuvem, blockchain e realidade virtual. “A integração dessas tecnologias nos processos de trabalho diários agregaria valor significativo ao setor. Por exemplo, ferramentas de gerenciamento de dados – como Building Information Modeling (BIM), análise de ciclo de vida e análise de fluxo de materiais – podem aumentar a transparência sobre o desempenho ambiental de toda a cadeia de construção e fornecer informações sobre como a cadeia pode se tornar mais ecologicamente correta”.
Adicionalmente, a aplicação de princípios de circularidade no setor de construção civil pode reduzir o consumo de matérias-primas e reduzir drasticamente as emissões de CO2. “Podemos prolongar a vida útil dos edifícios, redesenhá-los com a circularidade em mente, reutilizar partes deles e reciclar seus materiais”, defende Crame. Um bom exemplo, segundo o artigo, é o novo prédio da nova prefeitura de Venlo (fundado em 2016 na Holanda): todas as matérias-primas utilizadas na construção podem ser totalmente reaproveitadas sem perda de valor. Além disso, o prédio é totalmente neutro em termos energéticos, graças a recursos como painéis solares, armazenamento de energia térmica e caldeiras solares.
É evidente que os exemplos e metodologias citados acima são referências iniciais de caminhos a seguir. Aplicações práticas precisarão ser embasadas em estudos mais aprofundados e específicos. De qualquer forma, a premissa é válida: não agir em direção a um modelo de negócios circular, digital e sustentável é mais caro e entrega resultados piores. Para as empresas e para o planeta.
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