Em 2021, houve 6.003 casos de racismo registrados no Brasil (Sean_Warren/Getty Images)
Bússola
Publicado em 18 de julho de 2022 às 14h05.
Por Bússola
Casos recentes de racismo nas empresas mostram que ainda há um longo caminho pela frente quando o assunto é ESG (Environmental, Social and Corporate Governance) no Brasil, onde a discussão sobre meio ambiente e governança corporativa ainda ofusca a da responsabilidade social. A opinião é da advogada especialista em compliance Ana Paula Ávila, doutora em Direito pela UFRGS e especializada em Gerenciamento de Crises pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology).
“Uma parte considerável das empresas só entende termos como risco, faturamento, lucro e prejuízo; então, para quem faz pouco caso do impacto social do racismo, pode ser interessante apresentar a conta do racismo para os boards executivos, onde as decisões estratégicas são tomadas”, diz Ana Paula, que também é sócia coordenadora da área de Compliance do escritório Silveiro Advogados.
Segundo ela, o desenvolvimento de estratégias para a promoção dos protocolos ESG nas empresas exige que os programas de compliance priorizem o monitoramento dos riscos que comprometem a questão social, sem prejuízo da urgência da pauta ambiental e da necessidade de avançar em termos de governança.
Em 2021, o Brasil registrou 6.003 casos de racismo, aumento de 31% sobre os 4.565 casos em relação ao ano anterior, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A pesquisa também revelou a disparidade entre negros e brancos vítimas da letalidade policial: 84,1% das vítimas eram negras.
Racismo institucional
No ambiente empresarial, o racismo se repete, apesar de dados ainda serem escassos no país. Uma pesquisa realizada no ano passado pela plataforma de empregos Indeed, em parceria com o Instituto Guetto, apontou que seis em cada dez profissionais brasileiros sentem discriminação racial no ambiente de trabalho e 47% deles dizem ter presenciado isso.
Recentemente, uma empresa foi condenada pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4.ª Região) a indenizar em R$ 20 mil um funcionário negro que foi submetido a humilhações de conotação racista infligidas por um fornecedor da empresa (um terceiro, portanto). O tribunal considerou que a empresa estava ciente dessas humilhações e teve de responder por sua omissão.
“Existem manifestações diárias e sucessivas de preconceito racial no âmbito das empresas. E são casos com grande impacto social e com repercussão, inclusive, na esfera criminal, tendo todas as credenciais para serem considerados eventos tão danosos à imagem e às finanças da empresa quanto os casos de corrupção”, afirma Ana Paula.
Avanços e soluções
Mas nem todas as empresas ignoram o problema. Em junho do ano passado, 45 companhias de diferentes setores lançaram uma iniciativa para combater o racismo no país, o “Mover - Movimento pela Equidade Racial”. Nomes de peso como Ambev, Coca-Cola, Carrefour e Nestlé integram a iniciativa.
Para Ana Paula, algumas medidas podem auxiliar os empreendimentos nacionais na busca pelo estabelecimento de protocolos ESG que incluam o combate ao racismo. Entre eles, a inclusão e desenvolvimento de lideranças que pertencem a grupos minoritários; a definição de metas de diversidade, após pesquisa para a realização de censo corporativo.
Na opinião da advogada, os grandes players do mercado, que são grandes consumidores de insumos e serviços, podem definir métricas de capital humano aos seus fornecedores, cobrando responsabilidade social e diversidade; as empresas também podem criar programas de responsabilidade social ou aderir a programas existentes em outras instituições governamentais ou não-governamentais, e procurar implementar a cultura de diversidade de forma sistêmica, realizando campanhas de comunicação interna sobre as vantagens da promoção da diversidade para a empresa e para a sociedade.
“A conta da discriminação racial começa a ficar mais visível nas empresas, demonstrando que esse risco deve ser atacado com a mesma determinação dedicada a outros eventos que podem causar danos à reputação e prejuízos financeiros à organização. É importante, também, que o pensamento corporativo evolua para que essas medidas sejam amparadas com base na igualdade e na justiça social, pois elas simplesmente miram no que é o certo”, afirma.
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