Time da Infineat, com o CEO Alexandre Vasserman e o fundador Alberto Hakim (Infineat/Divulgação)
Bússola
Publicado em 29 de setembro de 2022 às 13h46.
Impacto virou a bola da vez depois que o mundo dos negócios tomou um esguicho de ESG, contudo é uma palavra modesta demais para descrever o que a Infineat tem feito desde o ano passado com uma equipe de apenas seis pessoas. Agora, que outra palavra usar? Revolução lembra política. Milagre soa religioso. Mas é um pouco disso tudo.
Imagine uma iniciativa que enfrenta o mais sinistro dos nossos problemas sociais, que voltou com força ao país, a FOME, e por tabela ajuda a mitigar um grave problema ambiental, a emissão de metano, gás muito mais nocivo que o dióxido de carbono para o famigerado efeito estufa.
É exatamente isso que faz a Infineat, um ONG com estrutura de negócio cujo CEO, o administrador de empresas paulistano Alexandre Vasserman, de 27 anos, define como uma filantech, mistura de filantropia com tecnologia.
E como ela faz isso? Conectando empresas que estariam prestes a descartar volumes consideráveis de alimentos com instituições que os recebem e os distribuem a milhares de famílias em situação vulnerável.
Do lado dos doadores, a Infineat tem nove grandes clientes, entre indústrias de alimentos, como Unilever, redes de varejo, como St. Marche, e food services, como Beleaf. E na outra ponta, estão 60 instituições, como Sefras e Cufa, que recebem e distribuem os alimentos para as famílias cozinharem em casa ou já preparados e alocados em marmitas, o que se torna possível graças a parcerias com outras ONGs, como a Gastromotiva.
Aí vão alguns números do impacto revolucionário e milagroso da Infineat: desde janeiro do ano passado, ela já salvou 840 toneladas de alimentos e complementou 1,5 milhão de refeições. Se toda essa comida fosse comprada no mercado, seriam necessários quase R$ 8 milhões – o número é calculado pela Infineat em parceria com a InfoPrice. Os doadores, por sua vez, economizaram R$ 600 mil que seriam gastos com o descarte – valor mapeado com 15 gestores de resíduos.
E mais: ao salvar esses alimentos, a Infineat evitou a emissão de mil toneladas de carbono, segundo cálculo da ReFED, instituição americana que combate o desperdício de comida e mede o passivo ambiental causado por ele.
Alimentos com data de validade podem ser doados até no máximo, claro, a data inscrita na embalagem. Os que não possuem, como frutas, verduras e legumes, são avaliados pela Infineat antes de seguirem para doação. “São alimentos perfeitos para consumo que entregamos”, orgulha-se Alexandre. Além de conectar as pontas, a Infineat presta consultoria aos doadores para dizer como manusear, separar e armazenar a comida até a retirada, que é feita pelas próprias instituições.
A filantech possui uma tecnologia proprietária, um aplicativo que acompanha todas as operações e gera uma enorme profusão de dados, além de encontrar o rumo mais rápido para produtos que podem não estar aptos para venda, mas estão para o consumo, porém não por muito tempo.
Todo alimento, uma banana que seja, é fotografado e pesado para então ser inserido no aplicativo com procedência e destino. A tela do celular de Alexandre estampa o tempo todo gráficos de todos os tipos e formatos, e por ali ele controla tudo.
A atuação da Infineat até agora está restrita à Grande São Paulo, mas isso deve mudar a qualquer momento, porque a tecnologia é escalável e Alexandre está a um passo de fechar uma parceria para iniciar operações regulares no Nordeste – já foram feitas ações isoladas no Rio de Janeiro, na Bahia e em Pernambuco.
Para manter a operação da ONG e o time de seis pessoas, a Infineat conta com doadores institucionais, entre os quais há desde pessoas físicas a bancos. “Para cada R$ 1 doado, eu entrego R$ 15 em valor de produtos”, diz Alexandre. Ou seja, trata-se de um prato cheio (com o perdão do trocadilho) para o filantropo que quer ver seu investimento causar muito impacto.
Formado em administração de empresas na FGV com ênfase sustentabilidade, Alexandre sempre quis trabalhar com questões socioambientais. Na pandemia, ele e o irmão, médico, lançaram a campanha “Vem Pra Guerra”, por meio da qual arrecadaram em menos de um mês R$ 6,2 milhões para o Hospital das Clínicas.
“Depois disso, eu estava procurando um meio de dedicar minha carreira a resolver grandes problemas estruturais, quando conheci a Infineat”, diz. A ONG fora criada dois anos antes pelos filantropos e empresários Alberto Hakim e Moishy Libersohn, hoje conselheiros da organização. Antes da chegada de Alexandre e seu time, ela fazia ações pontuais contra o desperdício de comida.
Após todo o processo de profissionalização, o que a Infineat mais precisa hoje é justamente de doadores de alimentos. Alexandre está atrás não apenas dos grandes varejistas e indústrias, mas também dos mercadinhos. “E possível tirar o Brasil do mapa da fome, e isso é estruturante”, afirma ele.
E é muito bacana ouvir o entusiasmo na voz dele e ver o sorriso no seu rosto enquanto diz essas coisas. Algo comparável a isso é ver o brilho no olho de quem leva para casa uma caixa cheia de comida. Um olhar que transmite alívio e esperança, como o de dona Luiza da Silva, de 72 anos, uma faxineira aposentada que tem seis pessoas para alimentar, entre elas uma filha com problemas de saúde, e muitas vezes acordou sem nem sequer ter o café da manhã para colocar na mesa.
Conheci dona Luiza dois domingos atrás, quando eu e minha colega de pós-graduação em sustentabilidade Isadora Alves acompanhamos uma rota da Infineat, em Mauá, no ABC paulista. Visitamos a Asriel, entidade mantida há 13 anos pelo líder comunitário Gilberto Vitor, que atua com esportes e segurança alimentar em três comunidades da cidade.
Desde maio do ano passado, a Asriel, por meio da Infineat, recebe toda semana duas toneladas de comida, sobretudo hortifrúti, vindas de 14 lojas da Coop, uma rede varejista presente na Grande São Paulo e no interior do Estado. E com isso alimenta 800 famílias. Graças à Infineat, Gilberto e muitos outros líderes comunitários podem usar recursos antes destinados à compra de comida para outras atividades, como educação e esportes.
Gilberto e Alexandre estavam me contando isso quando dona Luiza, que já havia se despedido para voltar para casa, retornou e abraçou os dois na minha frente e olhou para mim e me disse com toda a sinceridade que tinha no coração:
“Esses dois aqui eu gosto como se fossem meus filhos”.
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