Bússola

Um conteúdo Bússola

Empreender na medicina precisa ser um dilema?

Por vezes, a medicina é encarada como “sacerdócio", o que dificulta o médico a se sentir confortável empreendendo

Para profissionais de medicina, empreender é um desafio mais do que possível  (Getty Images/Getty Images)

Para profissionais de medicina, empreender é um desafio mais do que possível (Getty Images/Getty Images)

Bússola
Bússola

Plataforma de conteúdo

Publicado em 10 de julho de 2023 às 17h00.

Por Helen Pessoni*

Empreender nunca é fácil. Seja para um recém-formado ou para um profissional experiente, tomar as rédeas da carreira e levar adiante o sonho do negócio próprio exige muita coragem. Isso acontece em qualquer ramo, mas em algumas atividades, como a medicina, por vezes, é ainda mais difícil.

Além da notória ausência de disciplinas sobre empreendedorismo nas universidades, alguns médicos e outros profissionais – professores, por exemplo – lidam com uma  crença que liga a profissão a uma espécie de “sacerdócio". E como tudo que é divino, se ligar à materialidade – especialmente ao dinheiro – pode se transformar em algo pecaminoso e empreender torna-se quase que um ato proibido.

Sofri com isso durante algum tempo. Sentia uma grande dificuldade para precificar meu trabalho e achava "imoral" querer tornar meu negócio – uma clínica – um sucesso comercial. Crescer e ganhar dinheiro era "feio".

Olhando pra trás vejo o quanto deste sofrimento e prejuízo poderia ter evitado se eu tivesse uma formação sobre gestão de negócios. Eu teria entendido muito mais cedo que não preciso sacrificar a médica para ser empresária. Ao contrário, quanto mais eficiente eu for como gestora, mais eu terei tempo para me dedicar à face assistencial.

Panorama

Há nove anos o Ministério da Educação (MEC) desenvolveu novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para atualização do aprendizado nas universidades e faculdades, que abrangem a reafirmação dos princípios éticos, responsabilidade social, humanização dos atendimentos e a gestão em saúde. 

Em 2021, a Revista de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) divulgou os dados de uma pesquisa em relação à identificação das disciplinas que beneficiam a gestão de serviços de saúde e os projetos pedagógicos considerados fundamentais para o exercício profissional da medicina. O estudo revelou que menos de 1% do tempo total da formação acadêmica é investida no ensino de empreendedorismo e de gestão, envolvendo disciplinas como inovação, política, economia, administração, mercado, serviços e qualidade.

Ainda assim, empreender é um desafio possível!

Compreendendo o cenário atual

A primeira coisa que precisamos entender como empreendedores no setor da saúde é que existe diferença entre valor e preço. E a segunda coisa que precisamos fazer é explicar isso para as pessoas. Para todas que compõem o nosso ecossistema – dos fornecedores até os pacientes.

Graças à internet, os pacientes atuais chegam ao consultório cheios de informações – nem todas corretas – sobre doenças e tratamentos. A figura do médico que sabia tudo já não existe e o paciente é cada vez mais cliente. Ele exige que o serviço seja bom desde o primeiro contato para marcar um horário, até o pós-atendimento.

Uma saúde de valor não se mede pelo preço final do tratamento, mas pelo melhor uso dos recursos disponíveis e como isso soluciona – nas condições que a ciência já é capaz de oferecer – o problema do cliente. 

É preciso estar preparado

Lembro que quando comecei a clinicar, éramos eu e uma secretária apenas no consultório. Tudo foi dando certo e o volume de obrigações a cumprir crescendo exponencialmente. De repente, olhei pra mim e vi que era uma empresa com todos os setores. Eu negociava com fornecedores, contratava, atendia aos pacientes, fazia curativos, ligava no pós-atendimento… Mas eu não me via como empresa até aquele momento, embora fosse.

Foi a partir daí que comecei a buscar pessoas especializadas para cada função e o negócio se transformou, ganhou escala.

Esse é o primeiro conselho que dou aos que querem ser médicos-empreendedores ou qualquer outro profissional, dentro ou fora do setor de saúde: se entenda como uma marca. Organize-se desde o início como uma empresa. E para isso alguns passos são fundamentais:

  • Contrate um bom contador para ajudar na legalização da empresa;
  • Tenha uma consultoria em RH para ajudar na contratação de funcionários;
  • Faça uma pesquisa de mercado, entenda o seu nicho de atuação;
  • Contrate um arquiteto especializado para adequar o espaço à sua atividade;
  • Pesquise as tecnologias disponíveis para o seu segmento e faça uma lista de prioridades de implantação, pois os custos costumam ser altos.

E, o mais importante: não tenha medo. Cerque-se de pessoas bem qualificadas, siga estudando, se prepare e tenha resiliência.

*Helen Pessoni é médica, com 16 anos de experiência na área de cirurgia vascular e angiologia e possui duas clínicas no Rio de Janeiro 

Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube

Veja também

Como fintechs apoiam a indústria em cenários adversos

Empreendedorismo: verificação de antecedentes ganha popularidade

Showkase entra para a seleção de empresas aceleradas pelo Grupo Boticário

Acompanhe tudo sobre:MedicinaEmpreendedorismo

Mais de Bússola

Brasil recebe congresso de educação ambiental para países falantes da língua portuguesa

Distribuição pode ser fator determinante no crescimento do mercado de seguros na América Latina

Com educação, agronegócio pode acelerar modernização causando impacto social positivo

Opinião: com aeroportos cada vez mais digitais, aviação precisa entender seriedade da cibersegurança