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 E se Bolsonaro estiver sendo subestimado?

Coluna semanal do analista político Alon Feuerwerker* aprofunda o cenário político e traz os impactos na economia e na sociedade

Jair Bolsonaro: (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Jair Bolsonaro: (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 3 de outubro de 2020 às 21h12.

Quase dois anos depois da inauguração de Jair Bolsonaro na presidência, já é possível esboçar algumas linhas de seu processo decisório. Uma delas, talvez a principal: ele navega sempre de olho nos objetivos programáticos mas nunca descuida de se garantir na variável-chave da sustentação política.

No limite, abre mão sempre que isso é indispensável para não perder base que o sustenta, e não apenas no Congresso.

Eis uma complexidade na vida dos que fazem oposição ou têm a missão de criticá-lo. Como no esquema do teatro grego, o bolsonarismo tem uma máscara, a da antipolítica. Acontece que no fritar dos ovos a política acaba sempre dando as cartas.

Vem daí certa frustração notada entre os apoiadores mais da ponta do espectro.

Uma avaliação honesta do processo decisório bolsonarista terá de admitir, verificada a realidade, que o capitão-deputado feito presidente não é tão tosco quanto alardeiam os detratores. E que há, ao contrário, algum grau de sofisticação na atual operação política.

Acontecia também com Luiz Inácio Lula da Silva, naturalmente que com sinal trocado. Os opositores e críticos viam-no como pior do que realmente era de jogo. O grave erro de, nos negócios e na política, subestimar o concorrente.

Vamos olhar aqui dois eventos. O primeiro é a política para o Nordeste. Claro que teve o acaso, que foram a Covid-19 e o consequente auxílio emergencial, que aliás nasceu magrinho e engordou pelos esforços da oposição. O segundo é a recente indicação do nome para o STF.

Sorte e azar fazem parte do jogo, e quando as decisões são tomadas é preciso levar isso em conta. Análises a posteriori sempre têm um pouco de engenharia de obra feira, mas talvez os governadores do Nordeste tenham tido azar na escolha que fizeram de aceitar uma certa polarização contra o Planalto.

Talvez trabalhassem com a premissa de que o governo ficaria inflexivelmente aferrado à austeridade econômica e isso lhes daria um terreno fértil para fazer oposição a Brasília nos seus estados, reconhecidamente os mais dependentes do dinheiro federal.

Simplesmente não aconteceu, e hoje o cenário é de um bolsonarismo que ganha terreno ali com base em política social, verba para obras e alianças com políticos de direita (mesmo quando ditos de centro) que aliás também já foram aliados do PT.

Talvez o jogo não se inverta completamente no Nordeste, mas Bolsonaro não precisa disso tudo. Basta a ele crescer na região e sustentar de algum modo a posição no Sudeste e no Sul.

As pesquisas mostram que esse objetivo está mais à mão no segundo do que no primeiro.

E tem a indicação para o STF, que claramente teve como vetores 1) não afrontar o próprio STF, 2) garantir o apoio no Senado Federal, com poder de veto neste caso e 3) sinalizar aos políticos com um nome não identificado com a caça a eles.

O fato é que nenhuma das especulações anteriores à indicação descrevia esses critérios como essenciais. Bolsonaro foi aqui claramente subestimado.

E talvez o erro tenha estado em ouvir demais o que se diz na política do que dar atenção ao que se faz. De vez em quando, já se disse aqui, o mais prudente é colocar a política no mudo.

*Analista político da FSB Comunicação. Coluna publicada também nos sites Poder360 e Migalhas

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