Momento é de educação, formação e compreensão do movimento da criptoeconomia (MF3d/Getty Images)
Bússola
Publicado em 26 de fevereiro de 2022 às 15h04.
Última atualização em 26 de fevereiro de 2022 às 15h06.
Por Caio Sanas*
Ao tomar posse na Presidência do Supremo Tribunal Federal, em 10 de setembro de 2020, o Ministro Luiz Fux reforçou a ideia de que é o momento de aumentar o uso da inovação e da tecnologia no direito. O processo de transformação tecnológica na área aumentou substancialmente desde os anos 90 e acelerou com a pandemia da covid-19.
O uso da internet e dos computadores alteram a forma de pesquisa jurídica — que antes dos anos 90 era realizada de maneira presencial nas grandes bibliotecas — bem como a forma de redigir peças processuais e contratos, que passaram a ser redigidos em computadores, tornando as pesquisas demasiadamente mais acessíveis com o advento da internet.
Após os anos 2000, especialmente em 2006, o direito passou por uma grande transformação tecnológica com a Lei nº 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial. Em 2013, a resolução nº 185/2013 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu o Sistema de Processo Judicial Eletrônico como sistema de processamento de informações e práticas de atos processuais.
E mais recentemente a Resolução nº 354/2020 regulamentou as audiências virtuais bem como as cortes remotas, aumentando ainda mais a necessidade do profissional de direito interagir e se adaptar com as tecnologias.
Como consequência dessa transformação, surgem empresas que buscam criar soluções que auxiliam e/ou resolvem problemas jurídicos. Cada vez mais são constituídas empresas especializadas em automação de processos, inteligência artificial, monitoramento de dados públicos, gestão de escritórios, resolução de conflitos online, analytics e jurimetria. As chamadas legal techs e law techs.
De acordo com a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs, o número de startups jurídicas apresentou um crescimento de aproximadamente 300% nos últimos anos. As universidades internacionais e nacionais já estão inserindo na grade curricular disciplinas referentes à tecnologia e computação como, por exemplo, Stanford, Cambridge e, no Brasil, o Insper.
As inovações tecnológicas são fontes de vantagem competitiva, pois podem reduzir custos, aumentar a produtividade automatizando tarefas repetidas, sem perder, contudo, a alta qualidade.
Dentre as inúmeras tecnologias emergentes que impactam o direito e a atividade jurídica, a tecnologia blockchain e os smart contracts (contratos inteligentes) têm o potencial de modificar substancialmente a forma como celebrar contratos, tornando os acordos de vontade imutáveis e autoexecutáveis. A tecnologia blockchain, como a conhecemos, surgiu com o protocolo do Bitcoin, escrito em 2008 com funcionamento a partir de 2009, por Satoshi Nakamoto.
A tecnologia blockchain pode ser conceituada como o resultado de uma engenhosa combinação de técnicas robustas provenientes da computação distribuída confiável (tolerância a falhas bizantinas, sistemas peer to peer); criptografia (chave assimétrica, funções hash, desafios criptográficos e teorias dos jogos (mecanismos de incentivos). Trata-se de um arquivo de dados imutável que carrega os registros de todas as transações envolvendo criptoativos (tokens e criptomoedas).
Os contratos inteligentes (smart contracts) são definidos como protocolo de transação computadorizada (software) que executa aquilo que foi programado de maneira automática. São códigos de programação, ou seja, são escritos por meio de linguagem de programação e não por linguagem tradicional como os já conhecidos contratos.
Tais tecnologias fizeram emergir o que vem a ser chamado de criptoeconomia, ou seja, economia na qual os agentes econômicos transacionam por meio de tokens e criptomoedas. De acordo com os dados da CoinMarketCap, atualmente a criptoeconomia movimenta mais de 1 trilhão de dólares em volumes de negócio.
Nessa economia, que vem crescendo a cada dia, os contratos inteligentes inseridos no blockchain resolvem o grande problema da desconfiança recíproca, ao assegurar que determinado acordo de vontade será imutável e executado sem a necessidade de uma ordem do Poder Judiciário, ou seja, as partes não precisam se conhecer para garantir que um acordo será cumprido.
Isso muda totalmente a forma como os agentes econômicos transacionam no mercado e impacta diretamente na atuação dos profissionais jurídicos, que em geral não possuem expertise na construção de contratos inteligentes. Por esse motivo, sugere-se uma atuação interdisciplinar entre profissionais jurídicos e profissionais da computação para a construção de arquiteturas eficientes e que observem as regras jurídicas dos contratos.
Imagine um contrato em que não há necessidade de buscar o Poder Judiciário para a sua execução. Imagine que não há necessidade de saber a identidade da pessoa com quem se está transacionando, pois a tecnologia assegura que o acordo será cumprido. Imagine automatizar uma determinada cláusula de um contrato trazendo maior eficiência e segurança para as partes. Essas são situações que os contratos inteligentes já solucionam.
A produção acadêmica referente ao tema dos contratos inteligentes no blockchain, por profissionais jurídicos, bem como a procura desses profissionais por cursos tem aumentado diariamente. Da mesma forma, inúmeros negócios envolvendo a tecnologia blockchain e contratos inteligentes têm crescido a cada dia, como pode ser visto com a publicação anual da Forbes da lista de 50 principais empresas que adotaram a tecnologia blockchain.
O momento é de educação, formação e compreensão do movimento da criptoeconomia de modo que, em um futuro breve, o mundo dos contratos e dos registros de posse e de propriedades não será mais o mesmo.
*Caio Sanas é advogado no mercado de blockchain e criptoativos
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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