As climatechs atuam em áreas como energia limpa, agricultura regenerativa, saneamento, mobilidade elétrica, economia circular, inteligência climática, entre outras (Laurence Dutton/Getty Images)
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Publicado em 22 de julho de 2025 às 15h00.
Por Zé Gustavo e Ana Himmelstein*
Enchentes, secas históricas, incêndios florestais e ondas de calor recorde. Os efeitos da crise climática não são desconhecidos dos brasileiros. A catástrofe vem ocupando com cada vez mais frequência os noticiários e o imaginário coletivo — não sem razão — as consequências são reais, cada vez mais expressivas, constantes e exigem resposta imediata. Não por acaso, falamos cada vez mais em emergência climática.
À medida que os eventos extremos se repetem em ritmo acelerado, emergem dois sentimentos ainda pouco debatidos:
A primeira não apenas traduz o medo e a iminência de dias piores; ela aprofunda uma crise de saúde mental já próxima a uma epidemia, adicionando mais um impacto perverso da emergência climática sobre a qualidade de vida e a saúde humana.
Já a resignação é ainda mais perigosa: ela anestesia a sociedade, mina nossa confiança coletiva e sabota a capacidade de reagir. E, diante de uma emergência sem precedentes, não basta agir; é preciso agir depressa, com soluções inéditas e capazes de resolver problemas críticos em larga escala.
É nesse contexto que ganha força um novo setor econômico, ainda pouco visível, mas profundamente alinhado com a urgência do nosso tempo: as climatechs, empresas de base tecnológica — de software, hardware, ciência aplicada e processos industriais — que desenvolvem produtos e serviços com impacto positivo para o clima.
Em sua maioria concebidas como startups, nascem já comprometidas com a lógica da inovação acelerada, da experimentação constante e do aprendizado contínuo. Operam em ciclos curtos, com alta capacidade de adaptação e foco em soluções escaláveis — exatamente o tipo de resposta de que precisamos para enfrentar uma crise sistêmica como a climática.
As climatechs atuam em áreas como energia limpa, agricultura regenerativa, saneamento, mobilidade elétrica, economia circular, inteligência climática, entre outras. Em comum, compartilham um propósito claro: criar soluções escaláveis que ajudem o mundo a mitigar e se adaptar aos efeitos da crise climática e, ao mesmo tempo, gerar valor econômico nesse processo. Em conjunto, constituem um setor econômico emergente, cujo desenvolvimento e amadurecimento representam um vetor estratégico de transformação.
Empresas brasileiras estão desenvolvendo tecnologias proprietárias, atraindo investimentos relevantes e crescendo em mercados altamente promissores. Há uma nova geração de negócios moldando o futuro da economia brasileira sob a lógica da transição ecológica.
A crise climática é uma transição civilizatória que vai remodelar nossa economia, nossos hábitos e nossas prioridades nas próximas décadas. O paralelo com o setor de tecnologia da informação nas décadas de 1980 e 1990 é ilustrativo. Naquele período, uma onda de inovações em computação pessoal e internet reconfigurou a sociedade, os mercados e o cotidiano.
Hoje, algo semelhante começa a acontecer com o clima: a crise climática passa a ser vetor estruturante de transformação econômica, principalmente nos cenários de aumento de temperatura acima de 1,5ºC. As soluções que nas próximas décadas serão fundamentais para a adaptação da sociedade a uma nova realidade climática — e para a mitigação dos impactos que ainda podem ser evitados — estão sendo desenvolvidas agora, por empreendedores que atuam na fronteira entre ciência, impacto e escala.
O Brasil é uma das economias mais expostas aos efeitos da crise climática, com impactos profundos sobre territórios, cadeias produtivas e a população. A boa notícia é que essa vulnerabilidade convive com um conjunto raro de vantagens estratégicas. O país abriga o maior ecossistema de ciência, tecnologia e empreendedorismo da América Latina, além de ser uma das economias mais expostas aos riscos climáticos. Essa convergência entre capacidade científica e urgência ambiental cria um terreno fértil para a geração de soluções com relevância global — e potencial de retorno econômico e desenvolvimento regional.
Apesar disso, as climatechs ainda enfrentam barreiras estruturais significativas. Falta, sobretudo, acesso a capital paciente e tolerante ao risco — fundamental para negócios que operam com ciência, inovação e ciclos de maturação mais longos. Investidores e gestores públicos começam a se mobilizar, mas ainda é preciso ampliar a percepção sobre o potencial desse novo setor. Trata-se, afinal, de investir não só em soluções ambientais, mas em prosperidade econômica alinhada ao futuro do planeta.
Com a proximidade da COP30, temos diante de nós uma oportunidade histórica. O país pode — e deve — se apresentar ao mundo não apenas como guardião de biomas estratégicos, mas como protagonista em inovação climática. Fazer isso requer maturidade política, ambição econômica e visão estratégica.
Não se trata de substituir a gravidade da crise climática por otimismo ingênuo. Trata-se de reconhecer que, para além da catástrofe, existe um horizonte de ação e oportunidade. E que esse horizonte começa agora.
*Zé Gustavo e Ana Himmelstein são parte da Diretoria Executiva do Fórum Brasileiro das Climatechs.
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