A seguir, um resumo com as principais tendências trazidas pelo “Guia de Tendências ESG para 2024” (Weedezign/Getty Images)
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Publicado em 24 de maio de 2024 às 15h39.
Por Claudia Elisa Soares*
Nos últimos meses, uma forte corrente anti-ESG ganhou corpo, principalmente nos Estados Unidos e por aqui. Estou em grupos de WhatsApp que se mostram muito divididos com relação até ao uso do termo ESG. Algumas pessoas dizem que já cansou, que o termo está desgastado. Outras (e eu me incluo aqui) pensam que o termo ajudou o tema da sustentabilidade a ganhar relevância e estar na pauta estratégica a qual pertence. E assim, ainda é muito bom para indicar os aspectos de Meio Ambiente, de Sociedade e de Governança que precisam ser mais claramente debatidos e enfrentados com ações concretas.
Como explicou em artigo Ricardo Voltolini, um dos maiores especialistas em responsabilidade social e sustentabilidade no Brasil, a narrativa do “ESG morreu” é uma contraofensiva de empresas ligadas a estados norte-americanos produtores de petróleo, incomodadas com a força crescente das energias renováveis na transição energética.
A pressão política encontrou respaldo. Segundo o Financial Times, o volume de recursos em fundos “verdes”, que chegou a US$ 151 bilhões em 2021, baixou para US$ 37,8 bilhões no ano passado. Contudo, essa redução, além da já citada pressão, parece ser muito mais uma calibragem, um freio de arrumação, do que uma desistência do ESG.
Prova disso é que relatório recente do Morgan Stanley aponta que 77% dos investidores globais mostram interesse em investimentos sustentáveis e 54% planejam ampliar o aporte de recursos, estimulados pela convicção de que práticas ESG geram mais retornos.
E quando olhamos o “Guia de Tendências ESG para 2024” publicado pela Economia B, fruto de uma análise aprofundada dos relatórios produzidos pelas maiores consultorias do mundo sobre o tema, temos certeza que o ESG vai muito bem, obrigado.
A seguir, um resumo com as principais tendências para este ano trazidas pelo Guia.
Para sair do discurso e efetivamente entrar nas estratégias das empresas em 2024, a sustentabilidade precisará estar profundamente integrada às bases financeiras das organizações. O reconhecimento crescente da interconexão entre sustentabilidade e estabilidade financeira está promovendo uma fusão entre sustentabilidade, finanças e estratégia de negócios, evidenciando a necessidade de abordagens holísticas para garantir o sucesso empresarial a longo prazo
A perda de biodiversidade está se tornando uma preocupação central nas estratégias ESG. Estamos presenciando uma mudança significativa nas empresas em direção a uma abordagem mais consciente e responsável em relação à preservação da biodiversidade e à gestão sustentável dos recursos naturais.
A inteligência artificial (IA) surge como uma ferramenta promissora para impulsionar as metas ESG das empresas, permitindo a análise de grandes conjuntos de dados, identificação de tendências e riscos, e fornecendo insights valiosos para alcançar essas metas de maneira eficiente e impactante.
Essa tendência enfatiza a necessidade de práticas sustentáveis genuínas e uma abordagem transparente para garantir a confiança e a credibilidade das organizações no mercado. Evitar promessas vazias e narrativas enganosas tornou-se crucial não apenas devido à pressão dos consumidores, mas também ao interesse dos investidores em relatórios precisos e confiáveis sobre o desempenho sustentável das empresas.
O movimento de requalificação da mão de obra surge como resposta às necessidades de habilidades exigidas pelas mudanças demográficas, socioambientais e tecnológicas. Além disso, apesar do crescente foco em ESG, muitas empresas enfrentam desafios na identificação e retenção de talentos adequados para implementar suas metas.
A tendência de desperdício zero está ganhando destaque à medida que as preocupações com mudanças climáticas e perda de biodiversidade aumentam. Movimentos como zero waste e economia circular deverão ganhar ainda mais visibilidade, visando minimizar a geração de resíduos e promover uma gestão eficiente de recursos.
As práticas relacionadas à diversidade, equidade e inclusão (DEI) devem permanecer em destaque no aspecto social das estratégias empresariais em 2024, impulsionadas pela crescente demanda por transparência por parte de investidores e consumidores. Além disso, observa-se um movimento regulatório para aumentar a transparência das empresas, com recomendações específicas sobre divulgação de dados de DEI por parte de órgãos como a Comissão de Valores Mobiliários do Brasil (CVM) e a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC).
A crescente conscientização do público sobre os impactos socioambientais das organizações está impulsionando outros dois movimentos dentro das empresas: o ativismo dos acionistas e a advocacia corporativa. O ativismo dos acionistas envolve o uso do poder de voto e influência para pressionar por mudanças dentro das organizações. Já a advocacia corporativa refere-se às ações das empresas para influenciar decisões políticas, legislativas ou regulatórias que possam afetar suas operações e as comunidades em que atuam.
Contudo, como o próprio nome do documento diz, são tendências para este ano, previstas por uma consultorias especializadas no assunto. Isso não significa que irão se concretizar. No meu entendimento, cabe a todos os interessados pelo tema ESG, manter um espírito crítico, buscando equilibrar diferentes pontos de vista, embasados por argumentos sólidos.
Esse sistema de freios e contrapesos no debate enriquece a qualidade do diálogo, abre caminhos para novas soluções e diminui o risco do pensamento de grupo, que, na maioria das vezes, acaba se revelando uma grande armadilha.
Vale ressaltar também que o mercado tem mecanismos muito peculiares de funcionamento e regulação. Qualquer evento fora do script (incidentes diplomáticos, crises no fornecimento de matéria-prima, aumento de preços, adoção de novas tecnologias) tem o poder de mudar completamente o panorama do jogo em pouco tempo.
Por isso, não dá pra cravar que tudo o que está exposto irá vingar.
Para os mais céticos, muitas dessas tendências em ESG estão ainda longe de se tornarem (se é que vão se tornar um dia) realidade nas empresas de capital fechado, principalmente as médias e pequenas, até por conta da politização sobre o tema, que às vezes pensa que falar sobre ele é “algo da esquerda”.
Sabemos que a discussão sobre ESG tem, antes de mais nada, um sentido econômico e reputacional. Para mim, é indiscutível que sua melhor compreensão e maior inclusão como tema de impacto no médio e longo prazo vai, sim, distinguir as organizações feitas para durar.
*Claudia Elisa Soares é especialista em ESG e transformação de negócios e líderes e conselheira em companhias abertas e familiares
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