Bolhas políticas estão cada vez mais fechadas em si mesmas. (Fotos: Charles Platiau/Reuters e Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Bússola
Publicado em 24 de setembro de 2021 às 15h37.
Última atualização em 24 de setembro de 2021 às 15h39.
Por Márcio de Freitas*
O centro político terá a difícil missão de chamar a atenção do eleitor em 2022, face a uma perspectiva de disputa polarizada por adversários radicais e opostos, mas com talento para seduzir seus próprios campos de apoiadores. Não será tarefa para amador avançar sobre o patrimônio do presidente Jair Bolsonaro e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Imagine a cena: o candidato de centro nos debates a defender as instituições, o equilíbrio, a civilidade, o diálogo e a racionalidade. É como o malabarista no semáforo tentando arrancar algum dinheiro dos motoristas que só pensam e acelerar assim que o sinal ficar verde. Os objetivos raramente se encontram nestes casos.
As bolhas políticas estão cada vez mais fechadas em si mesmas, com munição de alto calibre uma contra a outra. A intolerância e o ódio se retroalimentam e mantém acesa a chama da rivalidade. Nas redes, a confluência surge quando miram os críticos e a imprensa, a escolhida inimiga de qualquer campo em todos os momentos.
O centro até tem boa convivência com a imprensa, mas essa não pode retribuir pela regra da imparcialidade. E até porque já é classificada pelos extremos de tendenciosa e politizada. Algumas (ou muitas) vezes, com razão.
O fato é que a imprensa e o centro têm dificuldades semelhantes, encontrar o equilíbrio num momento onde a balança ora pende para um lado, ora escorrega para outro abruptamente impulsionada por uma avalanche de fatos que geram emoções conflitantes. Grupos sociais de direita ou de esquerda não ouvem argumentos de um outro segmento que não seja o seu próprio. Se um terceiro entra na disputa, é ignorado sem cerimônia ou polidez. É empurrado para a neutralidade da insignificância da falta de votos com notável arrogância e agressividade.
Há realmente dificuldade em vender slogans como “vamos conversar; o diálogo é o melhor caminho; o equilíbrio vai vencer”... Palavras mais fortes como “basta; chega; não aceito; de maneira alguma; jamais no meu governo; nunca antes na história” são mais salientes e sedutoras. Ainda mais num país onde o dinheiro público é instrumento pessoal do governante para se manter no poder ou eleger um aliado. A noção do coletivo é muito inferior ao indivíduo, este ser supremo e ególatra que vale por milhões desde os tempos imemoriais do sebastianismo.
Há pouca tentativa de entender o sentimento dos grupos e criar empatia. O apoio ao governo Bolsonaro é um fenômeno observado por uma elite intelectual como se o presidente fosse uma nova espécie de Antônio Conselheiro do século XXI entrincheirado em Canudos à espera do terceiro fogo. O mesmo estranhamento acontece em relação ao petismo de Lula. Ambos despertam paixões e ódios. Ao eleitor cabe amar ou odiar. E não racionalizar suas escolhas.
Os calmos, os tranquilos, os racionais e os equilibrados não despertam paixões, convenientes para o período eleitoral. Neste sentido, o centro permanece hoje como uma pequena marola num mar de grandes ondas.
Exemplar é a briga tucana nas prévias do PSDB, que começou oficialmente esta semana. O processo de articulação tem chamado pouca atenção da mídia, até pelo elevado padrão da concorrência (até agora), mas registra bons movimentos de bastidor político em estado puro. Sedução pela conversa e convencimento, mas também a poderosa força do dinheiro, aliado a trabalho com ressentimentos e expectativa futura para conquistar apoios ou neutralizar adversários. Tudo tecido com discrição não intencional.
De um lado, Eduardo Leite do distante Rio Grande do Sul, jovem governador e abraçado por forças que resistem ao acelerado paulista João Doria, dono de poderosa máquina de governo no maior colégio eleitoral do país. Ambos são bons comunicadores, mas não conseguiram até agora formar seguidores como Lula e Bolsonaro. Talvez jamais tenham esses exércitos populares em apoio às suas candidaturas. Isso porque ainda defendem uma pauta racional, sem grandes demagogias e populismos.
A grande barreira aos nomes tucanos, ainda é a pressa e polarização do eleitor, que vê o malabarista segurando pratos, jogando bolas para o céu e está interessado em acelerar neste momento. E as eleições ainda estão longe e a paixão atual ainda arde. Não significa que a fotografia atual das pesquisas ficará congelada até outubro de 2022, mas descongelar o coração do eleitor será fundamental para a viabilidade do centro. E para isso não basta apenas ter boas ideias, é preciso ter comunicação e emoção. E vender um futuro que ninguém ainda enxerga no horizonte.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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