Muitos preveem ameaças no Brasil como a invasão ao Capitólio (Win McNamee/Getty Images)
Bússola
Publicado em 22 de julho de 2022 às 21h27.
O poeta paranaense Leminski cunhou uma expressão que poderia ser adotada como slogan nacional: “Distraídos venceremos”. Nada mais brasileiro. A crença em uma força oculta que nos levará a um futuro melhor é uma panacéia característica, cujas emanações embalaram até mesmo intelectuais como Stefen Zweig, o autor do “Brasil, país do futuro”.
Nada mais premonitório que o fato de Zweig ter se suicidado nas montanhas do Rio de Janeiro. A construção do futuro começa bem antes dele chegar, como sabem os mais bem sucedidos sucessos da história – e também os desastres. Um improviso bem planejado é a melhor narrativa da história. A eleição deste ano parece adiar o debate sobre o futuro. É tudo imediato, para convencer nem sempre para construir. Seja porque há fome no país, seja porque há guerra na Ucrânia, ou porque há perigos na esquina. Afinal, eles vencerão. E eles estarão no governo - independente de que grupo político seja eleito.
Mas o que significa a vitória de alguns para tantos outros? Afinal, o governo tem lá seus milhares de cargos de confiança para satisfazer aliados vistam eles azul, rosa ou vermelho. Estes estarão contemplados. Só que os eleitores são 156 milhões, e os governados passam de duas centenas de milhões. A estes, pouco foi ofertado em termos de soluções em políticas públicas. Ok, é um chato cobrando algo que ninguém quer saber neste momento! Mas os chatos também escrevem…
E isso porque há um grau de importância na discussão teórica que na prática se torna subdesenvolvimento ou permite a um país avançar. Este campo é do debate eleitoral, da arena política onde há exposição e choque de propostas e ideias divergentes. Bom nessas horas lembrar Robert Dawn e seus estudos sobre quem governa, e as vantagens do sistema democrático na distribuição da riqueza (mesmo com toda concentração de bilhões nas mãos de poucos) em nações desenvolvidas.
Ou Steven Pinker que nos fala disso em seus livros otimistas sobre a evolução promovida pela ciência, capitalismo e liberalismo desde o Iluminismo, revolução industrial e tecnológica. Os dados estão lá para serem vistos e a realidade realmente foi transformada. Muito pela luz de debates e avaliação de propostas.
Mas é essencial também entender porque alguns países não conseguiram ter os mesmos resultados que as nações desenvolvidas e ricas. A pergunta é: por que as nações fracassam? E algo de institucional na resposta. Construir um país é algo que exige esforço, trabalho, persistência e alguma sorte.
Comparar o Brasil com os Estados Unidos nos últimos tempos se tornou comum, até porque muitos veem ameaças como as ocorridas no Capitólio e preveem consequências piores aqui. É preciso notar, entretanto, que, se lá as coisas se passaram daquela forma, e foram resolvidas internamente, o Brasil não é os Estados Unidos. Instituições fortes garantem mais estabilidade mesmo diante de muita turbulência.
Após o resultado das urnas, os fatos serão diferentes e suas repercussões certamente terão diferentes nuances. Até porque uma potência militar e econômica daquele tamanho inspira certo cuidado no trato diplomático e inibe críticas abertas de outros países. A falta de poderio militar e a dependência de mercados do país poderá ter outra toada. E é bom lembrar que o empresariado nacional é globalizado, não porque o queira, mas porque nossos mercados compradores são múltiplos, distribuídos em todos continentes e fragmentados. E estamos longe de alguns dos maiores compradores, mas perto dos maiores influenciadores da geopolítica internacional.
Discute-se economia e as implicações de diferentes tendências políticas no futuro posicionamento do país na campanha eleitoral? Pouco ou quase nada. Nada se fala sobre política internacional neste momento. Na verdade, nem o Itamaraty tem falado sobre o tema, diante de um momento interno complexo e de um contexto internacional ainda sem clareza.
Adota-se uma postura distraída. O tempo passa, e se espera o vencedor planejar o futuro. Mas isso deve acontecer só quando o futuro já tiver chegado. Assistimos ao jogo da geral, enquanto os times questionam o VAR. Pode ser um pouco tarde para desinterditar o debate essencial sobre o país.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
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