Até 2030, 340 milhões de mulheres viverão na pobreza. O dado aponta a importância do tema (DON EMMERT/AFP/Getty Images)
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Publicado em 18 de setembro de 2023 às 10h51.
Por Marcela Carvalho Bocayuva*
Desde os anos 90, comumente conhecida como a Década das Conferências, as Organizações Internacionais começaram a contemplar questões sociais e ambientais em suas atividades. Como consequência, tais Organizações passaram a influenciar para além dos Estados-parte e possibilitar a disseminação de diretrizes de boas práticas para todos os eixos.
Nesse sentido, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, comumente chamados de ODS em português, estabelecido em 2015 pelas Nações Unidas, contemplam 17 objetivos interseccionais para a área social e ambiental. Sua implementação sucede os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio estabelecido em 200 na cúpula do Milênio das Nações Unidas.
Resultado da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável no Rio de Janeiro, em 2012, os 17 objetivos são interconectados e dispõe sobre os principais desafios da nossa geração, dentre eles a igualdade de gênero (ODS 5).
O ODS 5 dispõe sobre a implementação de iniciativas para alcançar a igualdade de gênero e emponderar todas as mulheres e meninas. Dentro desse contexto, a igualdade incluiria acabar com todas as formas de discriminação, eliminar qualquer tipo de violência em todas as esferas (públicas e privadas), garantir a participação plena e efetiva, igualdade de oportunidades para liderança em todos os níveis, acesso universal à saúde sexual e reprodutiva e fortalecer políticas sólidas para promoção da equidade de gênero.
Para atingir os objetivos de equidade e empoderamento do ODS 5 até 2030, data estabelecida pelas Nações Unidas para alcançar as metas estabelecidas pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, seria necessário um investimento adicional de pelo menos 360 bilhões de dólares por ano.
O Panorama de Gênero de 2023 alerta que, se as tendências atuais se mantiverem, mais de 340 milhões de mulheres – cerca de 8% da população feminina mundial – viverão em pobreza extrema até 2030, e uma em cada quatro sofrerá de pobreza moderada ou grave e insegurança alimentar. A falta de equidade nas posições de liderança e poder permanecem estagnadas, ao ritmo atual de progresso, a próxima geração de mulheres ainda gastará, em média, mais de 2 a 3 horas por dia em cuidados não remunerados e trabalho doméstico do que os homens.
O relatório deste ano incluiu pela primeira vez dados sobre as intersecções de gênero à luz das alterações climáticas, e prevê que até meados do século, no pior cenário climático, poderão atingir mais 158,3 milhões de mulheres e deixá-las em condições de extrema pobreza (mais 16 milhões do que o número total de homens), isso porque as alterações climáticas afetam a insegurança alimentar e consequentemente afetam mais as mulheres por não terem condições econômicas de sobreviverem e/ou serem autossuficientes para sua família,
As metas do objetivo 5 não são meramente guias para o Estado, e sim disposições a serem implementadas por todos, independente do eixo. Portanto, quando pensamos nas esferas público e privadas, é imprescindível implementarmos iniciativas que possam impactar positivamente o mundo.
O conceito de ESG vem inglês “Environmental, Social and Governance” e, conforme definição do Pacto Global, corresponde “às práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização”. Dentro da classificação, existe o E (critério ambiental), S (critério social) e G (governança). Em síntese, ESG engloba, tanto os manejos dos recursos utilizados, diversidade, implementação de sistemas, controles e procedimentos eficazes, quanto os relacionamentos que a organização mantém e a reputação que ela promove com outras pessoas, instituições e comunidades.
O termo nasceu a partir de uma provocação de alguns empresários de instituições financeiras e do então Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, sobre uma possível integração de princípios ambientais e sociais no mundo corporativo. Desde então a implementação do ESG se tornou algo fundamental para o processo de tomada de decisões dentro de uma organização.
Conforme estudo “EY Global Reporting and Institutional Investor Survey”, 99% dos investidores brasileiros condicionam a sua decisão conforme a divulgação de dados de ESG por parte das empresas. Em outras palavras, a implementação dos princípios de ESG em uma organização é fundamental para a sua sustentabilidade enquanto empresa.
ESG auxilia as empresas a compreenderem o seu real impacto e como aprimorar sua gestão. Neste sentido, o ODS 5 pode ser uma grande ferramenta para contribuir com uma maior diversidade de gênero nas organizações e impactar positivamente aqueles em seu redor.
Ainda sob a perspectiva ESG, diversas organizações já implementaram compromisso com a igualdade de gênero a partir de iniciativas que respeitem a diversidade, igualdade salarial, ampliação de projetos junto com a sociedade civil, presença de mulheres no Conselho de Administração e até mesmo apoio financeiro para promover políticas de igualdade.
Segundo o Fórum Econômico mundial, em 2022 a lacuna global de gênero se fechou por 68,1%. Neste ritmo, ainda serão necessários 132 anos para alcançar a paridade de gênero no mundo. No Brasil não é diferente, no ranking de desigualdade de gênero, dentre 146 países, o Brasil ocupa o 94º lugar.
A equidade de gênero ainda é um grande desafio para o Brasil, em especial nos espaços de Poder. Como exemplo recente, caso o atual Presidente da República não indique uma mulher para a próxima vaga que será aberta no fim deste mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) voltará 23 anos no tempo – quando tinha nos seus quadros apenas uma mulher, a ministra Ellen Gracie e certamente cairá inúmeras posições nos rankings mundiais que analisam a equidade de gênero. Sobremaneira relevante o fato de que em 132 anos de história, o STF teve 171 ministros e apenas 3 mulheres.
Entretanto, a partir das ações ESG que envolvam perspectiva de gênero, o Brasil terá uma grande oportunidade de ser exemplo pelas Nações Unidas afim de contribuir com a agenda 2030 e aprimorar sua atuação para outras agendas como a entrada do País na OCDE, possibilitando assim um maior empoderamento de mulheres e meninas.
Iniciativas como a do Instituto Nós por Elas como a entrega da primeira ISO mundial de combate à violência contra mulher e o Selo Nós Por Elas em parceria com a ABNT, para a concessão e manutenção da certificação para empresas, organizações e instituições que comprovem a adoção de diretrizes de proteção à mulher, a fim de reduzir os números de violência contra a população feminina, são exemplos que colocam o Brasil como vanguardista na proteção e igualdade de gênero das mulheres.
*Marcela Carvalho Bocayuva é advogada, mestre em direito, coordenadora da Escola Nacional da Magistratura, certificada em liderança pela universidade de Harvard e direito e economia pela Universidade de Chicago
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