Coluna semanal do analista político Alon Feuerwerker aprofunda o cenário político e traz os impactos na economia e na sociedade (Alan Santos/PR/Flickr)
André Martins
Publicado em 13 de fevereiro de 2021 às 15h31.
As pesquisas convergem para duas constatações sobre 2022. O presidente Jair Bolsonaro permanece competitivo e tem uma reserva para ir ao segundo turno. Claro que nas condições normais, e atuais, de temperatura e pressão. Por outro lado, todos os levantamentos indicam um segundo turno duríssimo para ele. As margens hoje sobre os desafiantes são estreitas, além do que seria saudável para um incumbent, como dizem os americanos.
O estilo e a linha do presidente, sabe-se, têm dois efeitos. Garantem a fidelidade de um núcleo duro, mas também estimulam a aproximação entre os potenciais adversários. Este segundo movimento hoje acontece numa velocidade compatível com a era digital. A dúvida? Qual será a capacidade de o desafiante escolhido no primeiro turno agrupar o antibolsonarismo no segundo.
É o repisado tema da “frente ampla”. O benchmark mais abrangente? A coalizão formada na transição para a Nova República em 1985. É o caso histórico bem conhecido da ida para o oposicionismo de personagens que haviam apoiado a deposição de João Goulart em 1964. Na estocada final, um pedaço inteiro do governista PDS (antes Arena) juntou-se ao PMDB (antes MDB) na forma de Frente Liberal. Depois viraria partido (PFL, o hoje Democratas).
Mas ali foi a culminância de uma caminhada de duas décadas, na qual a esquerda e os progressivamente convertidos foram se aproximando ao longo de sucessivas eleições e movimentos político-sociais antirregime. Dois (quatro?) anos não são vinte. Ainda que, como dito, no mundo da internet a velocidade seja bem maior. E tem outro aspecto, ainda mais significativo. Ali havia um acordo: todos os grupos oposicionistas aceitavam-se na frente.
Mesmo Luiz Inácio Lula da Silva, que depois no PT construiria um caminho próprio, apoiou Fernando Henrique Cardoso (MDB) para o Senado em 1978.
Sobre aquela época, pode-se argumentar que a aceitação mútua era facilitada por um detalhe: a hegemonia ali estava pré-estabelecida, havia um único partido permitido de oposição e seu controle estava garantido nas mãos do hoje chamado “centro”. Ainda que permanecesse nele uma disputa entre “autênticos” e “moderados”. Estes últimos dispostos a uma eventual negociação com o regime em torno da transição.
Tem mais. Do emedebismo raiz à esquerda, estavam todos rigorosamente excluídos do poder. E aí certa hora juntaram-se para fazer a passagem. É possível argumentar que o PT não votou em Tancredo Neves. Verdade. Mas talvez tenha sido também porque a vitória do mineiro estava garantida. Nunca saberemos - e esta afirmação leva a vantagem de não poder ser derrubada pelos fatos -, mas é possível que se os votos do PT fossem decisivos contra Paulo Maluf a posição do partido teria sido outra.
Mais um detalhe. Havia na oposição razoável consenso sobre a necessidade de uma política econômica à época rotulada de heterodoxa. Foi a era de ouro dos economistas nacionalistas, defensores do papel do Estado. Depois deu errado. José Sarney atravessou sucessivas borrascas econômicas, editou sucessivos planos econômicos, que fracassaram todos, e quase caiu. Até cruzar a linha de chegada com a língua de fora. Mas isso foi depois.
Hoje 1) uma gorda parte da possível frente ampla está aninhada no Estado, 2) não há acordo básico sobre, por exemplo, os que ficarem fora do segundo turno apoiarem quem for à decisão e 3) o neo-oposicionismo apoia resolutamente a condução da economia pela dupla Bolsonaro-Paulo Guedes.
São obstáculos intransponíveis para a formação da frente? Não. Mas indicam que, mesmo com todas as dificuldades, o governo mantém margem de manobra. Resta saber como, e se, vai usar.
* Analista político da FSB Comunicação
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