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A arrogância é o maior obstáculo para o conhecimento

CEO da Trizy conta como as experiências vividas e a capacidade de ouvir são fundamentais para guiar uma equipe cheia de energia

Leituras que valem por um diploma (Thinkstock/Thinkstock)

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Publicado em 12 de julho de 2021 às 13h09.

Última atualização em 17 de julho de 2021 às 15h32.

Por Renato Gouveia*

Que bom seria se pudéssemos ter a energia de quando éramos jovens com a experiência e a sabedoria que a gente só acumula com o passar do tempo. Conseguiríamos fazer coisas incríveis. Acho que o universo sabendo disso cria esse equilíbrio. Ninguém pode ter esse superpoder, e por isso precisamos trabalhar em times, para em conjunto alcançar essas coisas incríveis.

Eu já fiz muita besteira na vida, especialmente na minha jornada profissional. Cometi uma série de erros honestos. Chamo de erro honesto, pois a intenção sempre era boa, mas a forma nem sempre adequada.

Um desses erros, porém, me marcou bastante. Aconteceu por ali, nos já longínquos anos 2000. Eu tinha muita energia, queria muito deixar minha marca. Tive a oportunidade de crescer muito rápido e ser exposto a cargos e experiências inimagináveis, tanto para a minha idade quanto para o tempo de companhia que eu tinha. Me sentia muito preparado.

Com poucos anos de companhia, eu já ocupava uma função de liderança para a logística da Ambev e calhou de acontecer o primeiro grande movimento de fusão. Caiu no meu colo a responsabilidade de representar a Ambev no grupo que desenharia o modelo global de logística para a então recém-criada Inbev. Super oportunidade. Eu estava nas nuvens.

Nota importante: A Ambev não sabia fazer isso direito. Era o primeiro movimento realmente grande. A orientação implícita, no auge da nossa arrogância, era: “Vamos implantar como nós fazemos aqui. Funciona, e os resultados são inquestionáveis”.

Segui então para Zagreb, na Croácia, para o primeiro workshop. Com toda a minha petulância e modelo de gestão embaixo do braço, tinha a missão de convencer o mundo que todos deveriam operar como o Brasil. Na primeira reunião, vi uma série de cabelos brancos na sala e notei a surpresa deles ao ver um “garoto”. Tudo bem. Já era esperado. Eu sabia o que tinha que fazer. Estava super focado.

Na primeira oportunidade que surgiu, me atirei na defesa do nosso modelo. A estrutura organizacional tinha que ser a nossa. Lembro bem. Cada gerente regional de logística tinha que ter um spam of control, de no mínimo quatro operações, com algum pequeno ajuste possível por tamanho das operações. Eu estava com todos os tempos e movimentos na mão, e tinha acabado de implantar esse modelo com sucesso e ganhos consideráveis de eficiência. Aquela discussão eu não podia perder. Estava na mão.

Na ânsia de cravar meu ponto, perdi a sensibilidade de escutar e ampliar a minha visão para tudo que estava acontecendo ao meu redor. Estávamos organizados por zonas. A zona do Leste Europeu era composta de vários países com operações muito pequenas. Abri o pulmão sem dó e falei: Aqui facilmente um gerente regional só da conta. Nesse momento, recebi uma das maiores lições da minha carreira.

Com muita tranquilidade, o meu par que atuava nessa região me explicou que, há pouco mais de dez anos, todos naquela região estavam em conflito com a separação da Iugoslávia, e que quase toda a população masculina adulta se envolveu militarmente no conflito. Essas operações que eu queria consolidar eram compostas por pessoas que, muito recentemente, viram seus parentes ou elas mesmas em trincheiras adversárias e que a simples circulação de pessoas não era algo bem resolvido ainda. Ele mesmo, ex-capitão do exército Croata, não podia entrar em todos os países.

Instantaneamente vi que eu estava completamente despreparado para aquela discussão. Acho que nunca tomei uma invertida tão grande com tanta elegância na vida. Daquele momento em diante, entendi que precisava escutar mais e que eu estava apenas no começo da minha curva de aprendizado. A reunião seguiu, baixei a guarda, pedi desculpas e fizemos um super trabalho juntos. Desenhamos o VPO Global de Logística, que virou a cartilha de operações oficial da Ab-Inbev e que vem evoluindo desde então. O resto virou história para eu contar por aí.

Hoje, vários anos depois e no meu mundo atual de startups, não sinto mais a pressão de “abrir o pulmão sem dó”, e sempre lembro e me inspiro no meu colega croata para ajudar uma turma incrível e cheia de energia a encontrar o caminho deles.

*Renato Gouveia é CEO da Trizy, startup de logística do Grupo Cosan

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