Passado o mês do orgulho, empresas precisam manter vivo o tema da diversidade. (Lyubov Ivanova/Getty Images)
Bússola
Publicado em 6 de julho de 2021 às 18h19.
Última atualização em 6 de julho de 2021 às 19h46.
Por Beta Boechat*
O mês do orgulho LGBTQIA+ acabou, as marcas temáticas com bandeiras do arco-íris voltaram para suas versões originais e a contagem regressiva para junho de 2022 começou. Não é incomum assistirmos nesses meses comemorativos, ativistas de um lado, lembrando que o assunto da diversidade não pode estar vivo somente em um mês do ano (como fiz na minha entrevista aqui na Bússola na semana passada), e empresas do outro, prometendo continuar a pensar e apoiar durante os outros meses do ano.
Toda essa cobrança pode parecer aos olhos mais desatentos que as tais “minorias” – que numericamente, estão longe de serem pequenas – querem ser celebradas o tempo todo. Mas é só deixarmos um pouco a festa de lado para notar que diversidade, seja ela de gênero, sexualidade, raça, social ou corporal, não é somente sobre confete, congratulações e cartazes, mas também sobre cultura empresarial, política interna e visão estratégica.
Já passou o tempo em que ter uma equipe diversa era uma novidade ou algo “bonitinho” para o mercado ver. Em pesquisa recente da Nielsen/Toluna com a comunidade LGBTQIA+, 72% afirmam que só compram de marcas que se posicionam, enquanto 57% declaram não acreditarem nas boas intenções destes posicionamentos.
A mesma tendência se repete quando olhamos para pesquisas feitas com a geração Z: para a pesquisa “Truth About Generation Z” de 2021, 71% dos jovens afirmam estar dispostos a pagar mais a uma marca quando ela tem valores alinhados aos seus. Os números mostram que, mais do que preocupadas com o propósito das marcas, os novos consumidores querem ver mudanças reais, dentro e fora das empresas.
Neste novo cenário, cada vez mais sólido e que não dá sinais de retração, não adianta mais fazer campanhas pontuais para celebrar LGBTQIA+, mulheres, negros, pessoas com deficiência, se essas pessoas não estiverem, todos os dias, incluídas tanto na publicidade quanto no dia a dia da empresa. Pensando nisso, separei três dicas fundamentais que podem ajudar sua empresa a abraçar de forma definitiva o pilar da diversidade.
Dica 1: Olhe para dentro
Não adianta partir para programas de inclusão sem saber quais são os números internos, as equipes menos diversas, os pontos de atenção. Por isso, o passo mais básico para uma empresa diversa é ter um panorama realista da situação atual. Mapear em todos os níveis e funções, quantas e quais pessoas estão presentes. Com esse mapeamento, será possível responder perguntas como “quantas mulheres negras existem na empresa?” ou “quantas pessoas LGBTQIA+ estão em cargos de liderança?”. Somente a partir daí, podemos elencar os índices a serem melhorados e pensar programas focados nestes problemas.
Dica 2: Tenha equipes diversas inclusive na hora de debater o assunto
Não caia na armadilha de pensar diversidade a partir de equipes homogêneas. É claro que dados e estudos são importantes, mas não são suficientes. Se, por exemplo, sua empresa quer aumentar o número de pessoas negras nas equipes, mas ainda não tem pessoas negras o suficiente para criar grupos de trabalho equânimes, convide profissionais, criadores de conteúdo, consultores negros.
Criar espaço para que pessoas possam trazer contribuições a partir de suas vivências, não só sensibilizam quem não conhecia esta realidade como também resolvem os “pontos cegos” daqueles que não convivem com o preconceito diariamente. É o tal do “efeito Dunning-Kruger”… quanto menos conhecemos sobre um assunto, maior a tendência de acreditarmos saber o suficiente dele. Fuja dessa cilada.
Dica 3: Abrace o desconforto de falar sobre o assunto
A última dica parece saída de um livro de autoajuda, mas pode ser mais transformadora do que você imagina. Falar sobre diversidade – além do confete – é cultivar um espaço seguro em sua empresa para que pessoas possam trazer contribuições a partir de seus conhecimentos e vivências. É aqui que está o pote de ouro.
Equipes diversas acabam com aquela “narrativa única”, o ponto de vista hegemônico que busca enquadrar todas as pessoas em uma mesma perspectiva. Mais do que representatividade, pessoas diferentes trazem ideias diferentes das quais estamos acostumados, e isso pode sim gerar conflitos e desconfortos.
Neste ponto, é fundamental que se resista a tentar silenciar pessoas para esfriar os ânimos. Promova encontros e debates sempre que possível, traga profissionais que ajudem sua empresa a facilitar processos criativos, crie mecanismos para ouvir seus colaboradores e se certifique de que eles se sintam ouvidos. Faça do espaço seguro uma regra inquestionável do seu ambiente de trabalho. Sem isso, você terá uma empresa que, mesmo diversa, ainda segue o mesmo pensamento, ditado pelo medo.
Lidar com narrativas complexas, muitas vezes paradoxais, é uma das mais importantes habilidades que uma empresa pode cultivar em um período de constante mudança cultural. Pensar diversidade é também pensar o futuro. Precisamos ter a coragem de abandonar as diretrizes imutáveis e perfeitas em busca de um pensamento que abrace o conflito (saudável) de ideias e ideais. É na sutileza entre a ordem e o caos que mora o novo. Saber navegar entre estes extremos é preciso.
*Beta Boechat é publicitária da @FALA.agency e criadora de conteúdo no @betafala. Trans não-binária, é consultora das áreas de diversidade, gênero, LGBTQIA+ e body positivity.
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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