Servidores da Câmara e do Senado têm ficado descontentes com as pessoas que acessam seus salários, bancados com dinheiro público (Stock.XCHNG)
Da Redação
Publicado em 16 de outubro de 2012 às 19h39.
São Paulo – Você pode consultar sem dificuldades os salários de mais de 570 mil servidores do Executivo Federal, incluindo o da presidente da República. Você pode fazer o mesmo com os 11 ministros do STF e os servidores do Judiciário Federal. Tudo garantido pela Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor em maio deste ano. Mas se for fazer a mesma consulta aos vencimentos – pagos com dinheiro público, frise-se – dos servidores do Congresso Nacional, pode receber ameaças do próprio funcionário público cujo holerite você acabou de consultar. É o que vem ocorrendo nas últimas semanas.
Isso porque Senado e Câmara dos Deputados são os únicos órgãos que exigem que o pesquisador forneça nome, CPF, endereço com CEP e e-mail. O IP do computador também é identificado.
O que tem gerado atrito é que os servidores cujos salários são consultados recebem todos esses dados. No Senado, eles ficam disponíveis na própria intranet, junto com informações como o holerite e as férias do funcionário. Na Câmara, depende de pedido da pessoa.
A ONG Contas Abertas revelou na semana passada que Weslei Machado, servidor do Tribunal Superior Eleitoral, recebeu e-mail em que foi chamado de “bisbilhoteiro” por uma funcionária do Senado. Ele havia consultado o rendimento dela e de outros, aleatoriamente, para comparar com os vencimentos que ele e colegas recebem no TSE. Os e-mails trocados estão disponíveis no site da organização.
Para o economista do Contas Abertas, Gil Castelo Branco, o que o Senado faz é uma “pseudo” transparência. "O Senado está usando esta informação para repassar aos funcionários, criando um constrangimento, até porque eles (servidores) não foram devidamente conscientizados da importância da Lei de Acesso à Informação e estão encarando as consultas como algo pessoal, apenas com objetivo de bisbilhotice, quando na verdade é algo infinitamente mais amplo", defende Castelo Branco.
Um jornalista que trabalha no Contas Abertas também recebeu uma resposta nada contente de uma funcionária pública que teve os vencimentos consultados. “Estou te dizendo que eu vou investigar todas as pessoas que acessam o meu contracheque, para minha própria segurança”, afirmou a mulher, em leve tom de ameaça, conforme noticiou a Rede Globo.
Com os embates que vêm ocorrendo, a Procuradoria da República no DF abriu investigação depois de receber a reclamação de um cidadão na semana passada. Segundo esta pessoa, o Senado estaria inibindo o acesso aos contracheques. O caso está com o Procurador da República Felipe Fritz, mas ainda em fase inicial de apuração.
Apesar das reclamações sobre o possível risco à segurança dos servidores, não há até hoje evidência que a divulgação de salários tenha resultado em aumento de crimes dirigidos a funcionários públicos.
O Senado defende que, ao repassar as informações, apenas garante que os “pesquisados” tenham os mesmos direitos dos “pesquisadores”. Em entrevistas, o próprio ministro da Controladoria Geral da União, Jorge Hage, discordou da tese. Gil Castelo Branco, do Contas Abertas, também.
“Quando (um órgão pede informações) é apenas uma maneira de fornecer o contato do solicitante com quem vai dar a informação. O Senado e a Câmara estão sempre na contramão da transparência que a gente vê no mundo”, critica o economista, em referência direta aos Estados Unidos. A Casa Branca divulga o quanto cada trabalhador ganha nominalmente.
O atual modelo de divulgação dos salários foi definido por Senado e Câmara após um período de indefinição e reviravoltas. Primeiramente, as duas casas relutaram em publicar os dados. Mas diante da ação do Executivo e Judiciário, que saíram na frente, ambas decidiram que os salários seriam divulgados com o nome de pessoa no dia 31 de julho, o que não aconteceu devido a uma liminar obtida na justiça pelos sindicato dos servidores, proibindo a divulgação nominal.
Com isso, o Congresso passou a publicar tabelas sem identificar quem era quem. Foi com a derrubada da liminar que o Legislativo chegou ao formato atual, que até fornece o nome, mas obriga que o cidadão seja identificado e só permite a consulta a um servidor por vez.
Ou seja, para saber o salário de cada um dos 6.400 efetivos e comissionados do Senado, é preciso acessar o mesmo número de páginas na internet – e em todas, fornecendo antes as mesmas informações pessoais. A Casa, diferente da Câmara, não divulga informações sobre aposentados e pensionistas, o que também contraria o que vem sendo feito por outros órgãos.
Para quem quiser se “arriscar” a encontrar um funcionário nervoso, os salários, que estão entre os mais altos do funcionalismo público federal, podem ser consultados nos sites oficiais. A Câmara permite acesso aos vencimentos de cada servidor, por nome, depois do cidadão fornecer os dados pedidos. Já para a tabela geral, em formato csv e não nominal, a identificação do pesquisador não é exigida.
No Senado, tanto para remuneração individual quanto para a tabela geral é preciso informar nome, CPF e endereço.