Vacina contra a covid-19: clínicas privadas esperam mudança na lei. (AFP/AFP)
Gilson Garrett Jr
Publicado em 30 de março de 2022 às 15h49.
A possibilidade de qualquer pessoa comprar uma vacina contra a covid-19 no Brasil está mais próxima do que parece. Com a sobra de imunizantes por parte da indústria, o que falta no país, segundo as clínicas privadas, é o Ministério da Saúde revogar a lei de emergência pública da doença, o que pode acontecer no próximo mês.
Atualmente está em vigor no país uma legislação, aprovada em março do ano passado, que regula a compra de imunizantes contra a covid-19 por parte do mercado privado. A regra estabelece que a aquisição é permitida desde que as empresas doem, pelo menos, 50% ao Sistema Único de Saúde (SUS), o que na prática inviabiliza qualquer movimento no sentido de ter uma vacina privada.
Geraldo Barbosa, presidente da Associação Brasileira das Clínicas de Vacina (ABCVAC), explica que como a lei condiciona esta regra à situação de emergência pública, a mudança de status faz com que a lei caia por si só e abre caminho para as clínicas privadas.
"Estamos inviabilizados mesmo tendo oferta. Hoje não é mais um problema de insumo e sim de legislação. Talvez seria interessante participarmos do processo de aplicação da quarta dose, mas o governo tem um critério. Talvez o mercado privado pudesse ofertar para quem não quer esperar ou tem um risco aumentado. Poderíamos colaborar e ajudar”, diz.
Está em debate dentro do governo federal o rebaixamento da covid-19 de pandemia para endemia. O presidente Jair Bolsonaro (PL) chegou a dizer que emitiria um decreto na quinta-feira, 31, mas nesta quarta-feira, 30, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que não está na atribuição da pasta decretar o fim da pandemia, mas apenas acabar com o decreto de situação de emergência pública. O ministro afirmou que são necessários três pontos para tomar tal medida.
"Precisamos analisar o cenário epidemiológico que, felizmente, cada dia ruma para um controle maior, com queda de casos sustentada na última quinzena, queda de óbitos. A segunda condição é a estrutura do nosso sistema hospitalar, sobretudo das UTIs. O terceiro ponto é ter determinados medicamentos que podem ter ação eficaz no combate à covid-19 na sua fase inicial para impedir que essa doença evolua para a forma grave".
Caso este cenário se concretize, o mercado privado poderia disponibilizar um imunizante rapidamente. Segundo a empresa de análise Airfinity, mais de 9 bilhões de doses contra o coronavírus podem ser produzidas em 2022, mas a demanda pode cair para até 4,4 bilhões, por ano, em 2023.
Especialistas em saúde pública vêm falando que seria quase inviável uma vacinação em massa de uma segunda dose de reforço, que já é aplicada desde o ano passado em casos específicos, como idosos e pessoas com algum comprometimento do sistema imunológico.
A preocupação dos especialistas é que o país perca a alta taxa de vacinação já atingida - mais de 74% da população recebeu duas doses ou dose única. É sabido que, após seis meses, a capacidade das vacinas de proteger contra o coronavírus cai. Por isso, é importante a dose de reforço. De acordo com dados do Ministério da Saúde, 35% da população já recebeu esta terceira dose.
A partir da próxima segunda-feira, 4, o Ministério da Saúde começa a campanha de vacinação contra a gripe. Alguns estados e prefeituras já iniciaram a aplicação, como é o caso de São Paulo, onde é feita desde o último domingo, 27. E o mercado privado, que tradicionalmente inicia sua campanha antes da etapa pública, não conseguiu adiantar a entrega de imunizantes junto à indústria e ainda teme uma falta de vacinas.
Um dos principais problemas é a logística. Diferentemente da vacina comprada pelo Ministério da Saúde, que vem do Instituto Butantan em São Paulo, o mercado privado busca fora do país. A pandemia de covid-19 levou a uma redução dos voos comerciais em todo o mundo, e, com isso, há menos espaço disponível para o transporte nos porões dos aviões.
Além disso, as clínicas foram pegas de surpresa com a decisão do governo federal em retirar do grupo prioritário as crianças de 5 anos. A justificativa do Ministério da Saúde é que haverá uma campanha contra o sarampo ocorrendo simultaneamente com a da influenza e a aplicação ficaria facilitada.
Em 2021, as clínicas privadas aplicaram 8,5 milhões de doses, e esperavam ter disponíveis 10 milhões em 2022. Mas a projeção para este ano deve ficar em 8 milhões, se tudo ocorrer como o esperado.