Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro (iStockphoto/Getty Images)
Repórter especial de Macroeconomia
Publicado em 10 de outubro de 2023 às 12h00.
O Brasil registrou no ano passado 31,9 milhões de crianças e adolescentes em situação de pobreza multidimensional, segundo estudo divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unifec). Na prática, 60,3% dos meninos e meninas em 2022 viviam nessa situação. O dado representa uma pequena queda em relação ao último estudo da Unifec, de 2019, quando o percentual era de 62,9%.
O estudo afirma que são direitos que precisam ser garantidos de forma conjunta a cada menina e menino: estar na escola, aprender, ter acesso a moradia adequada, água e saneamento, ter acesso a uma renda compatível com suas necessidades básicas, ter acesso à informação e viver protegido contra violências.
Quando uma criança ou adolescente não tem acesso a um ou mais direitos, significa que vive na pobreza, em suas múltiplas dimensões.
“A pobreza na infância e adolescência vai além da renda, e precisa ser olhada em suas múltiplas dimensões. Estar fora da escola ou sem aprender, viver em moradias precárias, não ter acesso a renda, água e saneamento, não ter uma alimentação adequada e não ter acesso à informação são privações que fazem com que crianças e adolescentes estejam na pobreza multidimensional”, explica Santiago Varella, especialista em Políticas Sociais do Unicef no Brasil.
Mesmo com redução da pobreza multidimensional apresentada entre 2019 e 2022, no mesmo período, a proporção de crianças de 7 anos de idade que não sabem ler e escrever dobrou, passando de 20% para 40%.
“De todas as dimensões analisadas, a que mais piorou no país foi a alfabetização, chamando a atenção para a urgência de políticas públicas coordenadas em nível nacional, estadual e municipal para reverter esse quadro", diz Santiago Varella. "Importante destacar, também, a renda necessária para uma alimentação adequada – que foi impactada pela alta nos preços dos alimentos – e a questão do saneamento básico, que, embora apresente alguma melhora, continua sendo a privação que impacta mais meninas e meninos no país.”
A dimensão de renda diz respeito ao número de crianças e adolescentes vivendo abaixo do nível mínimo de recursos para satisfazer suas necessidades (R$ 541 mensais por pessoa em áreas urbanas e R$ 386 em áreas rurais, a preços médios de 2022).
Em 2019, essa privação afetava cerca de 40% do total de crianças e adolescentes de até 17 anos no país. Durante a pandemia, o índice variou – em parte por conta das políticas de auxílio emergencial –, apresentando uma melhora em 2022, em comparação a 2019. Em 2022, 36% estavam na pobreza monetária.
Além de a renda, o estudo analisa a renda necessária para prover os padrões de alimentação adequada a crianças e adolescentes. Diferentemente da renda como um todo, o percentual de crianças e adolescentes sem renda adequada para alimentação teve ligeira piora entre 2019 e 2022. Em 2019, eram 19% e, em 2022, são cerca de 20% das crianças e dos adolescentes com renda familiar abaixo do necessário para uma alimentação apropriada.
De acordo com o estudo, esse fenômeno foi atribuído principalmente ao aumento acentuado no preço dos alimentos, demonstrando que a inflação nessa área afetou mais severamente as famílias em situação de vulnerabilidade.
Embora seja observada uma leve redução, a privação de saneamento permanece sendo a que mais impacta crianças e adolescentes no Brasil. Em 2019, 39,5% das meninas e dos meninos brasileiros não tinham acesso adequado a banheiros e rede de esgoto, percentual que fica em 37% em 2022. Em relação ao acesso à água potável, 5,4% das crianças e dos adolescentes estavam privados desse direito em 2022.
A questão do acesso à moradia adequada continua a ser um desafio significativo que impacta diretamente a qualidade de vida de crianças e adolescentes. Os dados mais recentes revelam que o problema teve uma pequena redução, afetando 10,9% em 2019 e 9,4% em 2022.
O acesso à internet e à televisão foi um dos índices que ajudou a impulsionar a tendência de redução das privações entre crianças e adolescentes. Em 2019, 14% das meninas e dos meninos de 9 a 17 anos estavam privados do acesso à informação, dado que caiu para 6,1% em 2022.