Brasil

Eleições 2018: uma final Ciro x Alckmin?

Pela esquerda, Ciro Gomes desponta como o candidato substituto de Lula. Do outro lado, Alckmin, a seu modo, ainda tenta sair do chão

CIRO GOMES E GERALDO ALCKMIN:  desafios para crescer nas pesquisas de intenção de voto (Montagem/Site Exame)

CIRO GOMES E GERALDO ALCKMIN: desafios para crescer nas pesquisas de intenção de voto (Montagem/Site Exame)

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 10 de março de 2018 às 10h31.

“Sou candidato à Presidência da República” é uma frase candidata a ser uma das mais batidas do ano – e ainda há muito tempo pela frente. Até agora, 20 postulantes falaram a sério ter a intenção de disputar o cargo. Nesta semana, mais três nomes entraram oficialmente na disputa, não sem antes ter repetido o chavão à exaustão.

 O ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT) é um deles. Apresentado em convenção do partido na última quinta-feira, sua candidatura vem sendo martelada por integrantes do PDT desde o ano passado. Ciro foi ministro da Fazenda e da Integração Nacional, além de candidato à Presidência em outras duas ocasiões, 1998 e 2002. É o candidato que melhor pontua no campo mais à esquerda, excetuando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está virtualmente excluído da disputa pela Lei da Ficha Limpa, considerando sua condenação em segunda instância em um processo da Operação Lava Jato. Ciro tem 8,1% das intenções de voto no cenário sem Lula, segundo a pesquisa CNT/MDA, divulgada há poucos dias.

 Durante a semana, Ciro deu várias entrevistas para apresentar sua candidatura. Sempre foi perguntado sobre a frase que destruiu sua campanha em 2002, quando disse que “dormir comigo” era o papel de sua ex-esposa Patrícia Pillar em sua campanha. Ciro afirma estar mais maduro e cuidadoso, trunfo que a idade lhe trouxe. “Fiz uma piada de extremo mau gosto, com o amor da minha vida, uma pessoa pela qual tenho um respeito intelectual, além do amor extremo, e por isso me desculpei”, disse. “Como não podem dizer que eu sou ladrão, que eu sou incompetente, eu dei o queixo para bater.”

 Por fim, Ciro fez uma previsão: “O Bolsonaro está tamponando a evolução do candidato real, da direita ‘civilizada’ do Brasil, que é o Alckmin, e o Lula está tamponando a minha evolução. Na medida em que um ou outro não esteja no processo, eu e o Alckmin provavelmente dividiremos a disputa no segundo turno.”

No limite, Ciro tem alguma razão no otimismo. Dentre os nomes colocados, o seu é o que mais tem a ganhar nas intenções de voto com a saída de Lula do páreo. Marina Silva se aproveita substancialmente dos números, de 7,8% para 12,8% sem o petista, mas a estrutura partidária da Rede Sustentabilidade dificulta o crescimento. Pesa também o fato de Marina Silva ter apoiado Aécio Neves (PSDB) nas eleições de 2014, o que diminui a chance de um apoio direto do partido do ex-presidente. Mesmo com a perda de 60% de suas prefeituras em 2016, um indicado dentro do PT teria as maiores chances. Assim, a disputa pela esquerda deve ficar entre Ciro e Fernando Haddad (PT).

 O PT insiste publicamente na candidatura de Lula, mas Haddad atua como sua sombra. Outro plano petista, uma candidatura do ex-governador da Bahia Jaques Wagner, perdeu força depois de ele ter sido chamuscado pela Operação Cartão Vermelho, que investiga irregularidades e superfaturamento nas obras da Arena Fonte Nova, em Salvador. Essa operação colocou agentes da Polícia Federal cumprindo mandados de busca e apreensão no apartamento de Wagner. A propina recebida por ele seria de 82 milhões de reais, segundo as autoridades policiais.

 “O PT tem que ser considerado, Lula é uma grande liderança, mas temos esperança de unir todo mundo”, diz o presidente do PDT, Carlos Lupi. “Ainda é cedo para pensar em união em primeiro turno, mas já vi de tudo na política.”

 Nos bastidores de Brasília, comenta-se que a figura de Ciro gera desconforto para a formação de alianças com os demais partidos de esquerda. Para parlamentares consultados por EXAME, o estilo falastrão torna instável seu crescimento nas pesquisas e partidos médios só embarcam de vez em chapas com chance de vitória. O tempo de propaganda no rádio e TV ainda é fundamental para alavancar uma candidatura, mas líderes de partido temem que Ciro novamente “morra pela boca”.

 “Se souber de um candidato com alianças formadas, pode me contar. No momento, ninguém tem aliança com ninguém. É uma fase de lançar candidaturas, atrair votos e se colocar”, diz Lupi. “Essas questões vão ser decidas muito perto do prazo. Os partidos são pragmáticos no processo e querem ver os resultados de pesquisa para embarcar em um nome.”

 No radar de Ciro ainda estão partidos como o PSB e o PCdoB. O primeiro é um dos poucos que não exploraram uma candidatura própria ao Planalto. Há ainda uma particularidade: o PSB entrou em crise de identidade desde o início do governo Temer, quando parte dos líderes decidiram apoiar o governo, indo contra o que outros chamam de “bandeiras tradicionais” da legenda. O racha causou debandada, que deve se intensificar neste mês, com a janela partidária. A estratégia, então, é não ter candidatos a cargos majoritários para ter mais verba de campanha e aumentar a bancada na Câmara.

 O PCdoB, forte aliado do PT nos últimos ciclos, lançou a deputada estadual gaúcha Manuela D’Ávila. O programa, contudo, em nada se difere do PT. Fala em revogação da reforma trabalhista e engavetamento da Previdência, além de defender o mesmo discurso petista de que foi instaurado um “golpe” contra Dilma Rousseff. Ela considera que é necessária uma candidatura para marcar posição no campo progressista.  O PCdoB é o partido que dá mais sinais de ser favorável a uma união da esquerda. Mas há outros indicativos de que as alianças podem sair já no primeiro turno. “Estamos trabalhando na elaboração de programas de governo, para que sejam próximos. Há uma articulação entre as fundações de PT, PDT, PCdoB e PSB que trabalham um programa de governo comum”, afirma o ex-líder do PT na Câmara Carlos Zarattini (SP). “Há tantas candidaturas porque há divergências, mas as grandes linhas serão comuns.”

 A exceção, como sempre, deve ser o PSOL, mais uma legenda que lançou nomes nesta semana. O líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Guilherme Boulos, filiou-se ao PSOL e foi lançado pré-candidato. A legenda, porém, realiza um processo de prévias para a escolha de seu representante. Em debate de pré-candidatos na quinta-feira, Plínio Júnior — filho de Plínio de Arruda Sampaio — acusou Boulos de ser o candidato com “dedo de Lula”. O clima esquentou e expôs o racha interno em um partido que nasceu de divergência com o PT. A tendência é que o PSOL seja o único a navegar até o fim sozinho, mais uma vez. Desta vez, com uma fissura no próprio casco. Além de Boulos e Plínio Júnior, concorrem Nildo Ouriques, Sônia Guajajara e Hamilton Assis. O resultado sairia neste sábado, 10 de março, em evento em São Paulo, às 13 horas.

 Do outro lado

 Se os partidos mais à esquerda estão pulverizados, a direita não está melhor. Com uma rejeição acachapante, a candidatura do presidente Michel Temer (MDB) é quase fora de questão, segundo analistas. Governistas trabalham para elevar a aprovação do governo, hoje de 4,3%, segundo a mesma pesquisa CNT/MDA, para dois dígitos. A intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro está aí para ser uma tentativa de melhora nos números de violência, já que as propostas econômicas afundaram no Congresso — junto com uma melhora de imagem pelo caminho da economia.

 Mais um a “oficializar” o óbvio foi Jair Bolsonaro. Um evento na quarta-feira o consagrou como candidato e novo filiado do PSL. Com 20% das intenções de voto, pela CNT/MDA,no cenário sem Lula, Bolsonaro foi ovacionado por aliados na Câmara. Assim como ocorre com Ciro, a preocupação de Bolsonaro é juntar aliados. Nas últimas eleições, o PSL não tinha direito a nenhum tempo de TV por falta de representação na Câmara. Antes da janela partidária, iniciada nesta semana, o PSL tinha três deputados. Até o início de abril, estão liberadas as trocas nas legendas sem perda de mandato. A filiação de Bolsonaro tem também como estratégia trazer mais nomes para o PSL, para tentar fazer o partido ficar mais relevante.

 Também procurando desfrutar da mudança de partidos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se lançou candidato nos últimos dias, colocando-se como alternativa ao governador Geraldo Alckmin. “Nem o pai dele quer sua candidatura à Presidência”, diz um importante tucano sobre Maia. “É a candidatura do ‘se colar, colou’. É o ditado: jogo é jogado, lambari é pescado.”

 Para tucanos e analistas políticos consultados por EXAME, o poder de líder da Casa servirá para o DEM atrair deputados federais insatisfeitos em seus partidos, devolvendo alguma força ao partido. Como EXAME noticiou em fevereiro, Maia tem bom trânsito com líderes do centrão e usará a influência para “vender mais caro” o seu apoio nas próximas eleições. O DEM imagina que sua bancada passará de 33 para 42 deputados.

 Alckmin, por fim, joga parado desde o início. Quando seu pupilo e prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), ameaçou lhe passar a perna, ele aparentemente nada fez. A pecha de traidor pegou e o neófito na política desidratou. Ao ser pressionado pelo prefeito de Manaus, Arthur Virgílio (PSDB), a disputar prévias partidárias, Alckmin apenas aguardou que sua estrutura de aliados colocasse o adversário para escanteio. Agora, Alckmin desconversa sobre Maia, que busca seu lugar. “O DEM tem candidato, é indelicado fazer comentários”, disse o governador a EXAME.

 Alckmin está parado também nas pesquisas. Mesmo com o nome ventilado há tempo na disputa, ele não conseguiu chegar aos dois dígitos. Perguntado, faz piada. Em viagem à Brasília, foi questionado por repórteres sobre o desempenho. “Meu sonho é ser jornalista e cobrir uma campanha. Minha primeira pergunta seria: por que não decola?”

 Ainda que Rodrigo Maia esteja disposto a colocar o dedo na ferida tucana — leia-se o escândalo dos 2 milhões de reais requisitados por Aécio Neves ao empresário Joesley Batista, da JBS —, a aposta de cientistas políticos é que Alckmin vencerá a disputa na centro-direita pela capilaridade do PSDB. Eram 791 prefeituras nas mãos dos tucanos ante 265 com o Democratas, no momento da eleição de 2016. Nos rincões do Brasil, a mobilização local é fundamental para eleger um presidente.

“Com o prazo reduzido de campanha e a possibilidade de decidir quem será o candidato a poucos dias da votação, o número de indecisos deve permanecer quase imóvel até as campanhas começarem. Quando começar a campanha de TV, as linhas do gráfico do Datafolha voltarão a mudar”, afirma Wagner Parente, diretor da consultoria política Barral M Jorge. “Mesmo a influência de Lula deve ser constante. Enquanto o nome dele estiver nas pesquisas, não importam tanto as questões jurídicas. Só mudará mesmo quando ele indicar alguém.”

No fim, a voz de Lula deve dizer se a previsão de Ciro – de uma final entre ele próprio e Alckmin – está certa ou errada.

Acompanhe tudo sobre:Ciro GomesEleições 2018Exame HojeGeraldo Alckmin

Mais de Brasil

Acidente com ônibus escolar deixa 17 mortos em Alagoas

Dino determina que Prefeitura de SP cobre serviço funerário com valores de antes da privatização

Incêndio atinge trem da Linha 9-Esmeralda neste domingo; veja vídeo

Ações isoladas ganham gravidade em contexto de plano de golpe, afirma professor da USP