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Trabalho em supermercados passa por precarização

Com menos funcionários, trabalhadores exercem maior número de funções, sem tempo para convívio social


	Supermercado em São Paulo: em muitos casos, salário de empregados pode ser inferior ao mínimo
 (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

Supermercado em São Paulo: em muitos casos, salário de empregados pode ser inferior ao mínimo (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 8 de outubro de 2012 às 11h30.

São Paulo - O setor de supermercados vive uma precarização das condições de trabalho, revela pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. O progresso da automação comercial reduziu o número médio de funcionários. Com isso os trabalhadores passaram a exercer mais funções nas lojas, trabalhando praticamente todos os dias da semana, sem tempo para os estudos e o convívio social.

Mesmo com o faturamento crescente das empresas, em muitos casos a remuneração dos empregados pode ser inferior ao salário mínimo. O estudo foi realizado pelo geógrafo Herodes Beserra Cavalcanti, com orientação da professora Léa Francesconi, da FFLCH.

O geógrafo analisou os dados do ranking divulgado pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras), entre os anos de 1994 e 2010. Também realizou dez entrevistas com funcionários de uma grande rede supermercadista, que trabalhavam na zona sul da cidade de São Paulo, exercendo os cargos operacionais de operador de supermercado part-time (jornada de 18 horas semanais de trabalho) e full-time (8 horas diárias de trabalho).

As estatísticas da Abras mostram que o número de trabalhadores para cada 100 metros quadrados nos supermercados brasileiros caiu de 7,8 em 1994 para 5 em 2010. “Uma das razões da diminuição é a crescente automação comercial, especialmente a partir de 1994, quando terminou o período inflacionário considerado pelos empresários um entrave para a implantação dos leitores óticos de códigos de barras”, conta Cavalcanti. Na rede pesquisada, o faturamento por metro quadrado passou de R$ 8.771,00 em 1994 para R$ 17.508,83 em 2010.

O faturamento por funcionário era de R$ 111.069, 00 em 1994 e chegou a R$ 315. 284,82 em 2010. “No período houve também uma alteração dos cargos nos supermercados”, aponta o geógrafo. “Antes, o registro em carteira era feito com uma função delimitada, como operador de caixa ou repositor. Hoje, o funcionário pode ser registrado como operador de supermercado e exercer as mais diversas funções, inclusive auxiliar de perecíveis, de açougue e de padaria, além de recolher carrinhos e contribuír para a limpeza do estabelecimento”.


Trabalho

De acordo com Cavalcanti, a flexibilização da legislação trabalhista também aumentou o volume de trabalho, com a regulamentação do funcionamento dos supermercados nos domingos e feriados e do banco de horas. “Os funcionários trabalham praticamente a semana toda, e como levam muito tempo para se deslocar para o trabalho, têm mais estresse e dificuldade para poder estudar”, afirma.

“Essa rotina faz com que o setor tenha uma alta rotatividade. Em 2009, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), foram admitidos 49.192 empregados e aconteceram 44.151 demissões em São Paulo. O salário médio de quem sai é de R$ 837, 25, mas quem entra recebe em média R$ 712,00”.

A pesquisa mostra que os supermercados atraem trabalhadores jovens. Na rede pesquisada, por exemplo, não é exigida experiência prévia e os funcionários são admitidos por meio de uma prova de conhecimentos gerais, matemática e português básicos. “O operador part-time, embora trabalhe a metade do tempo, exerce as mesmas tarefas do full-time e não tem direito a vale-transporte”, ressalta o pesquisador. Em dezembro de 2010, a média salarial desses operadores em São Paulo era de R$ 213, 84 mensais, inferior ao salário mínimo, que na ocasião era de R$ 510,00.

O geógrafo observa que apesar das convenções coletivas de trabalho dispor sobre os dias de folga, há uma sutil pressão do empregador para que o funcionário esteja sempre à disposição da loja, seja mais flexível no trabalho e aumente a produtividade. “Pela Norma Regulamentadora 17, do Ministério do Trabalho, os patrões não podem estabelecer avaliações de desempenho para fins de remuneração ou bonificação, já que isso poderia aumentar os casos de Lesões por Esforço Repetitivo (LER) e Doenças Osteo-musculares Relacionadas ao Trabalho (DORT)”, aponta. “Outros aspectos da regulamentação, como a exigência de um empacotador para cada três caixas, não são cumpridos”.

Cavalcanti recomenda que as empresas levem em conta as necessidades efetivas dos funcionários. “Eles precisam de tempo para o convívio familiar e social, um ambiente de trabalho agradável e uma remuneração adequada. Com isso é possível aumentar a produtividade e reduzir a alta rotatividade no setor sem precarizar tanto o trabalho”, diz. “Os sindicatos dos comerciários devem fiscalizar efetivamente as regulamentações de trabalho e se engajar mais na cobrança da resolução de irregularidades”, recomenda.

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