Aécio Neves: "Não se pode considerar uma afronta ao MP as medidas para que a legislação seja cumprida" (Flickr/Senado/Reprodução)
Estadão Conteúdo
Publicado em 20 de novembro de 2016 às 10h51.
Última atualização em 20 de novembro de 2016 às 10h54.
Brasília - No momento em que Legislativo e Judiciário vivem momento de tensão por causa dos dispositivos usados pela Operação Lava Jato e do pacote de medidas anticorrupção, o senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB, defendeu em entrevista ao Estado os ajustes feitos pelo Congresso. A seguir, os trechos da conversa.
O que pensa da ideia, debatida na Câmara, de anistiar quem praticou caixa 2? Isso pode prejudicar a Lava Jato?
Temos de desmistificar isso, que tem sido uma tendência nos últimos meses, de que todas as ações que ocorrem no Poder Legislativo e que dizem respeito ao Judiciário e ao Ministério Público têm como objetivo limitar a Lava Jato. Isso não é verdade. Não se pode considerar que uma discordância do Ministério Público sobre uma determinada medida por si só significa uma afronta ao Judiciário. Desde o início eu achei que era um exagero aceitar prova ilícita obtida entre atos de boa-fé validando a determinado processo. Com isso, você dá margem a qualquer tipo de ação autoritária. Em relação especificamente ao caixa 2, eu defendo a criminalização. O equívoco lá atrás foi tentarem aprovar algo sem uma discussão mais ampla. Os casos passados vão acabar sendo diluídos pelos tribunais.
A anistia aos casos pretéritos de caixa 2 seria a salvação de muita gente...
Isso não chegou ainda na Câmara. Só quando conhecermos o texto é que veremos se houve excessos.
O Ministério Público fala em ofensiva contra a Lava Jato. Isso existe?
Não vejo a Lava Jato com essa fragilidade. Não se pode considerar uma afronta ao MP as medidas para que a legislação seja cumprida. Até mesmo essa questão que foi colocada, e depois retirada (de pacote de medidas anticorrupção da Câmara), de membros do MP responderem por crime de responsabilidade, não pode ser vista como afronta. Está aí a discussão do (salário) extrateto. Vi a declaração de um presidente de uma entidade de magistrados dizendo que acham uma afronta ao Judiciário. Meu Deus, não acho que seja uma afronta ao Judiciário, pelo contrário. Temos de legislar com autonomia e sem pressões.
O sr, que foi citado na delação do ex-senador Delcídio Amaral e é investigado por isso, é a favor do fim do foro privilegiado?
As citações feitas pelo senador Delcídio estão sendo investigadas e, estou certo, serão arquivadas por serem absurdas e sem o mínimo indício que possa comprová-las. O próprio senador em entrevistas reiterou que suas citações foram por ouvir dizer, o que, você há de convir, as tornam extremamente frágeis. Sobre a questão do foro, me lembro sempre de uma conversa que tive com o Itamar (Franco). Ele me contou que quando deixou a Presidência da República tinha mais de 1.000 processos contra ele espalhados pelo Brasil. Eram ações de toda ordem. Ele disse: ''Olha, se eu não tivesse o foro privilegiado e até mesmo a Advocacia da União, eu passaria a vida devendo advogados ou condenado por essas ações'. Vamos usar essa discussão para criar uma fórmula de, pelo menos, que os detentores de mandatos não fiquem expostos a centenas de processos, cuja razão é o exercício do mandato, e não uma fraude.
O ex-presidente da Andrade Gutierrez confirmou que teve um encontro com Oswaldo Borges para tratar de doação para campanha. Oswaldo foi citado, segundo a Folha S.Paulo, como intermediário de propina na construção da Cidade Administrativa. Ele foi tesoureiro informal da sua campanha?
Trata-se de uma citação sem o menor fundamento. A Cidade Administrativa talvez tenha sido no País a obra que teve a maior transparência na sua execução. O sr. Oswaldo Borges é um conhecido empresário mineiro que atuou formalmente na captação de recursos de várias campanhas do PSDB, inclusive na última campanha presidencial, o que é de conhecimento público e, como afirmou o próprio ex-presidente da Andrade, a relação se deu de forma absolutamente legal e sem qualquer contrapartida, como ele próprio disse.
Há abusos nas prisões provisórias, como ocorreu com Sérgio Cabral?
Não digo isso em relação à prisão do ex-governador Sérgio Cabral. Não conheço o caso. Mas temos de ter cuidado para que a prisão não seja a primeira etapa de um processo.
O presidente Temer disse que a prisão do Lula poderia causar instabilidade. Concorda com ele?
Não torço pela prisão do Lula, mas para que a Justiça seja feita. A prisão dele não me traria alegria, mas eu não preocuparia com as consequências.
Houve abuso na condução coercitiva do Lula?
Talvez pudessem ter obtido o mesmo resultado de outra forma. Mas não cabe a mim dizer se houve excesso. Não conheço as razões. Mas como de lá para cá não houve outras consequências, talvez pudessem ter chegado ao mesmo desfecho e obtido as mesmas informações sem a necessidade de uma condução daquela. Todos os instrumentos do MP devem ser usados com equilíbrio.
O financiamento empresarial de campanha foi extinto com o argumento de que seria a origem da corrupção. Defende a volta?
Como está, será impossível continuar. Acabamos com financiamento privado e não criamos o financiamento público. Vimos os Fundos Partidários, que deveriam ter outra destinação, usados para financiar candidatos. Eu defendo a manutenção do financiamento privado em limites mais rasos que os atuais. Quem doar para um partido, não pode doar para o adversário. Corrupção não é consequência direta de financiamento, mas questão de caráter.
O TSE pode cassar a chapa Dilma-Temer devido a uma ação do PSDB. Não é um constrangimento para o partido?
O PSDB fez o que devia fazer: denunciou aquilo que nos chegou como fraudes, que o TSE confirma que ocorreram. Agora não está mais na alçada do PSDB. Cabe ao tribunal delimitar a responsabilidade. Eu, pessoalmente, penso que a responsabilidade do presidente Temer não é a mesma da Dilma.
O que achou do movimento "Volta, FHC", lançado pelo Xico Graziano, que defende uma candidatura do ex-presidente ao Palácio do Planalto?
É uma bobagem, um desrespeito com o presidente. Isso vem de alguém que já teve com ele uma proximidade no passado e se utiliza disso para lançar tese sem o consultar. Isso o irritou profundamente.
O PSDB saiu fortalecido nacionalmente das eleições municipais, mas perdeu em Belo Horizonte. Isso enfraquece seu projeto nacional?
Tivemos a mais extraordinária vitória da história do PSDB. Elegemos 1/3 dos prefeitos das 90 maiores cidades brasileiras. Em Minas, tivemos ótimos resultado. Em BH, fomos para segundo turno e perdemos para alguém com discurso da negação política, que eu combato.
João Doria também se elegeu com a negação da política...
Em Belo Horizonte foi outra coisa. Doria é aliado do governador e pregou a necessidade das parcerias. Foi o oposto.
A vitória do Doria fortaleceu Alckmin como candidato à Presidência em 2018?
Ele seria uma liderança sólida da mesma forma se não tivesse vencido em São Paulo. A força dele (Alckmin) não está submetida a vitória ou derrota pontual em eleição.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.