Temer: "Essa votação é um jogo de expectativa", disse o diretor-executivo para Américas do Eurasia Group (REUTERS/Adriano Machado/Reuters)
Reuters
Publicado em 31 de julho de 2017 às 15h53.
São Paulo - Com um amplo consenso de que a base governista conseguirá afastar a primeira denúncia oferecida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer, a expectativa gira em torno do tamanho da vitória do peemedebista, o que ditará sob quais condições sua administração estará nas próximas semanas e meses.
O placar da votação será analisado com lupa por agentes políticos e econômicos, isso porque deve dar sinais claros sobre se Temer resiste a uma segunda --e possivelmente a uma terceira-- denúncia de Janot, e se o Palácio do Planalto será capaz de levar adiante sua agenda de reformas, ainda que mais modestas do que inicialmente planejado.
"Essa votação é um jogo de expectativa", disse o diretor-executivo para Américas do Eurasia Group, Christopher Garman. "Hoje achamos que o governo tende a sobressair na votação --se tiver a votação-- com uma certa folga. O tamanho da folga é muito importante", acrescentou.
A votação sobre se a Câmara dos Deputados autoriza ou não o Supremo Tribunal Federal (STF) a julgar a denúncia de corrupção passiva contra Temer está marcada para a quarta-feira e o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que só abrirá a votação com a presença de 342 deputados em plenário.
Para que a Câmara autorize o STF a julgar a denúncia contra Temer são necessários os votos de 342 dos 513 deputados, de modo que com 172 votos o presidente inviabiliza a autorização ao Supremo.
A oposição a Temer pretende estar presente na Câmara, mas registrar presença em plenário somente quando o quórum definido por Maia em plenário for atingido, o que gera o risco de a votação sequer acontecer.
Caso a votação ocorra, entretanto, Garman acredita que 230 a 250 deputados pró-Temer podem ser o suficiente para gerar a expectativa de que o presidente sobrevive até o final do mandato, dando fôlego ao governo, até mesmo para negociar reformas, como a da Previdência.
"É claro que existe o risco de novas acusações, uma nova dinâmica possa virar contra o presidente. Eu não diria que o risco concreto, real de ele cair vai-se embora com essa folga", ponderou.
"Se o presidente ganhar com uma margem muito estreita --entre 190 e 200 parlamentares que votam contra a denúncia ou não comparecem em plenário-- aí o cenário muda. A expectativa de derrota em uma segunda votação aumenta e aí temos um ambiente em que o presidente está sobrevivendo por um fio. Aí nada pode ser feito no Congresso até essa votação."
Para o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, um placar em torno de 300 deputados favoráveis a Temer, patamar próximo ao quórum necessário para mudanças constitucionais como as relacionadas à Previdência, é o melhor cenário possível para o Planalto e, se atingido, também poderia dar fôlego às reformas.
Os dois analistas, no entanto, concordam que as alterações previdenciárias, como foram aprovadas em uma comissão especial no primeiro semestre, tornaram-se inviáveis.
"A viabilidade da reforma da Previdência continua passando por uma mudança no conteúdo da matéria, diminuindo a ambição da proposta governista", disse Cortez.
Para Garman, a aprovação de uma reforma da Previdência "enxuta" é "factível". "Mas nós colocamos a possibilidade de isso acontecer em só ligeiramente acima de 50 por cento", disse.
Em tom mais cauteloso, o cientista político Carlos Melo, do Insper, avalia que um resultado pró-Temer com a maioria da Câmara --ou seja, 257 parlamentares-- é um "cenário extraordinário" para o Palácio do Planalto. Falar em fôlego para as reformas, entretanto, é um passo ainda distante.
"Depois da terceira (denúncia) é que a gente pode falar isso", disse. "É preciso ver qual a leitura que vai se fazer dessa primeira votação para depois se pensar nas demais."
Melo lembrou que ainda existe no horizonte a possibilidade de fatos novos prejudicarem Temer, como novos acordos de delação premiada e o conteúdo das novas denúncias de Janot. Esses desdobramentos ficaram em suspenso devido ao recesso parlamentar em julho.
"Tem gente achando que a crise terminou. É mais ou menos aquela situação daquela pessoa que no intervalo de Brasil x Alemanha na Copa de 2014 achou que estava tudo bem. Estava 5 x 0, mas é que naquele período parou de tomar gol", comparou, ao lembrar a eliminação brasileira diante dos alemães após derrota por 7 x 1 na semifinal da Copa, disputada em casa há três anos.
"O recesso é isso. É o período que você para de tomar gol. Quando o jogo começar novamente, ou os alemães tiram o pé, ou fazem mais dois, três, quatro, cinco", disse.
Além da denúncia por corrupção contra Temer, há expectativa de que Janot ainda acuse formalmente o presidente por obstrução de Justiça e participação em organização criminosa com base principalmente no acordo de delação premiada de executivos da holding J&F, que controla a JBS.
Caso a Câmara autorize o Supremo a julgar uma denúncia contra Temer e a corte acatar a acusação tornando o presidente réu, ele será afastado por até 180 dias e Maia assumirá a Presidência interinamente.
Se Temer for condenado, perde o mandato e uma eleição indireta será convocada em 30 dias para eleger presidente e vice até o fim do atual mandato, em dezembro de 2018.
O presidente nega ter cometido quaisquer irregularidades e afirma que a denúncia de Janot é inepta.