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STF debate se autoriza candidatos sem partido; o que está em jogo

Para apoiadores, proposta resolveria crise de representação no Brasil. Críticos veem o fortalecimento do personalismo e piora da democracia

URNA ELETRÔNICA: movimentos querem tirar o monopólio das eleições dos partidos políticos (Ueslei Marcelino/Reuters)

URNA ELETRÔNICA: movimentos querem tirar o monopólio das eleições dos partidos políticos (Ueslei Marcelino/Reuters)

Talita Abrantes

Talita Abrantes

Publicado em 4 de outubro de 2017 às 14h17.

Última atualização em 4 de outubro de 2017 às 14h22.

São Paulo – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deve analisar nesta quarta-feira (4) uma ação que questiona a validade da proibição de candidaturas de políticos que não sejam filiados a um partido.

A ação foi proposta pelo advogado Rodrigo Mezzomo, que teve o registro para candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro negado na Justiça Eleitoral sob a justificativa de que o artigo 14 da Constituição Federal proíbe candidaturas sem filiação partidária.

Mezzomo, que já foi filiado a siglas como PSDB e Novo, também levou o caso à Organização dos Estados Americanos (OEA). Ele alega que, ao barrar candidatos independentes, o Brasil viola o Pacto de São José da Costa Rica, assinado pelo país em 1969.

Segundo o texto da convenção, todo cidadão deve “ter acesso em condições de igualdade às funções públicas de seu país” — definição não seguida pelo Brasil, onde somente filiados a partidos podem concorrer a cargos eletivos.

Nesta semana, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, endossou esse argumento em manifestação sobre o caso. “Os partidos representados no Congresso Nacional abriram mão, validamente, da função de organizações intermediárias exclusivas entre governantes e governados, ao terem aprovado o Pacto de São José”, escreveu a procuradora-geral da República.

Crise de representação

Para além das questões de cunho jurídico, os apoiadores da proposta argumentam que a autorização de campanhas independentes é um passo necessário para o aprofundamento da democracia no Brasil – principalmente em um período de extrema desconfiança da população contra os partidos políticos.

“As candidaturas independentes nos livrariam dos políticos profissionais que estão montados e organizados nos partidos, que viraram organizações criminosas, segundo o Ministério Público”, diz o jurista e professor aposentado da Universidade de São Paulo Modesto Carvalhosa. O jurista pretende se candidatar à Presidência da República no ano que vem sem, contudo, se filiar a uma legenda.

De acordo com ele, tirar o monopólio das eleições dos partidos aproximaria os brasileiros da política e fomentaria a criação de novas agremiações da sociedade civil com interesses públicos, a exemplo do que aconteceu na França de Emmanuel Macron – que, a propósito, também é independente.

No entanto, como lembra a socióloga e professora da Fundação Getúlio Vargas Maria Rita Loureiro em artigo recente, tirar os partidos do jogo não é sinônimo de candidatos imunes à corrupção. Pelo contrário, segundo ela, isso poderia torná-los ainda mais vulneráveis a esse tipo de barganha por favorecer o personalismo na política.

“O cerne da questão não é substituir partidos por pessoas - ou mesmo instituições representativas por supostas práticas de democracia direta. Trata-se, sim, de refundar as legendas para que tenham futuro e contribuam com a imperiosa necessidade de aprofundar a democracia”, escreveu em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo.

Barreiras técnicas

Em estudo técnico divulgado na noite de ontem, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pondera que todo sistema eleitoral brasileiro está fundado na obrigatoriedade de que as candidaturas sejam vinculadas a partidos.

A corte lembra que nas eleições proporcionais (que determinam, por exemplo, o preenchimento das cadeiras na Câmara dos Deputados), as vagas são distribuídas aos partidos e não aos candidatos. Da mesma forma, o tempo de propaganda na TV e no rádio é calculado com base na representação de cada legenda na Câmara dos Deputados.

Aprovar candidaturas independentes agora, segundo o TSE, “comprometeria totalmente a segurança da eleição brasileira” e aumentaria os custos do pleito de 2018.

Além disso, diz o órgão, 80% dos programas que serão usados nas urnas eletrônicas na eleição do ano que vem já estão sendo testados. “Qualquer alteração demandaria o desenvolvimento de novo software para as urnas eletrônicas, o que também comprometeria a segurança do processo de votação e da totalização dos votos, sem falar no retrabalho e no imenso aumento de custos”, diz o estudo.

De qualquer maneira, a proposta que está na pauta de hoje do Supremo Tribunal Federal (STF) tem apoio de agremiações tão diversas quanto o Movimento Brasil Livre (MBL), a União Nacional dos Juízes Federais e o partido de Marina Silva, Rede Solidariedade.

A ideia conta ainda com o suporte de que a maior parte das democracias do mundo aceita candidatos independentes e com o fato de que o Brasil figura em último no ranking  global de confiança da população em políticos.

O assunto é o segundo na pauta desta quarta no STF. Dada a repercussão e complexidade do caso, é provável que os ministros não cheguem a um veredicto hoje. Mas o debate dessa e de outras soluções para a crise de representação do país não deve parar nessa ação.

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