Brumadinho: até agora, há 65 mortos e quase 300 desaparecidos (Washington Alves/Reuters)
Reuters
Publicado em 30 de janeiro de 2019 às 10h58.
Última atualização em 30 de janeiro de 2019 às 11h07.
Brumadinho — Para Marco Antonio Ribeiro da Silva, técnico em manutenção da mineradora Vale, Deus assumiu a forma de uma caminhonete Toyota Hilux na tarde da última sexta-feira.
Líderes do sindicato de mineiros da cidade de Brumadinho, em Minas Gerais, onde uma barragem de rejeitos se rompeu na sexta-feira, podendo ter soterrado mais de 300 pessoas, descreveram o pai de dois filhos profundamente devoto como um dos sobreviventes mais improváveis do desastre.
Ele é um dos poucos funcionários da Vale que escaparam dos arredores de um refeitório da empresa, que estava lotado quando a barragem estourou na hora do almoço, desencadeando uma onda de lama com rejeitos de mineração que arrasou a instalação.
Em uma entrevista de 45 minutos concedida na terça-feira, Ribeiro, que ficou com cicatrizes nas pernas, em um braço e na omoplata após o acidente, logo atribuiu sua sobrevivência à sua fé cristã, mas até os menos devotos consideram sua história milagrosa.
"No momento em que o desastre aconteceu, estava bem na frente do restaurante", contou Ribeiro. "Primeiro eu vi água. E depois vi aquela montanha de dois andares e meio de altura desabando sobre nós."
Ribeiro estava sentado em um quiosque diante da entrada do refeitório, cumprimentando colegas que chegavam. Ele calcula que ninguém que tenha entrado conseguiu sair.
A onda de água inicial parecia o oceano, disse, e a parede de sedimentos que veio em seguida rugia "como uma detonação que nunca termina".
Ribeiro correu colina abaixo ao lado dos colegas, abrindo caminho rumo à lateral do que se tornaria um rio de lama. Ele chegou a cair enquanto ganhava velocidade, erguer-se e cair de novo.
Na segunda queda ele teve certeza de que era o fim.
"Eu já me dava como morto. Disse 'misericórdia, misericórdia, misericórdia' e gritei 'Jesus, Jesus, Jesus.' E foi quando ouvi 'corra para a caminhonete!'."
Uma caminhonete Toyota com cerca de uma dúzia de colegas apareceu a alguns metros de distância. Ele disse que durante um instante o rio de lama pareceu desacelerar enquanto se chocava com várias edificações.
Levantando-se, ele foi o último a chegar ao veículo, agarrando-se aos colegas enquanto a caminhonete acelerava pela encosta e fugia do perigo.
Ribeiro diz não guardar rancor da Vale, alegando que, pelo que sabe, a empresa sempre priorizou a segurança de seus empregados, mas alertou: "Não existe barragem segura."