Bolsonaro: presidente assinou decreto na última terça-feira (Adriano Machado/Reuters)
Clara Cerioni
Publicado em 10 de maio de 2019 às 12h47.
Última atualização em 10 de maio de 2019 às 13h07.
São Paulo — Consultores do Senado indicaram em parecer que o decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro nesta semana, que amplia o porte de armas, "extrapolou os limites legais" ao desrespeitar o Estatuto do Desarmamento.
A pedido dos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Fabiano Contarato (Rede-ES) técnicos do Senado emitiram a nota técnica nesta sexta-feira (10). O documento, obtido por EXAME, é assinado pelos consultores Daniel Osti Coscrato e Jayme Benjamin Sampaio Santiago.
O decreto facilita porte de arma para 20 categorias, entre elas políticos, caminhoneiros e moradores de área rural – estimativas de ONGs apontam para até 19,1 milhões de beneficiados. Ao assinar o decreto, o presidente Jair Bolsonaro disse que estava indo "no limite da lei".
De acordo com o parecer, que tem doze páginas, o texto distorce completamente o Estatuto do Desarmamento, que é uma lei federal (Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003).
"Como o próprio nome dado ao diploma legal diz, o objetivo do Estatuto foi o de desarmar a população, vedando o porte de arma de fogo em todo o território nacional. Por exceção, foram elencadas, de forma estrita, algumas categorias, pessoas ou entidades que poderiam obter o porte de arma de fogo", afirmaram os técnicos.
Em outro trecho, os consultores dizem que o Estatuto menciona apenas os “agentes operacionais do sistema penitenciário” a ter o porte e não todo e qualquer funcionário do referido órgão como estabeleceu o decreto. “Vê-se então, claramente, que o decreto é, nesses pontos, exorbitante, ampliando os servidores habilitados a portar arma naqueles órgãos”, dizem.
Especialistas ouvidos por EXAME já haviam apontado o fato de o governo modificar, via decreto, uma lei federal, atitude que só poderia ser tomada pelo Congresso. “A Constituição prevê que mudanças significativas em uma lei federal só pode ser feita por outra lei federal”, afirma João Paulo Martinelli, advogado criminalista e professor da Escola de Direito do Brasil (EDB).
Para os técnicos, o decreto também extrapolou o poder ao conceder o porte de arma de fogo geral e irrestrito aos colecionadores e caçadores, presumindo que eles cumprem o requisito de “efetiva necessidade”.
Outra crítica envolve o fato de o decreto não exigir do residente rural o requisito de idade superior a 25 anos, assim como a comprovação, na prática, de que realmente precisa de arma.
A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber deu um prazo de cinco dias para que Bolsonaro explique o decreto. A decisão da ministra foi publicada nesta sexta-feira (10).
Relatora de uma ação da Rede, que questiona a legalidade do decreto assinado pelo governo, a magistrada estendeu a solicitação para que o Ministério da Justiça, também justifique o ato.
A Advocacia-Geral da União (AGU), a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Senado Federal e a Câmara dos Deputados podem se pronunciar também.
A expectativa é que a ministra aguarde os pronunciamento antes de suspender ou não o decreto de forma liminar.
Em entrevista nesta quinta-feira (9), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que conversou com o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para tentar “reorganizar” o decreto.
O parlamentar afirmou ter encontrado “inconstitucionalidades”, mas não deu maiores detalhes.