BRT: ônibus pode ser opção do governo de SP para o monotrilho no ABC (Rodrigo Bethlem/Wikimedia Commons)
Estadão Conteúdo
Publicado em 9 de maio de 2019 às 11h25.
São Paulo — O impasse em torno do empreendimento da linha 18-Bronze, que ligará o ABC à capital paulista, atingiu ponto crítico dentro do governo de São Paulo. Ainda que não tenha batido o martelo, já há internamente percepção de que a construção do monotrilho licitado em 2014 não é viável e deve ser substituída por um BRT, segundo apurou o Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
A decisão implicaria em uma quebra de contrato com a concessionária Vem ABC, que argumenta já ter gasto aos menos dois terços dos R$ 38 milhões aportados inicialmente para constituir a empresa. O rompimento, no entanto, preocupa algumas áreas do governo pela potencial insegurança jurídica sobre o pacote de licitações prometido para os próximos anos.
O contrato firmado com a concessionária Vem ABC em 2014 previa uma Parceria Público Privada (PPP) para a construção de um monotrilho. Como o projeto foi licitado no regime de concessão patrocinada, caberia ao Estado arcar com metade do montante de Capex, além dos custos para desapropriação dos moradores no entorno do projeto, de R$ 600 milhões.
Quase cinco anos depois, o empreendimento ainda não saiu do papel: o contrato de 25 anos, embora esteja em vigor, não tem eficácia. Segundo a Vem ABC, os preparativos emperraram na estruturação do financiamento da parte pública, uma vez que o Estado perdeu, por um tempo, o rating necessário para captar recursos externos.
O quinto e último aditivo perdeu validade em novembro de 2018 e, desde então, o consórcio tenta negociar novo termo com o governo. Com o atraso, o investimento total previsto no contrato, de R$ 4,2 bilhões, já estaria 25% maior com as correções, segundo a empresa.
O Estado de São Paulo alega não ter os recursos para o projeto, sobretudo para as desapropriações, que demandariam aporte imediato. Uma fonte do governo aponta ainda que há um entendimento interno de que os planos foram superdimensionados na concepção do projeto: "Nunca houve viabilidade para um monotrilho em termos de transporte de passageiros por dia. Para compensar, teriam que rodar 350 mil passageiros/dia. Hoje a estimativa é de 220 mil. O BRT mais do que suficientemente atende a demanda a um custo bem inferior", disse essa fonte.
O diretor-presidente do consórcio, Maciel Paiva, afirma que não trabalha com o cenário de quebra de contrato e reclama que a empresa não tem sido oficialmente notificada sobre as movimentações do governo. Ele pondera, no entanto, que o objeto do contrato é claro e também diz que não há brecha para que a Vem ABC seja autorizada a construir o plano B do governo. "O objeto do contrato é muito claro. E isso nunca passaria na Procuradoria Geral do Estado", disse, em entrevista ao Broadcast.
Paiva relata que a concessionária já gastou dois terços dos R$ 38 milhões aportados em 2014 para capitalizar a Sociedade de Propósito Específico (SPE) constituída para o projeto. Os recursos foram investidos para adiantar documentações e estudos que só seriam feitos após o início efetivo do empreendimento. Por isso, teria condições de começar as obras três meses após o aval do governo e estima que poderia reduzir o prazo de implantação do monotrilho de 4 para 3,5 anos.
O executivo observa ainda que todo esse atraso gerou uma "tremenda perda de oportunidade" aos sócios da Vem ABC. "Se tivéssemos começado no início de 2015, estaríamos terminando agora (a implantação), estaríamos operando. O governo está fazendo várias licitações de concessões e PPPs em São Paulo e no Brasil, seríamos um grande player para operar e ganhar escala", diz.
O governo minimiza um possível processo judicial caso decida seguir com outro projeto. "Nós vamos brigar pela rescisão contratual ou para por R$ 3 bilhões numa obra sem viabilidade?", apontou uma fonte. Para os técnicos do Estado, a possibilidade de o caso parar na Justiça é diminuída pelo fato de que a fornecedora de material rodante no consórcio, a empresa Scomi, da Malásia, desistiu de produzir os trens alegando problemas financeiros, o que também abala o contrato por parte da Vem ABC.
Questionado sobre a situação envolvendo sua fornecedora, o consórcio informou que conversa com a Scomi para um distrato amigável.