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Sem home office, periferia se expõe mais ao coronavírus no transporte público

A pandemia trouxe o temor do contágio a esse cenário já exaustivo, em que a ventilação é insuficiente, o tempo de exposição alto e o distanciamento social impossível de praticar

Embora o isolamento social tenha reduzido em toda a São Paulo nos últimos meses, a distribuição é desigual (Roberto Parizotti/Fotos Públicas)

Embora o isolamento social tenha reduzido em toda a São Paulo nos últimos meses, a distribuição é desigual (Roberto Parizotti/Fotos Públicas)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 7 de fevereiro de 2021 às 19h55.

Última atualização em 8 de fevereiro de 2021 às 21h11.

Antes também não era fácil. Chegava-se no trabalho cansado do trajeto longo e apertado durante uma, duas, até três horas. A pandemia trouxe o temor do contágio a esse cenário já exaustivo, em que a ventilação é insuficiente, o tempo de exposição alto e o distanciamento social impossível de praticar. O paulistano que mora na periferia pouco teve a possibilidade de aderir ao “fique em casa” e, majoritariamente dependente do transporte coletivo, enfrenta dificuldades para escapar da transmissão do coronavírus.

Embora o isolamento social tenha reduzido em toda a São Paulo nos últimos meses, a distribuição é desigual. No caso de usuários de ônibus, por exemplo, um levantamento do laboratório de visualização urbana MedidaSP, com dados de todo 2020, mostra que linhas das zonas leste e sul estão com um número de passageiros próximo ao pré-pandemia, diferentemente da zona oeste. Em uma linha que vai do distrito da Pedreira até a Estação Jurubatuba, da CPTM, na zona sul, a quantidade de passageiros até superou a do período anterior à pandemia. Por outro lado, um coletivo que sai da Aclimação, no centro, até Perdizes, zona oeste, está atendendo 30,6% da demanda usual.

O urbanista Bernardo Loureiro, criador do MedidaSP, lembra que o isolamento de passageiros de ônibus chegou a quase 70% no início da quarentena, mas ficou em 26% em dezembro, puxada para baixo especialmente pela periferia. Isso se torna um fator de maior destaque porque o transporte coletivo segue com redução de veículos em circulação (cerca de 88% do total em dia útil). “Se está mais ou menos a mesma quantidade de pessoas do que era antes da pandemia e a frota está menor, então vai estar mais lotado.”

É o que relata o assistente financeiro Igor Esteves de Jesus, de 28 anos, que pega ônibus, trem e metrô para ir de São Miguel Paulista, na zona leste, até o trabalho, na Avenida Faria Lima, zona oeste. “Parece que o coronavírus só não existe para quem está de home office ou tem muito dinheiro.”

Para ele, a situação é revoltante, tanto que postou imagens nas redes sociais de um vagão de trem em que os passageiros ficavam comprimidos. “O espaço em que caberia uma pessoa vai cinco. Em Itaquera, tem de entrar empurrando, não tem como se mover. Eu me sinto bem impotente, não acho justo. Não tive covid por sorte.”

Uma pesquisa de setembro da Rede Nossa São Paulo com Ibope Inteligência mostra que a população com mais de 16 anos gasta 1h56 no transporte coletivo. Por outro lado, 35% não estão se deslocando para trabalhar, 52% com rendas de mais de 5 salários mínimos.

No caso da analista contábil Mariza Santos, de 32 anos, são 2h30 do distrito de Parelheiros, no extremo sul, até as imediações do Aeroporto de Congonhas. Como “qualquer horário é horário de pico”, passa álcool em gel o tempo todo. “Chego ao trabalho e já vou lavar as mãos e trocar de máscara.”

Riscos. Pós-doutoranda em Ciências Atmosféricas na USP, Milena Ponczek defende que os passageiros estejam em assentos intercalados e haja troca de ar. E ressalta: “não importa ter ‘recirculação’ de ar, janela aberta, se estiver superlotado”. Esse cenário propício à transmissão piora com o consumo de bebidas e alimento, conversas e outras ações que criam o espalhamento de aerossóis.

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