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Revolta no Twitter e reajustes salariais: Temer, o “pato manco”

Pato manco é a expressão em inglês para designar políticos em fim de mandato. Mas poucos chegam à reta final combinando perda de poder com impopularidade

Presidente Michel Temer (Andre Coelho/Getty Images)

Presidente Michel Temer (Andre Coelho/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 10 de setembro de 2018 às 17h27.

Última atualização em 10 de setembro de 2018 às 17h51.

Enquanto as atenções se voltam para o futuro presidente do Brasil, o atual presidente, Michel Temer, tenta recuperar um pouco do protagonismo. Nesta segunda-feira, Temer celebrou, em Brasília, a criação da Medida Provisória que cria a Agência Brasileira de Museus. A medida, que tem como objetivo estimular doações privadas para projetos culturais de interesse público, tenta reverter os estragos do incêndio que destruiu o Museu Nacional, há uma semana.

É mais um tapa buraco em um governo que chega a um final melancólico com altas taxas de rejeição e sem nenhum candidato disposto a defender seu legado. Henrique Meirelles, o candidato do PMDB, vem sendo cobrado por Temer para falar de suas ações, como a reforma trabalhista e o teto de gastos. Meirelles se esquiva como pode.

Temer subiu o tom na semana passada, quando atacou Geraldo Alckmin, do PSDB. Com o início das propagandas eleitorais na televisão e nas rádios, a coligação que apoia Alckmin passou a acusar e condenar algumas medidas do governo Temer. Antes das propagandas, Alckmin também negou apoio ao reprovado governo de Temer, alegando que ele sequer “gostava dele”.

Na quinta-feira passada (6), o presidente divulgou, em seu Twitter, vídeos direcionados ao candidato Alckmin, afirmando que o PSDB tinha apoiado seu governo. Na gravação, Temer afirma que os ministérios criticados por Alckmin – como Saúde, Educação e Indústria e Comércio – eram justamente comandados por membros de partidos que fazem parte da coligação de sua candidatura (Mendonça Filho (Educação), do DEM, Ricardo Barros (Saúde), do PP, Marcos Pereira (Indústria e Comércio), do PRB, além do PTB, que dirigiu a pasta do Trabalho.).

O segundo vídeo tinha como objetivo “relembrar” as nomeações dos ex-ministros tucanos José Serra (Relações Exteriores) e Bruno Araújo (Cidades). Quando eles tomaram posse Temer afirmou que “trouxe o PSDB para o Palácio do Planalto” quando aumentou a participação tucana com a nomeação do deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA) para chefiar a articulação política do governo em 2017.

“O PSDB, Geraldo, apoiou o meu governo. Não faça como aqueles que falseiam e que mentem para conseguir votos influenciado pelo marqueteiro. Conte exatamente a verdade”, concluiu o presidente. Embora os vídeos tenham sido ataques diretos ao tucano, espera-se que Temer realize novas declarações condenando outros candidatos. Segundo a revista VEJA, o PT também está na mira do presidente.

Segundo pesquisa Datafolha divulgada no fim de agosto, o governo Temer foi considerado ruim ou péssimo por 73% da população. Para o colunista de EXAME e professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais do Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Sérgio Praça, a publicação dos vídeos tem mais caráter de “retaliação pessoal” do que de uma tentativa de influenciar na eleição. “Os vídeos até atrapalham um pouco o Alckmin, uma vez que ele está tentando se descolar, e o temer afirma que o PSDB colaborou com o governo dele. Mas fica restrito a uma parcela muito pequena da população”, afirma.

A rejeição pode ser explicada pela inconstância nas decisões, ou tomada de decisões pouco populares. O último e emblemático exemplo foi a aprovação do reajuste salarial para funcionários do Judiciário, no fim do mês.

Em menos de 48 horas, Temer aprovou o reajuste do salário de servidores do poder Judiciário e do poder Executivo, e voltou atrás, adiando o aumento dos servidores do Executivo para 2020.

A medida provisória (MP  849/2018) foi publicada há uma semana, e adia o reajuste do servidor do poder Executivo para 2020. A decisão, segundo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, ocorreu após uma análise mais aprofundada de analistas do governo mostrarem que, com a autorização do reajuste, as contas não fechariam.

A suspensão do reajuste, decisão tomada no início deste ano, foi de encontro ao apelo dos economistas do governo, que afirmavam que a economia do adiamento seria de 6,9 bilhões de reais. No entanto, o Supremo Tribunal Federal foi contrário à medida, e aprovou, no início do mês, o reajuste salarial.

A autorização de Temer ocorreu após um acordo entre poder Judiciário e Executivo. De um lado, o alto escalão de juízes abriria mão de seus auxílios-moradias – num valor médio de 4.700 reais – e de outro o Planalto incluiria no Orçamento de 2019 um reajuste de 16,38% nos salários dos magistrados. Cálculos mostraram que o reajuste, que estava previsto para 2020, teriam um impacto no orçamento do próximo governo. Segundo cálculo de consultoria ouvida pelo jornal o Estado de S. Paulo, o fim do auxílio-moradia permitiria a economia de pouco mais de 530 milhões de reais, enquanto o impacto do reajuste seria de 970 milhões de reais (considerando os aumentos no Judiciário e no Ministério Público).

Além disso, com a aprovação, o teto do funcionalismo público seria modificado (de 33.700 reais para 39.000 reais), podendo facilitar um efeito cascata na solicitação de reajustes de outros setores do funcionalismo público. Sem o reajuste, a equipe técnica afirmou que conseguirá cumprir o teto dos gastos públicos e a meta fiscal do ano que vem, que prevê um déficit de 139 bilhões de reais.

Outras decisões tomadas pelo presidente Michel Temer também deixaram o orçamento do país ainda mais apertado. A greve dos caminhoneiros, que paralisou o país no mês de maio, fez com que o governo aceitasse uma série de condições impostas pelo grupo, e tenta, até hoje, balancear os gastos do evento.

Embora a decisão e o reajuste façam parte de uma discussão mais complexa (sobre o funcionalismo público, a questão inflacionária e a própria situação econômica do país), a instabilidade nas decisões do governo federal mostra a vulnerabilidade do orçamento público, e as possíveis consequências que podem respingar na própria população.

As decisões tomadas pelo presidente são um retrato de um governo enfraquecido, e extremamente vulnerável. O ponto de virada de um “governo das reformas” para um governo enfraquecido foi o vazamento das gravações de conversas no telefone entre Joesley Batista (investigado na Lava Jato) e Temer. “Com a delação, o prometido ‘governo das reformas’ se tornou um governo fraco, sem legitimidade nenhuma. E isso o tornou vulnerável a certos grupos”, afirma Sérgio Praça.

“O problema é que quem paga acaba sendo sempre a população. É lamentável, mas tem sido comum na política o fato de políticos se tornarem vulneráveis e aprovarem medidas mais onerosas”, pontua o cientista político.

Vulnerabilidade

Há um conceito surgido no mercado financeiro, no século 18, e utilizado até hoje para tratar políticos ou tomadores de decisões em fim de mandato. São os “lame-ducks” (pato manco, em tradução livre), os governantes com menos influência, menos poder, e, portanto, com mais liberdade para tomar decisões pouco populares. Nos Estados Unidos, o mês de novembro pós-eleições para presidente é conhecido como o período mais intenso do presidente manco, uma vez que as atenções já não estão voltadas para as ações do atual presidente, mas sim do que vai assumir o cargo. Em 2017, pouco tempo após deixar o cargo, Barack Obama se auto denominou “lame duck”, justificando que “ninguém mais estava seguindo suas ordens”.

Em Brasília, o período final do mandato é conhecido como aquele em que os presidentes passam a tomar café frio até no Planalto, já que todas as atenções estão voltadas ao próximo inquilino.

O que faz de Temer um caso sui generis é a combinação de perda de poder com uma impopularidade acachapante.  Lucas de Aragão, cientista político, sócio-diretor da consultoria Arko Advice e colunista de EXAME, ressalta que essa combinação faz de Temer incapaz até de apresentar um candidato viável.

A mais recente pesquisa eleitoral, divulgada nesta segunda-feira (10) pelo banco BTG Pactual, comprova: Henrique Meirelles, do MDB, tem menos de 1% das intenções de voto. “Temer está numa situação esquisita, porque normalmente presidente em fim de mandato ainda mantém uma certa influência, uma vez que quase sempre o candidato governista está em situação de viabilidade eleitoral”, explica Aragão. “No caso de Temer, não. Então ele fica isolado, sem muitas cartas na manga para negociar, e acaba sofrendo pressão de todos os lados”.

Para o colunista Sérgio Praça, os financiamentos do BNDES (aprovados durante o governo Lula, entre 2011 e 2014), e a realização da Copa do Mundo (2014) e dos Jogos Olímpicos (em 2016, no Rio de Janeiro) são uma prova de que não há momento certo nem governo certo para tomar decisões irresponsável com o longo prazo.

Mesmo que não haja violação da Lei de Responsabilidade Fiscal ou na Lei de Diretrizes Orçamentárias, a decisão sobre como gastar o dinheiro público passa pela discussão não só do que é correto, mas também do que é moralmente aceitável. Temer tem pouco mais de 100 dias de mandato. Vem muito café frio pela frente.

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