Aeroporto de Viracopos, em Campinas: aeroportos que poderiam sofrer o máximo da revisão das regras a médio prazo são Guarulhos e Viracopos, ambos localizados de São Paulo (Alexandre Battibugli/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 27 de janeiro de 2014 às 17h53.
Brasília/São Paulo - Os planos do governo para revisar as regras de autorização de novos aeroportos privados no Brasil podem servir como um sinal de cautela mais amplo para os investidores em concessões de infraestrutura, afirmaram analistas e executivos da indústria.
As questões sobre a confiança nas regras ocorrem enquanto o governo tenta viabilizar plano de mais de 100 bilhões de dólares em projetos rodoviários, portuários e ferroviários. Os planos anunciados em 2011 visam acrescentar ímpeto a uma economia que tem enfrentado dificuldades para crescer ao longo dos últimos três anos.
Um dos primeiros sucessos do plano foram os leilões de concessão dos cinco maiores aeroportos do país, que arrecadaram quase 20 bilhões de dólares. Os vencedores, grupos nacionais e estrangeiros, se comprometeram com investimento inicial de mais de 10 bilhões de dólares.
Mas os concessionários podem agora enfrentar uma concorrência inesperada devido a uma proposta de mudança de regra, levantando especulações sobre batalhas judiciais potenciais e revisões contratuais.
Especificamente, o ministro da secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco, disse à Reuters no início deste mês que o governo estuda mudar os regulamentos que impedem a construção, via autorização, de aeroportos privados para voos comerciais de passageiros.
A mudança permitiria que as empresas construam novos aeroportos comerciais do zero. Isso poderia, ao longo do tempo, ajudar a reduzir a grave superlotação nos aeroportos existentes no Brasil, que não têm sido capazes de dar conta da duplicação do tráfego de passageiros durante a última década.
Mas a mudança também representa um desafio inesperado e indesejável para empresas que ficaram com as concessões dos aeroportos em São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Rio de Janeiro.
O governo nunca garantiu às concessionárias que não teriam de enfrentar novos concorrentes, de acordo com o contrato de concessão e um funcionário do governo próximo de conversas com os licitantes.
No entanto, as empresas fizeram suas projeções de rentabilidade e de passageiros com base na legislação atual, que eles não acreditavam que iria mudar.
"Isso é preocupante para os investidores e pode acabar em batalhas judiciais", disse Francisco Lyra , consultor da CFly Aviation e ex-chefe da associação de aviação geral do país.
O governo Dilma foi duramente criticado pelo setor privado por fazer mudanças bruscas de regras e regulamentos em toda a economia. A intervenção do Estado foi uma das razões pelas quais o mercado de ações do Brasil afundou quase 16 por cento no ano passado, um dos piores índices de desempenho de ações do mundo.
Fontes do governo disseram à Reuters que mudanças como as regras para os aeroportos procuram resolver os gargalos, e que os contratos serão rigorosamente respeitados.
Moreira Franco disse que o governo vai buscar mudanças que não tenham efeitos negativos sobre as concessionárias e os novos investidores no setor.
No entanto, as alterações poderiam retardar ou mesmo reduzir o investimento em aeroportos existentes e levar as empresas a exigirem uma revisão dos contratos de concessão, que têm pouco mais de um ano de idade, dizem especialistas e executivos de alguns dos operadores aeroportuários.
"Se o governo faz essa mudança legal iremos exigir uma revisão dos termos financeiros do contrato", disse à Reuters um executivo de uma das concessionárias de aeroportos.
"Espero que o governo não tome esse caminho, porque ele vai mostrar falta total de respeito com os investidores", disse o executivo, que falou sob condição de anonimato. Representante de outra concessionária também disse que as empresas podem exigir que as autoridades mudem os termos de seus contratos.
Maior Efeito em São Paulo
Os aeroportos que poderiam sofrer o máximo da revisão das regras a médio prazo são Guarulhos e Viracopos, ambos localizados perto da cidade de São Paulo.
Os grupos Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez planejam construir um novo aeroporto em Caieiras, localizado a cerca de 40 quilômetros de São Paulo, o que poderia tirar a demanda de Guarulhos e Viracopos, segundo especialistas.
Guarulhos é operado pela Invepar e pela sul-africana ACSA. Um consórcio formado pela Triunfo Participações, UTC Participações e a francesa Egis Airport Operation opera Viracopos.
Os dois consórcios também estão sob pressão para realizar investimentos emergenciais na construção de novos terminais antes do início da Copa do Mundo em junho, quando milhares de turistas são esperados nos aeroportos já superlotados.
As empresas de ambos os consórcios e da Inframérica Aeroportos, que opera o terminal de Brasília, não quiseram comentar sobre a mudança de regra. A Odebrecht Transport, que faz parte de um grupo que venceu a licitação para operar o aeroporto Galeão, no Rio de Janeiro, também não quis se pronunciar, assim como a Flughafen Zürich, que tem os direitos sobre o aeroporto mineiro de Confins.
Não é Caso Isolado
O setor de aeroportos não é o primeiro a ver, potencialmente, uma grande mudança de regras.
Alterações nos termos de um leilão para construir e operar um trem de alta velocidade de 16 bilhões de dólares fez com que dois dos três concorrentes se retirassem da competição no ano passado. O governo, então, suspendeu o leilão para o projeto e muitos acreditam que ele pode nunca se materializar.
Apesar dessas dificuldades, o programa de infraestrutura do Brasil ganhou algum impulso depois que o governo promoveu cinco concessões rodoviárias no segundo semestre de 2013.
Este ano, o governo espera leiloar pelo menos mais uma estrada, mas especialistas acreditam que vai haver dificuldades para vender os direitos para construir, reformar e operar ferrovias e portos, que já têm alguns desafios legais pendentes.
Um diplomata que ajudou as empresas de seu país a participarem de leilão de aeroporto em 2012 expressou preocupação de que as mudanças de regras poderiam desmotivar participação em concessões de infraestrutura no futuro.
"Você simplesmente não faz isso com as pessoas", disse o diplomata. "Isso saiu do nada, deixando todos muito preocupados." (Reportagem adicional de Leonardo Goy)