Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 13 de junho de 2024 às 15h29.
A Receita Federal registrou o maior número de importação de mercadorias de até US$ 50 em março deste ano, com mais de 16,6 milhões de remessas registradas, que totalizaram o valor aduaneiro de R$ 1,1 bilhão. O valor médio dos objetos com Declaração de Importação de Remessa (DIR) foi de R$ 69,67.
Os dados do fisco foram obtidos via LAI (Lei de Acesso à Informação) pela Tendências Consultoria, que consolidou as informações e repassou com exclusividade à EXAME.
O volume superou o registrado pela Receita em novembro de 2023, mês da Black Friday, quando foram rastreados 14,8 milhões de pacotes, com valor total de R$ 1,2 bilhão. O valor aduaneiro do fisco considera o custo total das encomendas internacionais, considerando o preço do produto, frete e seguro.
Os números consideram todas as empresas que aderiram ao Programa Remessa Conforme (PRC) em agosto de 2023. O levantamento mostra que no volume total, as compras acima da faixa de US$ 50 representam apenas 1% das remessas.
Nessa semana, o Congresso aprovou o fim da isenção do imposto de importação, benefício que foi concedido para as varejistas internacionais em troca da participação do programa de conformidade aduaneira. As empresas pagavam apenas o ICMS de 17%. Agora, além do imposto estadual, as compras terão taxa de 20% do imposto de importação. A medida ainda precisa ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O programa foi criado pela necessidade do governo em aumentar o controle sobre o boom das compras em sites internacionais, como Shein e AliExpress. No primeiro relatório do programa Remessa Conforme, o fisco afirmou que em 2022 do total de remessas postais enviadas ao Brasil, sendo praticamente a totalidade delas vindas do comércio eletrônico, somente 1,93% delas tiveram o registro.
Com o início do PRC, a partir de agosto de 2023, houve um grande crescimento no número de remessas com registro, à medida que as empresas estrangeiras aderiram ao programa. Conforme últimos dados da Receita, a partir de dezembro de 2023, todo o universo de remessas internacionais passou a ser objeto de registro.
No consolidado de setembro de 2023 até março de 2024, os brasileiros importaram mais de 88,7 milhões de remessas de até US$ 50, com valor total de R$ 6,6 bilhões. A média por mês é de 12 milhões em objetos importados por mês. Na comparação com o período entre setembro de 2022 e março 2023, onde o Remessa Conforme não existia, apenas 1,4 milhão de remessas foram registrados, com valor de R$ 335 milhões.
"O número de declarações multiplicou por muitas vezes com o Remessa. Mas se você observar, o valor médio declarado era bem maior antes do programa de Conformidade. Agora, as pessoas estão realmente concentrando as compras em até US$ 50", diz Carla Rossi, analista da Tendências Consultoria.
Mesmo com a consolidação das informações a respeito das compras internacionais, a orientação da Receita era pela manutenção da isenção para as empresas seguirem no programa de conformidade. Até o momento, as principais varejistas asiáticas, Shein e AliExpress, não manifestaram qualquer intenção de sair do programa.
Um dos principais argumentos das varejistas internacionais contra a taxação do imposto de importação é que em outros países existe uma faixa de isenção, chamado de "De minimis", por conta do custo alto para acompanhar um alto volume de remessas contra o baixo valor de arrecadação que esse tipo de encomenda pode gerar aos cofres dos países. Rossi, da Tendências, explica que a lógica é verdadeira, mas que nem todos os países seguem essa regra para remessas entre empresas e pessoas físicas.
"Alguns países com De minimis têm programas de conformidade muito parecido com o Brasil, a União Europeia é um bom exemplo", diz Rossi.
Duas pesquisas tentam mostrar quais serão as classes mais afetadas pela taxação de 20%. Um levantamento da Ipsos, encomendado pela Shein no Brasil, mostra que 88% dos clientes da plataforma são das classes C, D e E. A empresa afirma que as classes D e E representam metade dos clientes. Os dados são do primeiro trimestre de 2024. A plataforma afirma que abriu seus dados pela primeira vez para mostrar que o que "está em jogo na discussão sobre a taxação é o acesso de brasileiros mais pobres a produtos internacionais de qualidade".
Porém, outra pesquisa, realizada pela FSB a pedido da Confederação Nacional da Indústria (CNI), aponta que famílias com faixa de renda superior a 5 salários mínimos são as que mais realizaram compras internacionais em 2023.
Os dados mostram que na faixa de mais de 5,5 salários mínimos, 41% responderam que sim e 59% que não. De 2 a 5 salários mínimos, 27% que sim e 71% que não. De 1 a 2 salários mínimos, 21% que sim e 76% que não. E até 1,5 salário mínimo, 15% que sim e 82% que não.