Edifício-Sede do Banco Central do Brasil, em Brasília (./Exame)
Alessandra Azevedo
Publicado em 25 de agosto de 2021 às 18h27.
Última atualização em 25 de agosto de 2021 às 18h27.
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira, 25, o julgamento sobre a autonomia do Banco Central. A Corte deve decidir se é constitucional a lei que pretende blindar a política monetária de decisões políticas, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em fevereiro.
Por enquanto, o placar é de um voto a favor e um contra a constitucionalidade da matéria. A votação deve ser retomada nesta quinta-feira, 26.
O assunto foi levado ao STF por ação apresentada pelo PSol e pelo PT, que pedem a anulação da lei, por considerarem inconstitucional. Os partidos alegam que o Congresso aprovou e o presidente sancionou uma lei complementar que trata de assunto que deveria ser regulamentado por lei de iniciativa do presidente da República.
O primeiro voto proferido nesta quarta-feira foi o do ministro Ricardo Lewandowski, relator da ação, que concorda que a lei é inconstitucional. Os argumentos usados por ele foram na linha do que defendem o PSol e o PT. Segundo o ministro, houve vício de iniciativa, quando a origem da proposta não vai na linha do que diz a Constituição.
A autonomia do BC foi aprovada por projeto de lei de autoria do senador Plínio Valério (PSDB-AM), não do Palácio do Planalto, ao qual o primeiro foi apensado (juntado). Segundo a ação, com a qual Lewandowski concorda, a proposta deveria ter sido enviada pelo presidente da República, por se tratar de questão de organização administrativa, não pelo Senado.
“A questão em debate é saber se, por iniciativa exclusivamente parlamentar, seria possível subtrair do presidente da República o controle de algum órgão integrante da administração pública federal, sem que tal fosse feito por meio de projeto de lei com origem no Poder Executivo”, resumiu Lewandowski.
O ministro deixou claro não fazer juízo de valor sobre as novas regras, se são positivas ou não, mas ressaltou que a lei retira o controle político do Banco Central e que isso foi feito por iniciativa parlamentar. Além disso, a discussão começou pelo Senado, quando, nesses casos, deve ter início na Câmara, acrescentou Lewandowski.
“Discussão e votação de projeto de lei de iniciativa do presidente da República, do STF e dos tribunais superiores têm início na Câmara dos Deputados, não no Senado, como ocorreu”, apontou Lewandowski.
O ministro também considera que as mudanças feitas vão além de uma simples remodelação. Entre as inovações, a lei estabeleceu mandatos fixos para dirigentes, que só poderão deixar o cargo por motivos completamente alheios à vontade do presidente, e acabou com a vinculação do BC ao Ministério da Economia, ressaltou.
O ministro Luís Roberto Barroso, segundo a votar, foi na direção contrária. Para ele, não houve vício de iniciativa, e a lei não trata de nenhuma situação que exija que o projeto seja apresentado pelo Executivo.
“Nos sistemas presidencialistas, a regra geral é que quem legisla é o Poder Legislativo. A Constituição brasileira prevê algumas hipóteses de iniciativa privativa do presidente da República, mas essa é a exceção, e, precisamente por ser exceção deve ser interpretada essa norma de maneira estrita”, sustentou Barroso.
A lei em questão, segundo Barroso, não se enquadra nas exceções. “Não estamos tratando nem de regime jurídico de servidores nem tampouco estamos tratando da criação ou extinção de ministério ou de órgão publico”, disse.
Barroso também lembrou que Bolsonaro enviou mensagem ao Congresso, defendendo aprovação no mesmo teor do projeto aprovado. “Se houvesse necessidade de iniciativa presidencial, que eu procurei demonstrar que não havia, ela foi suprida pelo envio de uma mensagem do presidente da República com o teor praticamente idêntico ao que veio a ser aprovado”, apontou.
"É evidente que o Congresso Nacional tramitou e fez aprovar projeto de lei de senador de República sobre matéria própria e indelegável do Presidente da República", diz a ação do PT e do PSol. Além do vício de iniciativa, os partidos apontam que a lei resulta em "descoordenação" das políticas monetária e fiscal, "ocasionando um descasamento da política econômica".
O procurador-geral da República, Augusto Aras, também defende a derrubada da autonomia do BC. Em parecer enviado ao STF, ele reforça os problemas técnicos na proposta, que a tornariam inconstitucionais. “O ponto central da questão é o Senado Federal não ter deliberado sobre o projeto de iniciativa do presidente da República", afirma.
Os partidos dizem que, se a lei for mantida, haverá "consequências irreparáveis". Na ação, eles sustentam que “não se pode pensar em um Banco Central com objetivos distintos das políticas do governo federal, quando mais em um país em desenvolvimento e repleto de demandas sociais, políticas e econômicas prementes”.
A Advocacia-Geral da União (AGU) discorda do posicionamento das legendas e afirma que elas estão "irresignadas contra a liberdade de conformação legislativa". O objetivo da ação, segundo a AGU, é "fazer prevalecer uma posição política diversa daquela que preponderou após o debate parlamentar".
O assunto começou a ser discutido no STF em junho, no plenário virtual. Dois ministros registraram votos: Ricardo Lewandowski, relator da ação, e Luís Roberto Barroso. O ministro Dias Toffoli pediu destaque, o que faz com que a ação tenha que ser levada a sessão presencial. Com isso, o placar zera e todos os ministros precisarão votar presencialmente -- inclusive os que já declararam os votos.